Não tenha filhos

Foi o que eu disse a uma amiga de 39 anos, linda, bem-sucedida e em crise no casamento. Explico. Ela sempre sonhou rodar o mundo. Estudar línguas. Escrever livros, fazer mestrado, correr a São Silvestre. É curiosa, desbravadora e tem dúvidas. Não sabe se quer morar no Brasil, se vai mudar de profissão, se seu desejo é namorar o marido e não estar casada. Tem o coração mais irrequieto, rebelde e desbravador que conheço.

Por  Clarissa Monteagudo, do Extra

Só que três vezes por semana, de três pessoas diferentes, ela escuta as perguntas: “E pra quando é o herdeiro?”, “Vocês não vão engravidar?”, “Não falta um neném?”. Não, não falta. E eu sou a mãe mais coruja e apaixonada do mundo. Minha vida se encheu de cor por causa do Miguel, mas eu continuo empunhando a bandeira: mulheres não são reprodutoras.

Mulheres são muito mais do que isso. Uma mulher pode ser completa sem ser mãe? Lógico! Ela nasceu assim, um ser humano inteiro. A maternidade é uma linda jornada, mas quantas outras existem para um ser humano? Filho deve ser sonhado, ansiado, recebido com prazer. Não pode ser recibo para a sociedade. Não é justo. Isso só gera frustração: crianças entregues a babás e pais infelizes, cheios de tédio. Quantos você conhece assim?

Melhor assumir uma vida livre, leve e solta. Um homem sem filhos pode ser padre, pode ser monge, pode ser galinha, pode ser atleta, viajante. E a mulher? Também! E se minha amiga não quer ter filhos repito a ela: “Não tenha filhos!” Assim como um relacionamento não pode completar uma pessoa, uma gravidez também não vai torná-la inteira. Só viver plenamente suas missões, com brilho, garra, força, sem ceder ao mimimi nem à opinião dos outros faz uma pessoa se sentir completa. Abraçar a vida com o que ela traz. E a vida não dá o mesmo a todos. Seria chato demais, não? Vamos nos fartar com nossas complexas individualidades. Com o que nos faz únicos em cima dessa terra. E se sua vida for diferente da dos outros, cuidado, você corre o sério risco de ser uma pessoa interessante.

 

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