Halle Berry: ‘Sempre tive dificuldade em obter papéis por ser negra’

A atriz deu uma entrevista por ocasião do lançamento em DVD do seu mais recente filme e abordou algumas questões sociais que se fazem sentir ainda em Hollywood

Aquela que continua a ser a única mulher negra a ter ganho o Óscar de melhor actriz (‘Monster’s Ball’, em 2002), a atriz Halle Berry, falou com sinceridade ao The Guardian sobre a dificuldade em obter bons papéis e partilhou as suas impressões sobre a indústria cinematográfica, na altura em que foi finalmente lançado em DVD o filme em que é protagonista, “Frankie and Alice”, e que valeu a nomeação para um Globo de Ouro.

O filme, de baixo orçamento, foi rodado em 2008, e esteve em exibição apenas uma semana. Conta a história verídica de uma stripper nos anos ‘70, Frankie, que sofre do distúrbio de múltipla personalidade. Apesar do insucesso financeiro do filme, para Halle valeu a pena o “sangue, suor e lágrimas” que depositou no projeto recompensados pela experiencia de ter trabalhado com Phylicia Rashad e Stellan Skarsgård, a quem não poupa elogios.

“Quando tens um impulso artístico e queres contar uma história, fá-lo de qualquer maneira, mesmo que só 5 pessoas o vejam, o valor para mim nada tem a ver com a bilheteira. Estes pequenos filmes são difíceis de fazer, nem sempre os querem ver. Mas fazer um filme sobre um tema obscuro e trazer-lhe alguma luz, desafiando-me, esse é o meu prémio- concluir algo que me propus a fazer”

Sendo ela própria produtora cinematográfica, revela que a experiência não a demove de continuar, já que sempre se ganha ou perde alguma coisa: “Há filmes bons que não têm audiência e filmes maus que têm um enorme sucesso e não te podes deixar ir abaixo com isto se estás no meio”. Halle confessou que existe um projeto do tipo “Frankie and Alice” que ainda gostaria imenso de fazer: a história de Angela Davis (activista politica considerada uma perigosa terrorista, que foi impedida de ensinar na universidade): “Acho que ela não quer contar a história da vida dela neste momento, e nunca faria isso sem a sua permissão. Mas ela é fascinante: a época em que viveu, os Panteras Negras [partido afro-americano, fundado em 1966 na Califórnia que defendia os direito civis e a legitima defesa dos mais desfavorecidos contra o Estado] e o que significaram, e sua conecção com isso. Tenho muito respeito pela maneira como viveu a sua vida”

Interrogada sobre se não foi tentada a aceitar papéis de sucesso após ter ganho o Óscar de melhor atriz, em vez de um drama pesado, revela: ‘Se um Oscarizado te disser que pode escolher papéis que vão ser um sucesso, está a mentir’. Sente-se desapontada por ser a única mulher negra a ter ganho um Óscar quando vê tantos atores negros a fazer um bom trabalho que gostaria que fossem reconhecidos, no entanto a qualidade e o valor da representação não é determinado por nenhum prémio “Todos nós devemos encontrar a nossa recompensa no próprio trabalho, fazendo o nosso ofício. A verdadeira vitória é não vender apenas histórias sobre pessoas negras para pessoas negras.”

Acerca do recente debate lançado por Russel Crowe (quando disse que as mulheres acima dos 40 continuam a querer papéis de 21 e não compreendem porque não os podem ter) admite que “Sempre tive dificuldade em obter papéis por ser negra, por isso não tenho mais nem menos do que aqueles que sempre tive, é o mesmo. Quando tinha 21 era tão difícil como é agora que tenho 48”. Halle Berry é filha de mãe branca de origem europeia e de pai negro americano, tendo sido a primeira afro-americana a entrar no concurso de Miss Mundo, em 1986, aos 20 anos.

Neste momento está a produzir e a interpretar “Extant” em associação com a Amazon. “O tabu da televisão já desapareceu, houve um tempo em que os filmes eram filmes as agora tens grandes écrans em casa”.  Note-se que a atriz também ganhou um Emmy e um Globo de Ouro pela sua interpretação no filme para televisão Introducing Dorothy Dandridge (1999) .

Halle Berry é casada pela terceira vez com o ator francês Olivier Martinez, de quem tem um filho, Maceo, nascido em 2013, que veio fazer companhia a Nahla, de 7 anos, fruto da sua relação com o modelo canadiano Gabriel Aubry.

+ sobre o tema

Mulheres negras enfrentam barreira maior no mercado de tecnologia

O Brasil tem mais negros (56%) e mulheres (52%),...

Marina: Paradoxos

 Há algo perturbador na performance eleitoral de Marina da...

para lembrar

O Discurso de Angela Davis na Women’s March (tradução)

No dia 21 de Janeiro, centenas de milhares de...

Sidney Santiago Kuanza leva afetividade negra ao palco

por Igor Giannasi  Com passagens pelo cinema e pela tevê,...

Lázaro Ramos: “Não posso ocupar a minha vida toda com o racismo”

Ele é um sujeito atarefado. Muito. Daquelas pessoas que...

“Faço parte do problema e da solução” diz Lázaro Ramos, sobre racismo

Ator, no ar como 'Mister Brau', fala da relação...
spot_imgspot_img

Desigualdade ambiental em São Paulo: direito ao verde não é para todos

O novo Mapa da Desigualdade de São Paulo faz um levantamento da cobertura vegetal na maior metrópole do Brasil e revela os contrastes entre...

O Brasil branco é um produto de cotas

Quem observa a oposição às cotas raciais nas universidades e no serviço público é capaz de pensar que o Brasil nunca adotou cotas anteriormente. Errado. O...

“Avalio de forma positiva a presença de mulheres negras em conferências da ONU”, diz Rafaela Seixas

A diplomata Rafaela Seixas é uma das convidadas de Geledés para o evento 'Estratégias para o Empoderamento Econômico da Mulher Negra', que acontece nesta...
-+=