Jurema Werneck responde a 5 perguntas sobre discriminação racial

Mulher, negra, carioca, acadêmica, ativista. Estas são apenas algumas das definições usadas para fazer referência a Jurema Werneck. Ela assumiu em fevereiro de 2017 a direção executiva da Anistia Internacional no Brasil com o compromisso de ampliar o trabalho da organização em todo o país.

Da Anistia 

Foto: Fundo Brasil de Direitos Humanos

Nesta entrevista que marca este 21 de março, Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial, você vai ter a oportunidade de conhecê-la um pouco mais e entender suas ideias acerca de um dos temas estruturais na luta por direitos humanos no Brasil: o combate ao racismo.

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Você é uma mulher, negra, nasceu em uma favela do Rio de Janeiro. Mas teve acesso à educação, se formou em medicina, fez mestrado, doutorado e hoje é diretora da Anistia Internacional. Como a lógica da discriminação se manifestou ao longo da sua trajetória? O que você fez para subvertê-la?
Reconhecer que minha experiência pessoal foi uma exceção é um modo bastante explícito de mostrar a lógica do racismo e da discriminação racial no Brasil. Afinal, somos mais de 100 milhões de pessoas negras no país, mais de 50 milhões de mulheres negras – e pouquíssimas tiveram as mesmas condições de estudo e trabalho do que eu. Foi tudo muito difícil, mas contei sempre com a comunidade – família, comunidade religiosa (meus pais eram de umbanda) e a vizinhança… muita gente fez o que pôde para que eu e meus irmãos pudéssemos superar as dificuldades.

Como a discriminação racial afeta de diferentes formas homens e mulheres?
O racismo e a discriminação racial afetam a todo mundo que é negro, mas não da mesma forma. Quanto mais próximo do “ideal” que uma sociedade discriminadora como a nossa impõe: de ser branco, homem, heterossexual, residente em zonas urbanas, não ter qualquer deficiência – melhores são suas chances na sociedade. Assim, dá para entender porque a pessoa negra, sendo mulher, enfrenta barreiras nem sempre iguais a que um homem negro enfrenta.

Na sua opinião, qual a melhor forma de lidar e combater a discriminação racial no Brasil?
Além de reconhecer a gravidade do problema e de enfrentá-lo com recursos a longo prazo, será preciso que haja uma política de Estado e compromisso da sociedade. Para criar e gerir as políticas de modo eficiente é importante conhecer o racismo em detalhes, saber onde ele está, como atua e seus efeitos sobre as pessoas – lembrando que estas políticas precisam ajudar a superar outras desigualdades também. Quero dizer com isso que serão diferentes políticas para diferentes grupos sociais vitimados pelo racismo – para mulheres, para pessoas LGBTI, para homens, para jovens e também para os diferentes grupos que não são negros, mas que também precisam atuar cotidianamente para o fim do racismo.

O que o Brasil tem de diferente em relação a outros lugares do mundo onde a discriminação racial foi/é bastante intensa, como Estados Unidos e África do Sul?
O racismo e a discriminação racial excluem e provocam dor e morte em qualquer parte do mudo onde ela acontece. Talvez, a diferença entre o Brasil e estes dois países seja o fato de que começamos mais tarde e fomos mais tímidos em relação a medidas para enfrentar a desigualdade racial e acabar com o racismo. E mesmo assim, por aqui, já querem desmontar o pouco que foi feito.

Qual o papel de organizações como a Anistia Internacional para o enfrentamento da discriminação racial?
A Anistia é uma organização que luta pelos direitos humanos de todas as pessoas. Portanto, temos a responsabilidade de contribuir com a luta dos movimentos sociais contra o racismo e a discriminação racial, que são uma das principais causas de violação de direitos humanos da maioria da população brasileira. Trabalhamos e continuaremos trabalhando ao lado dos movimentos negro, de mulheres negras, de favelas, de mães e familiares de vítimas da violência, de quilombolas e indígenas. Nós, sob a liderança destes movimentos, seguiremos ampliando nossas ações da Campanha Jovem Negro Vivo – que quer chamar a atenção para este grupo que é o principal alvo de assassinatos no Brasil – além de lançarmos outras ações necessárias para defesa dos direitos humanos de mulheres e homens cisgêneros e transgêneros negras e negros de todas as idades e condições.

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