Cris Vianna fala sobre carreira, beleza e preconceito racial e de gênero

“Não é fácil ser negra em nenhuma profissão. Não é fácil ser mulher nesta sociedade machista e, se você for mulher e negra, pior ainda”, dispara a atriz de 40 anos

no Vogue

Otempo não para, ou melhor, não passa para Cris Vianna. Aos 40 anos, a belíssima atriz arrumou uma brecha em sua puxada rotina de ensaios para o musical Rio mais Brasil – o nosso musical, que acaba de estrear no Rio de Janeiro, para dar vazão a seu lado modelo no ensaio exclusivo que você confere ao longo da página.

Fotografada por Thiago Bruno, com styling de Ale Duprat, maquiagem deEwerton Pacheco e cabelo by Marcelo Matos, Cris posa a bordo de peças Patricia Bonaldi, Apartamento 03 e Lucas Magalhães.

A seguir, confira um papo exclusivo com a beldade, que solta o verbo sobre preconceito de raça e gênero e conta as dificuldades do início da carreira. “Não é fácil ser negra em nenhuma profissão. Não é fácil ser mulher nesta sociedade machista e, se você for mulher e negra, pior ainda”, dispara.

1. Você nunca teve medo de se posicionar sobre política, feminismo, preconceito – ato que é tão raro hoje em dia entre as celebridades. Pra você, qual é a importância de não esconder sua opinião e não se silenciar nas redes sociais?
Acho importante dizer que, ao contrário do que você diz, hoje cada vez mais as pessoas estão se posicionando nas redes sociais sobre as questões que envolvem as minorias políticas, de gênero e racismo. Acredito que todos nós temos a obrigação de trabalhar para construir um mundo melhor. E se somos formadores de opinião, porque não mostrar para a sociedade que o mundo está evoluindo e que não existe mais lugar para qualquer tipo de preconceito? Não esconder minha opinião me dá mais confiança para seguir em frente, porque estou sendo sincera comigo mesma e agindo assim sempre poderei dormir tranquila. Me dá mais confiança para seguir em frente.

2. Te incomoda ver pessoas muito famosas que se mantêm em silêncio com assuntos sérios?
Não posso falar pelo outro, como dizem: cada um com seu cada um. Não se posicionar é um direito que a pessoa tem e isso também faz parte da liberdade.

3. Você é um ícone de beleza, de sucesso. Batalhou muito para chegar no topo e serve de exemplo para milhares de mulheres. Qual a principal mensagem que você busca transmitir a estas mulheres com o seu trabalho?
Eu não cheguei ao topo e nem estou perto dele. O caminho que tracei para chegar aonde estou hoje foi de muita luta e resistência. Não é fácil ser negra em nenhuma profissão. As mulheres negras chegam a quase metade da população brasileira, mas não conseguem se ver representadas nas revistas. A primeira capa com uma modelo negra no Brasil foi em 2011, ou seja, ontem. Hoje você tem modelos negras ocupando as capas de revistas, mas isso é uma coisa muito recente. Minha mensagem para essas mulheres é: muito trabalho e consciência do próprio valor. Não é fácil ser mulher nesta sociedade machista e se você for mulher e negra, o que é o meu caso, pior ainda. É preciso ocupar nosso espaço, ser protagonista da nossa própria história.

4. Você começou a trabalhar com mídia e moda muito cedo, dois mundos que nem sempre são dos mais amigáveis. Quais foram os maiores perrengues que você passou no começo da carreira?
Quando vim para o Rio estudar, vim com a cara e a coragem. Até começar a fazer testes e conseguir trabalho eu tive que utilizar todas as minhas economias. Às vezes eu nem comia. Foi uma fase muito difícil, mexeu com a minha saúde e estima.

5. Há algum perrengue que tenha passado naquela época que ainda passa nos dias de hoje?
Desde quando comecei até hoje, os padrões de belezas impostos pela mídia são muito cruéis com as mulheres. Depois dos 30 anos e das mudanças naturais do corpo humano, passei a usar manequim 40. Olho no espelho e gosto do que vejo. Tenho saúde e adoro as minhas curvas, mas pelo meu trabalho existe uma cobrança por eu não me encaixar no biótipo magra, manequim 38. Hoje é mais difícil viver só de alface! (risos) Se eu quiser emagrecer e caber em uma calça 38 vou passar mais perrengue do que antigamente. Preciso abrir mão de comer coisas que realmente gosto, como uma massa ou até o clássico arroz e feijão.

6. Qual é o conselho que você gostaria que tivessem te dado quando você estava começando?
Gostaria de ter conhecido uma pessoa que tivesse me dito: “você fez uma escolha difícil, será doído, você irá passar por muitas dificuldades, vai se sentir sozinha e terá que mostrar dia a dia que você é capaz. Mas não desista!”. Acho que quando você está ciente do que pode vir a acontecer os tombos são menos dolorosos e te ajudam a fortalecer para o próximo desafio.

7. Foram cinco anos como rainha de bateria da Imperatriz Leopoldinense. Quem você gostaria de ver ocupando o seu lugar?
A escolha é da presidência da Escola, mas adoraria que fosse alguém que ame a escola e que respeite e entenda a importância dela para a comunidade.

8. Você sempre será a rainha de muita gente. Quem são as suas rainhas?
Minha mãe é sem dúvida a minha maior rainha, exemplo de força e luta. Mas muitas outras mulheres me inspiraram ao longo do meu caminho: Dona Ruth de Souza, Chica Xavier, Elza Soares, Elisa Lucinda, verdadeiras guerreiras. Mas seria injusto se eu não falasse em nomes como: Isabel Fillardis, Rachel Maia, Katleen Conceição, Tais Araújo, Juliana Alves, Luana Génot, Karol Conka, verdadeiras rainhas contemporâneas, que com a sua representatividade vêm quebrando barreiras e tabus.

9. Agora que você não tem mais a pressão de desfilar à frente da bateria, pretende seguir com a rotina intensa de beleza para manter o corpo de rainha – ou pretende relaxar, se permitir mais dias de folga e fast food?
Sou vaidosa e sempre cuidei do meu corpo. A gente tem que se cuidar sempre para se sentir bem com gente mesmo. Acredito que a beleza vai além da questão estética, é saúde. Um corpo saudável esbanja vitalidade e é o que precisamos para enfrentar a jornada diária. Para conseguir isso é preciso se alimentar adequadamente e fazer exercícios, ou acaba enferrujando. (Risos).

10. Conta pra gente: quais são os segredos para ter este corpão impecável?
Segredo a gente não conta, né? (Risos). Mas acho que o fato de não ser muito fã de doces ajuda muito.

11. Faz pouco tempo que você fez aniversário. Bateu aquele medo de chegar na casa dos 40?
(Risos). Os outros é que me lembram a minha idade. Eu não me preocupo muito com isso porque me sinto melhor e mais interessante a cada ano que passa. Não tenho medo de viver e nem de morrer, estou tranquila quanto a isso.

12. Quais sonhos você ainda quer conquistar? Deseja constituir uma família?
O que quero mesmo é trabalhar muito ainda, aprender coisas novas e estar sempre me superando. Superação para mim não é uma escolha, mas uma necessidade. Um exercício diário: errar, aprender e melhorar. É assim que as coisas acontecem. Penso em ter filhos, mas não é a minha prioridade no momento.
Cris Vianna (Foto: Divulgação/ Thiago Bruno)

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