Nós queremos é falar sobre poder!

“No momento em que o excluído assume a própria fala e se põe como sujeito, a reação de quem ouve só pode se dar nos níveis acima caracterizados. O modo mais sutilmente paternalista é exatamente aquele que atribui o caráter de “discurso emocional” à verdade contundente da denúncia presente na fala do excluído. Para nós, é importante ressaltar que emoção, subjetividade e outras atribuições dadas ao nosso discurso não implicam numa renúncia à razão, mas, ao contrário, num modo de torná-la mais concreta, mais humana e menos abstrata e/ou metafísica. Trata-se, no nosso caso, de uma outra razão.” (Lélia Gonzalez, 1979)

Foto: Gabriel Brito/Correio da Cidadania

Por Beatriz Lourenço do Nascimento Do Negro Belchior

#AgoraÉQueSãoElas

Começo citando Lélia não apenas pela homenagem, mas porque entendo que nesse pequeno trecho de sua obra, ela fortalece – mais uma vez – a importância de ocupar esse espaço, ou melhor, de ocupar todos os espaços. O quanto é importante falar, escancarar, tomar voz. Não me lanço à loucura de dizer aqui que só negros devem falar sobre racismo, porque eu não acredito nisso. Mas reforço a importância de tomarmos o protagonismo da nossa história, para dessa forma transformá-la.

Nós queremos é o poder, queremos aquilo que é nosso, exigimos de volta tudo o que nos tiram sistematicamente.

E já que em tempos como esse em que vivemos é tão importante demarcar, aproveito para dizer que não acredito em nenhuma outra possibilidade para nós, o povo negro, que não a transformação radical da sociedade. Reconheço os avanços que conquistamos, mas tenho certo que a nossa disputa deve ser pelo poder, por tomarmos o rumo de nosso futuro pelas nossas mãos. Não nos contentaremos com uma campanha global “somos todos alguma coisa”, e embora saibamos a importância de denunciar esses casos de racismo, queremos mesmo é um mundo em que não haja espaço para uma emissora que faz piada estereotipada do nosso povo, e que se enfileira junto com aqueles que sempre nos quiseram longe daqui.

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Não nos contentaremos com a pouca representatividade, porque o que nos devem é muito mais que isso. Nós queremos é o poder, queremos aquilo que é nosso, exigimos de volta tudo o que nos tiram sistematicamente.

É importante falar de poder porque é só com a tomada de poder que nos livraremos das estatísticas de morte de nossas mulheres por abortos inseguros, de morte da nossa juventude, dos índices de desemprego e baixa escolaridade.

E poder só se disputa organizado.

Tomados pela dureza de nossa vida, mas também pela certeza de que é nosso papel essa tal transformação.

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É tempo de semear a nossa luta, de compreender o tamanho de nossos inimigos e identificar os nossos aliados. Certamente, aqueles que estão comprometidos com a vida do nosso povo entenderão que não se trata de um discurso de emoção, mas sim, da maior característica do capitalismo brasileiro: seu racismo estrutural, e que sendo assim, não há forma de combater esse modelo de exploração sem o combate visceral ao racismo brasileiro.

E é nessa perspectiva que reafirmo: Sou mulher negra, não luto em vão, contra o racismo e pela REVOLUÇÃO.

Este Blog não é um espaço tradicional de “grande mídia”, tampouco este editor é alguém “com voz de alto alcance público”, ainda assim fiz questão de aderir à belíssima iniciativa da campanha #AgoraÉQueSãoElas, afinal, se a vida está ficando cada vez mais difícil para as mulheres devido os riscos de retrocessos e retirada de direitos adquiridos, é sempre bom lembrar que o sobrepeso recairá nas costas das mulheres negras, pra variar. Pois essa semana, e sempre, esse espaço é delas. Das pretas.

Douglas Belchior

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