Juízes tentam contornar dificuldades na aplicação da Lei da Palmada

Magistrados apontam efeito pedagógico da norma, mas dizem ver necessidade de recorrer ao Estatuto da Criança e do Adolescente para consolidar punições

 Rio – Juízes de Varas da Infância e Juventude de todo o Brasil estão em busca de mecanismos para fazer valer a Lei Menino Bernardo, mais conhecida como Lei da Palmada. A regra foi aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pela presidente Dilma Rousseff (PT) em junho. A lei proíbe o uso de castigos físicos ou tratamentos cruéis ou degradantes na educação de crianças e adolescentes.

Embora tenha provocado ampla repercussão, a lei é vaga em esclarecer quais tipos de práticas se enquadrariam dentro do critério de castigo físico. Especialistas consideram que a aprovação da norma tem mais efeito pedagógico do que prático, já que em muitos aspectos as regras já existentes são mais claras no que se refere à punição de infratores.

Associações de magistrados ouvidas pelo iG apontam a necessidade de pressionar o poder público a instituir políticas públicas específicas para famílias em situações de violência, assim como para pais que tenham histórico de violência contra os filhos. Na outra frente, os juízes acreditam que a melhor saída ainda é recorrer ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para dar mais efetividade à nova legislação.

A situação é semelhante ao que ocorreu há aproximadamente oito anos, no ato da implementação da Lei Maria da Penha, sancionada em 2006 com o objetivo de coibir a violência doméstica. No início, a lei enfrentou resistências até mesmo em setores do Judiciário. O quadro mudou depois que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instituiu uma série de ações que ajudaram na aplicação da lei, entre elas a criação de fóruns de juízes, campanhas educativas e até ações de pressão contra o poder público contra a violência doméstica.

A Lei Menino Bernardo (PL 58/2014) foi aprovada na noite do dia 4 de junho pelo Senado. A bancada evangélica do Congresso era contra a lei, afirmando que o Estado não poderia interferir no processo educacional de crianças e adolescentes. Do outro lado, os defensores do projeto afirmam que a nova lei vai proteger as crianças de abusos e tratamentos cruéis.

Pela norma, pais que utilizarem castigos físicos no processo educacional estarão sujeitos a advertência, encaminhamento para tratamento psicológico e cursos de orientação. A lei prevê outras sanções, como o pagamento de multa de três a 20 salários mínimos. O valor dobra em caso de reincidência. Para juízes ouvidos pelo iG, a lei, na prática, reforça o que já estava previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

O presidente da Associação Brasileira dos Magistrados da Infância e Juventude (Abraminji), Renato Rodovalho Scussel, acredita que a nova lei trará uma oportunidade de que o Estado institua políticas públicas de “co-participação na educação de crianças e adolescentes”. Para ele, esse é apenas o início de uma discussão que deve tomar conta de toda a sociedade. “Se por um lado não houve avanços (com a nova lei), também não houve retrocessos”, aponta. “O efeito é muito mais um efeito pedagógico”, analisou Scussel.

“A lei foi uma sinalização para toda a sociedade. Eu acredito que as dificuldades existirão, mas os enfrentamentos legais estão aí. Agora, pais que forem advertidos duas ou três vezes, podem ser passíveis de ações de destituição do poder familiar, como prevê o ECA. Agora, os instrumentos (para aplicação da lei) temos que construir”, analisou Scussel.

A professora de Direito Civil da Universidade de Brasília (UNB), Suzana Viegas, também acredita que os juízes terão dificuldades na aplicação da lei, principalmente nas regiões mais pobres do Brasil. No entanto, ela afirma que isso é típico de qualquer legislação nova. “Existe sempre o processo de maturação de uma lei. Mas a discussão está sendo feita e isso é extremamente positivo”, analisa.

“A lei foi uma sinalização para toda a sociedade. Eu acredito que as dificuldades existirão, mas os enfrentamentos legais estão aí. Agora, pais que forem advertidos duas ou três vezes, podem ser passíveis de ações de destituição do poder familiar, como prevê o ECA. Agora, os instrumentos (para aplicação da lei) temos que construir”, analisou Scussel.

A professora de Direito Civil da Universidade de Brasília (UNB), Suzana Viegas, também acredita que os juízes terão dificuldades na aplicação da lei, principalmente nas regiões mais pobres do Brasil. No entanto, ela afirma que isso é típico de qualquer legislação nova. “Existe sempre o processo de maturação de uma lei. Mas a discussão está sendo feita e isso é extremamente positivo”, analisa.

 

Fonte: O Dia

 

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