Amarildo: julgamento dos 25 PMs acusados já está na fase final

Juíza analisa as últimas alegações da acusação e da defesa para decidir destino dos policiais

Do O Globo

O julgamento em primeira instância dos 25 PMs acusados da tortura e morte do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza – caso que correu o mundo através das redes sociais e ecoou nas ruas durante os protestos de 2013 – já está em fase de sentença. Desde segunda-feira, a juíza Daniella Prado, da 35ª Vara Criminal, analisa as alegações finais do Ministério Público e da defesa, num processo de mais de 11 mil folhas e 150 horas de audiências.

Entre as principais provas da acusação, estão os depoimentos de quatro soldados que, dentro de contêineres da UPP da Rocinha, teriam ouvido as torturas, praticadas num espaço ao lado. A defesa dos réus nega e garante ter apresentado provas de que pelo menos três dos acusados de participação direta no crime sequer estavam no local. Não há uma previsão para o fim do julgamento. Amarildo desapareceu em julho de 2013, depois de ser levado para a UPP da favela.

Uma diligência feita pela própria juíza deixa em suspense a sentença: Daniella Prado foi à sede da UPP, se trancou num dos contêineres e concluiu que dali não era possível distinguir claramente as vozes no espaço ao lado, onde teriam ocorrido as torturas. Agora, a magistrada terá que decidir se os testemunhos dos soldados e do perito do MP são suficientes para superar suas impressões pessoais e as provas da defesa.

Entre os acusados do crime, estão o comandante da UPP na época, major Edson Raimundo dos Santos, e o tenente Luiz Felipe de Medeiros, então subcomandante. Além dos depoimentos de policiais da UPP, o MP reuniu farto material da Divisão de Homicídios, como interceptações telefônicas, que revelariam que PMs montaram uma farsa para responsabilizar traficantes pelo desaparecimento de Amarildo. Uma perícia do Ministério Público confirmou que o soldado Marlon Campos Reis usou um dos telefones grampeados, fingindo ser um traficante e dizendo que teria assassinado o pedreiro.

Já a principal prova da defesa são as imagens de câmeras na favela. Segundo advogados, elas provam que o tenente Medeiros, o sargento Reinaldo Gonçalves dos Santos e o soldado Wellington Tavares da Silva estavam em outros pontos da comunidade.

– Alguns réus que constam como participantes da tortura sequer estavam no local. A gente comprova isso através de vídeos. As câmeras registraram imagens desses acusados em local totalmente diferente daquele onde teria ocorrido a tortura – afirmou o advogado Saulo Salles, que defende o major, o tenente e outros três acusados.

Além das imagens, a defesa dos réus afirma que o soldado Alan Jardim, principal testemunha do caso, foi investigado junto com outros policiais num inquérito da corregedoria que buscava descobrir quem seria um informante do tráfico dentro da UPP. Segundo Salles, o inquérito não identificou o PM envolvido.

O inquérito citado pelo advogado pode não ter identificado o informante, mas excluiu qualquer possibilidade de Alan Jardim ter cumplicidade com o tráfico.

Para a promotora Carmen Eliza Bastos de Carvalho, as provas do processo são contundentes e podem condenar todos os réus.

– O fato de a juíza não ter conseguido distinguir vozes (quando estava dentro de um dos contêineres) não significa que ela vai descartar os depoimentos. Afinal, as testemunhas estavam trancadas nos contêineres, ou seja, com a atenção totalmente voltada para o que estava acontecendo do lado de fora. Além disto, nosso perito também foi ao local e concluiu que, dentro dos contêineres, dava para identificar claramente de quem eram as vozes do lado de fora – afirmou a promotora.

Crime teve destaque em protestos

A pergunta “Cadê o Amarildo?” desceu a comunidade, tomou as ruas do Rio durante as manifestações de 2013 e se espalhou pelo mundo. Eram moradores da Rocinha que protestavam contra o destino do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, levado no início da noite de 14 de julho de uma birosca perto do seu barraco, na localidade da Roupa Suja, uma das áreas mais carentes do morro, para a UPP da favela.

Foi o segundo dia da fracassada Operação Paz Armada, realizada pelo comando da UPP, com apoio de policiais do Bope e da 15ª DP (Gávea), para localizar traficantes e armas na comunidade. Mas, até o fim da tarde daquele domingo, a polícia não havia conseguido apreender sequer um dos mais de cem fuzis que estariam enterrados no morro. Pouco antes das 19h, uma moradora telefonou para o soldado Douglas Roberto Vital Machado, um dos principais acusados, informando que Amarildo estaria com a chave do paiol dos traficantes. Levado por duas equipes de PMs para a sede da UPP, ele nunca mais foi visto.

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Indignados com a falta de notícias, familiares começaram a organizar protestos para denunciar torturas que vinham acontecendo na comunidade desde março, quando tiveram início as investigações, realizadas com a participação do comandante da UPP, para localizar o depósito de armas da facção criminosa da região. O caso acabou revelando práticas contrárias aos princípios do projeto de polícia pacificadora.

Depois do desaparecimento do ajudante de pedreiro, vários moradores foram até a Coordenadoria de Direitos Humanos da Procuradoria de Justiça do Estado, para denunciar a prática de torturas dentro da Unidade de Polícia Pacificadora.

Quinze dias após o sumiço de Amarildo de Souza, o caso foi transferido para a Divisão de Homicídios (DH) e teve início o inquérito que concluiria pela participação de 25 policiais da UPP não só nos crimes de tortura, morte e ocultação de cadáver, como também de tentativa de fraude processual. Passados mais de dois anos, até hoje o corpo da vítima não foi localizado pelas autoridades.

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