O Brasil e os direitos humanos

A nomeação, pelo secretário das Nações Unidas, Kofi Annan, do brasileiro Sérgio Vieira de Mello para chefia do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos cria enormes expectativas nas organizações de direitos humanos do Brasil pela atenção que se espera da parte do Alto Comissariado, sob o comando de um brasileiro, para os graves problemas de violação desses direitos no país. As expectativas positivas se manifestam, por exemplo, na opinião de José Miguel Vivando, diretor-geral do Human Rights Watch para as Américas, expressa neste jornal em 23 de julho: “Com um brasileiro na CDH, as autoridades nacionais podem ter a oportunidade de negociar a abertura de um escritório permanente da comissão no Brasil” e, como disse na mesma oportunidade a represente da ONG Justiça Global, Sandra Carvalho, “proporcionar à população um acesso maior ao sistema internacional de direitos humanos”.  Em particular, as organizações voltadas para a proteção dos direitos dos afro-descendentes do Brasil esperam dessa nova gestão o fortalecimento dos mecanismos institucionais de combate ao racismo e à discriminação racial do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos, como o Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial, a Unidade Antidiscriminação e o Grupo de Trabalho sobre Afro-Descendentes que será empossado em novembro próximo.

Por Sueli Carneiro

Como afirmou Vieira de Mello, o Brasil, “na última década, transformou-se num ator internacional na área dos direitos humanos”. Se a realidade interna do país sobre a matéria não evoluiu positivamente tanto quanto a vontade política demonstrada pelo país nos fóruns internacionais para tratar do tema, é necessário reconhecer que o protagonismo internacional do governo e da sociedade civil do Brasil na área dos direitos humanos tem sido fundamental especialmente sobre as questões étnicas e raciais em relação às quais o país jogou um importante papel no reconhecimento das desigualdades raciais persistentes no país e na região latino-americana e caribenha, e da urgência de adoção, pelos países-membros das Nações Unidas, de políticas públicas que assegurem os direitos das minorias étnicas e raciais, o que constitui um dos principais resultados da III Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância.

 

Em relação ao estágio atual do debate sobre os direitos humanos no Brasil, disse Vieira Mello em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo de 24 de julho último que ele sabe, “por conversas com o presidente Fernando Henrique Cardoso e com outros protagonistas de direitos humanos, que o Brasil não tem mais vergonha de falar nesse assunto, de conhecer as deficiências internas e a necessidade de tratá-las, não só em nível teórico, mas também na prática”.

De fato, no que diz respeito a essa dimensão fundamental da questão de direitos humanos no Brasil, ou seja, a violação sistemática dos direitos de minorias étnicas e raciais como os afro-descendentes, o Estado brasileiro abandonou o discurso falacioso da democracia racial exaustivamente utilizado no plano nacional e internacional para mascarar as práticas discriminatórias persistentes em nossa sociedade contra essa minoria política.

A admissão da existência de racismo, de discriminação racial e das desigualdades raciais, e da impossibilidade que eles geram de realização do princípio da igualdade de direitos e de oportunidades para esses grupos tem contribuído para transformar possíveis enfrentamentos em reconhecimento, em possibilidades de diálogo e negociação de uma agenda inclusiva para os afro-descendentes.

Nesse contexto, o Alto Comissariado pode cumprir papel importante na consolidação desses avanços no país, sobretudo por meio da persistente sensibilização das instituições nacionais e internacionais para o cumprimento dos compromissos e recomendações por elas assumidos na Conferência de Durban em relação à promoção dos grupos humanos historicamente discriminados.

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