O que acontece com quem ouve e lê Azevedo e Sheherazade? Uma pesquisa mostra. Por Paulo Nogueira

Uma publicação se mede por seus leitores.

Por , do DCM

Esta é uma das mais antigas e mais verazes leis do jornalismo.

Isso posto, uma pesquisa sobre os manifestantes que foram à Paulista no domingo passado traça um retrato sinistro da imprensa brasileira.

Eles simplesmente não têm noção de nada. Acreditam, por exemplo, que o PT buscou 50 mil haitianos para reforçar a votação de Dilma em 2014.

Têm Lulinha como sócio do Friboi. E estão convencidos de que cotas estimulam mais racismo nas universidades.

Onde eles se informam?

Você pode imaginar. Nas grandes empresas de mídia. Quando buscam notícias online, os sites da Veja, Folha etc são os preferidos.

Os colunistas que mais admiram são dois nomes óbvios: Raquel Sheherazade e Reinaldo Azevedo.

O baixíssimo nível cultural dos manifestantes é a melhor prova da ruindade avassaladora do jornalismo produzido pelas grandes empresas de mídia.

A rigor, você não precisava de pesquisa nenhuma para ver o grau de obtusidade desinformada dos discípulos de Sheherazade e Azevedo.

Bastava olhar os cartazes que empunhavam. Erros grosseiros de português se juntavam a agressões impiedosas contra frases num inglês precário obviamente extraído do Google Translator. Alguém, com ares de genialidade ululante, escreveu: “Sonegação não é corrupção”.

Pistas expressivas também podiam ser colhidas em vídeos feitos por jornalistas que saíram a campo.

Num deles, de autoria de Lino Bocchini da Carta Capital, mulheres e homens são instados delicadamente a dar sua opinião sobre a terceirização.

O que se ouve é um bestialógico que só termina quando o vídeo chega ao fim. Eis os alunos da mídia tradicional, impressa ou digital.

É um contraste com declarações de FHC à época da campanha. Ele se gabava do “alto nível” dos eleitores do PSDB, e os opunha aos nordestinos adeptos do PT.

A isso se dá o nome de autoengano.

No jornalismo, os editores cometem com frequência o autoengano quando pensam nos seus leitores.

Uma vez, em meus dias de Abril, lembro o faniquito que tomou conta das editores das revistas femininas quando numa pesquisa elas foram apresentadas, em vídeo, às suas leitoras de carne e osso.

Elas esperavam Giselles Bunchens e Angelinas Jolies, e quase mataram o responsável pela pesquisa – o atual presidente da Abril, aliás, Alex Caldini – quando ele apresentou a realidade como ela era.

Uma das mais nobres funções do jornalismo é lançar luzes onde existem sombras.

No Brasil, a mídia escolhe áreas de sombra e joga nelas ainda mais sombras.

O resultado disso são leitores intoxicados de má informação.

Alguém já disse, no exterior, que maus editores causam ainda mais danos para um veículo do que a internet.

No Brasil, especificamente, nas últimas semanas vai ganhando força a palavra midiotas, para designar os leitores, ou vítimas, da grande mídia.

Se e quando despertarem de seu torpor mental, os midiotas terão todo o direito de processar Globo, Folha e Veja pelo estado de emburrecimento em que foram lançados.

 

Sobre o Autor

O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

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