Estampa de escravos em coleção da Maria Filó foi alterada e não é de Debret, diz pesquisadora

Ao contrário do que foi informado pela Maria Filó, em resposta à polêmica causada por uma estampa da marca que retrata a escravidão de negros, a imagem não teve inspiração em uma pintura do francês Jean Baptiste Debret. É o que afirma a artista e pesquisadora Patricia Gouvêa, acrescentando uma nova denúncia: segundo ela, a versão original da obra teria sido alterada de uma maneira que reforça ainda mais o conceito racista que gerou a revolta nas redes sociais.

Do Extra

Patricia publicou em sua página no Facebook uma reprodução da litografia “Negras no Rio de Janeiro”, de autoria de Johann Moritz Rugendas, de 1835, e criticou a resposta dada pela Maria Filó às denúncias de racismo. Ela condena o erro de informação sobre a autoria da imagem que teria inspirado a roupa e destaca uma diferença entre os ícones da obra e da estampa: “São 2 mulheres negras no original, a que está sentada está calçada, o que pode sugerir que talvez fosse uma mulher forra, ou quem sabe uma escrava “doméstica” a quem era permitido usar sapatos em ocasiões especiais. A estampa da loja colocou a que estava sentada como branca, alterando totalmente o significado da cena”.

Em seu post, a artista, que recentemente expôs uma pesquisa sobre maternidade e escravidão em conjunto com a artista Isabel Löfgren, ainda diz “Um absurdo! Mostra o desconhecimento histórico da empresa e um uso vil de uma parte da história brasileira que não cessa de sangrar”.

patricia-gouvea

A marca Maria Filó foi procurada para responder a denúncia, mas até o momento da publicação desta reportagem não havia respondido.

Relembre o caso

A polêmica veio à tona com a postagem de uma consumidora numa rede social. Tâmara Isaac, de 29 anos, decidiu se manifestar depois de se deparar com a imagem de mulheres negras servindo brancas durante uma visita à loja de Niterói, na região metropolitana no Rio de Janeiro.

— Fiquei chocada. Não é possível que esse seja o tema de uma campanha. Eu perguntei para a vendedora se tinha algum sentido naquilo ou se era apenas uma estampa racista. Ela só me disse que era a coleção sobre o Brasil — contou Tâmara, que é servidora pública.

A consumidora afirma ter ficado transtornada também com o fato de as pessoas da marca acharem normal o uso da imagem que, para ela, é um clara apologia ao racismo. Tâmara fez uma publicação de desabafo no Facebook, onde milhares de pessoas concordaram com ela. A página da Maria Filó também recebeu uma enxurrada de comentários contra a estampa. “Uma marca de roupa em pleno 2016 fazer uma estampa fazendo apologia à escravidão e racismo é tão absurdo que eu nem sei por onde começar a expressar minha indignação”, escreveu uma consumidora.

Procurada pelo EXTRA, a Maria Filó enviou uma nota afirmando que a estampa será retirada das lojas. “A Maria Filó esclarece que a estampa em questão buscou inspiração na obra de Debret. Em nenhum momento houve a intenção de ofender. A marca pede desculpas e informa que já está tomando providências para que a estampa seja retirada das lojas”, afirmou a empresa.

+ sobre o tema

Pedagogia de afirmação indígena: percorrendo o território Mura

O território Mura que percorro com a pedagogia da...

Aluna ganha prêmio ao investigar racismo na história dos dicionários

Os dicionários nem sempre são ferramentas imparciais e isentas,...

Peres Jepchirchir quebra recorde mundial de maratona

A queniana Peres Jepchirchir quebrou, neste domingo, o recorde...

Apenas 22% do público-alvo se vacinou contra a gripe

Dados do Ministério da Saúde mostram que apenas 22%...

para lembrar

Liga francesa vai investigar caso de racismo contra Balotelli

A Liga de Futebol Profissional da França (LFP) confirmou...

ONG internacional alerta sobre violência policial no Brasil

Relatório da Human Rights Watch aponta que "tortura é...

Bolsonaro alinha-se ao regime da escravidão, diz Raquel Dodge

Para fundamentar a denúncia junto ao STF (Supremo Tribunal...

Xenofobia: nordestino é espancado em SP

Um empresário de 59 anos afirma que foi...
spot_imgspot_img

Toussaint Louverture, o general negro que libertou o Haiti

Toussaint Louverture liderou a revolução haitiana que conquistou a libertação de dezenas de milhares de escravos negros da antiga colônia francesa no Haiti e abriu caminho...

Passeio pela mostra “Um defeito de cor”, inspirada no livro de Ana Maria Gonçalves

"Eu era muito diferente do que imaginava, e durante alguns dias me achei feia, como a sinhá sempre dizia que todos os pretos eram...

Caso de dona Maria de Moura pede urgência no combate ao crime de escravidão

Quantas pessoas brancas alguém aqui conhece que passou um, dez, 20, 40, 72 anos em regime análogo à escravidão? Tenho curiosidade em saber. Conte-me nos...
-+=