Meu chapéu, a leveza e o ódio na web

Para quem tiro o chapéu em 2014?

E para quem dei unfollow? Ou enterrei o chapéu bem fundo na cabeça, sem qualquer possibilidade de sair de lá?

Por , do Brasil Post

O desafio do Brasil Post foi grande. Afinal, 2014 foi um ano de muitas emoções e muitos eventos marcantes, como a Copa do Mundo e as eleições mais polarizadas da história recente do Brasil. Também foi um ano de mortes triiiiiiistes, como a do Roberto Bolaños, o eterno Chavinho. No futebol, foi o ano em que meu time do coração superou mais uma saga emocionante, com reviravoltas inimitáveis, e se consagrou campeão da Copa do Brasil em cima do seu maior rival — que era tido como o melhor do ano. Então foi o ano em que o Galo foi melhor que o melhor.

Quantos chapéus podem ilustrar tantas emoções?

Pra começo de conversa, eu poderia ir pelo caminho mais óbvio e tirar o chapéu para o Galo, o Clube Atlético Mineiro. Tirar o chapéu para a Seleção da Alemanha e a da Holanda, que fizeram futebol-arte na Copa deste ano. Tirar o chapéu para os caras que transformaram uma música do Creedence em hino da Copa do Mundo 2014, depois reproduzido entre todas as torcidas locais. Tirar o chapéu para o Bolaños e para o Rubem Alves e para o Robin Williams e para o Gabriel García Márquez,Eduardo Coutinho, o Philip Seymour Hoffman, o Johnny Winter, Ariano Suassuna, Plínio de Arruda Sampaio, Luciano do Valle, Jair Rodrigues, Manoel de Barros — todos personagens incríveis em suas áreas, para os quais eu tiraria o chapéu em qualquer época, e que posso tirar neste finzinho de 2014, em sinal de luto.

Não tiraria meu chapéu de jeito nenhum para os juízes que ficaram famosos neste ano por se acharem acima de tudo e de todos. Não tiraria para Felipão e sua Seleção Brasileira fraquinha. Não tiraria para Marina Silva, que, de alguém respeitada e capaz de agregar milhares de pessoas em torno de propostas que pareciam consolidadas, dentro do ideário da Rede, acabou se perdendo em discursos ambíguos, mudando de ideia ao sabor de tweets de Malafaias da vida, e se aliando a uma figura conservadora como Aécio Neves. Jair Bolsonaro é hors concours: ninguém hoje em dia faria um chapéu se enterrar mais a fundo no meu crânio que ele. Também deu um unfollow na PUC Minas, que demitiu dois professores apenas por não terem o título de doutores (mas isso rendeu uma boa discussão no meu blog).

E dei um unfollow ainda mais caprichado para a mineradora multinacional Anglo American que, como bem mostraram minhas amigas Ana Paula Pedrosa, Queila Ariadne e Mariela Guimarães, em série de reportagens finalista do Prêmio Esso, causou um rastro de destruição em Minas Gerais, para levar adiante o projeto megalomaníaco do maior mineroduto do mundo, com 525 km de extensão, que desperdiça 2,5 milhões de litros de água por hora — apenas para transportar minérios de Minas até o porto no Rio de Janeiro (e, de lá, para as Chinas da vida). Sim, foi isso mesmo o que você leu, esse tanto de água jogada fora em tempos de crise hídrica.

Mas, se for para eleger o chapéu e o unfollow do ano, simbolicamente, fico com estes abaixo:

TIRO O CHAPÉU para a atriz Letícia Sabatella, que conseguiu transformar um limão em limonada — ou caipirinha – ao retrucar de forma bem-humorada e bastante altiva a publicação por sites de fofocas de sua foto deitada no chão, de pilequinho, depois de uma noite de farra entre amigos. Graças a sua resposta, ela mobilizou uma legião de fãs velhos e novos, que fizeram campanhas pelas redes sociais em defesa de uma vida mais leve, mais bem-humorada, mais escrachada, menos moralista e menos machista. Centenas de pessoas se viram discutindo a felicidade, as risadas, as gargalhadas, e postando fotos coletivas, deitadas de barriga para o céu. Esse movimento foi um sopro de ar fresco em meio à atmosfera carregada e pesada de ódio, preconceito e intolerância que engrossou na internet neste ano.

DOU UNFOLLOW (e dei mesmo, literalmente) às centenas (não passam de centenas) de anônimos raivosos que resolveram aparecer nos comentários de sites de notícias e redes sociais neste ano para destilar ódio e agressividade, para pedir a volta da ditadura militar no Brasil, para pedir o impeachment de uma presidente eleita segundo as regras vigentes no país, para contemporizar a prática da tortura, debochar das vítimas listadas pela Comissão Nacional da Verdade, e trazer de volta a orgulho de ser idiota, por meio de comentários homofóbicos, machistas, golpistas e afins. O porta-voz oficial dessa turma foi o cantor Lobão, que, como não consegue emplacar uma música nas rádios desde 1987, resolveu encontrar outro nicho para aparecer. Defendeu Bolsonaro e aplaudiu Lobão? Dei unfollow. E fui lá brindar com Sabatella, porque é muito melhor rir desse povo do que rosnar contra os latidos deles.

Que 2015 seja um ano de mais bom senso, educação, respeito e divergências de idéias sendo defendidas com bom humor e cordialidade, e não com ódio e agressividade.

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