Para projeto contra preconceito, professor lista 360 termos racistas

Incomodado com o uso de palavras preconceituosas por seus alunos, o professor de biologia Luiz Henrique Rosa resolveu fazer um levantamento dos termos mais usados na Escola Municipal Herbert Moses, no Rio de Janeiro. Pediu para cada um dos estudantes fazer uma lista de termos pejorativos e o resultado foram mais de 600 palavras, 360 delas de cunho racista.

Por:Marcelle Souza, do UOL

Aluno pinta o painel com os nomes dos 200 escravos que pertenciam ao mesmo dono de Manuel Congo, protagonista da Revolta de Vassouras. (Arquivo Pessoal)

“Eles colocaram no papel vários apelidos e eu fui sistematizar as palavras que eles escreveram. Só quando botei no papel é que tive a noção da quantidade de termos racistas que eles usavam”, diz. “O mais comum entre os alunos era ‘macaco’, em seguida aparecem termos relacionados à inferioridade intelectual, aos traços físicos e comportamentais, como ‘cabelo duro’ e ‘negro safado'”, explica.

Para fazer o levantamento, o professor consultou 11 turmas, que tinham em média 40 alunos cada. Segundo Rosa, a maior parte dos estudantes da escola é afrodescendente. O projeto atende à lei 10.639/03, que trata da inclusão do ensino de história e cultura afro-brasileira no currículo escolar.

Depois da listagem, o próximo passo foi montar um painel e discutir em sala o uso dos termos racistas entre os adolescentes. A partir daí surgiu, no fim de 2009, o projeto “Qual é a graça”, que visa também ensinar sobre escravidão no Brasil, a Revolta das Vassouras (uma rebelião de escravos ocorrida em 1838) e o seu principal protagonista, Manuel Congo, um desconhecido dos alunos.

professor-da-escola-municipal-herbert-moses-no-rio-de-janeiro-1400699733253_615x300
Turma de estudantes durante aula do professor de biologia Luiz Henrique Rosa na Escola Municipal Herbert Moses, no Rio de Janeiro. (Arquivo Pessoal)

Aluno pinta o painel com os nomes dos 200 escravos que pertenciam ao mesmo dono de Manuel Congo, protagonista da Revolta de Vassouras Assim, o quintal da escola virou uma homenagem a 200 escravos que pertenciam ao mesmo dono de Congo –que morreu enforcado na cidade de Vassouras (RJ) durante a rebelião dos negros. Os nomes dos personagens foram gravados em pequenos pedaços de mármore e cada um deles foi “apadrinhado” por um aluno. Há outras 40 pedras com a inscrição “Deus sabe o nome”, uma referência aos escravos não identificados.

“Também criamos o ‘canteiro navio’, onde os alunos plantam e acompanham as espécies por 60 ou 90 dias, que era o tempo que dois navios negreiros demoravam para chegar ao Brasil e em que os escravos permaneciam acorrentados”, diz o professor.

Aos poucos, o quintal abandonado da escola ganhou vida e hoje virou um espaço multidisciplinar da escola, que tem cerca de 1.200 alunos do 6º ao 9º ano do ensino fundamental e EJA (Educação de Jovens e Adultos). O jardim tem mais de 300 espécies vegetais e é visitado por 20 espécies de borboletas. Há plantas relacionadas à história, como a pau-brasil, e à literatura, como a laranja-lima, entre outras matérias exploradas no espaço.

Após mais de quatro anos de projeto, o professor diz que o resultado é perceptível na comunidade escolar: houve redução do bullying e das brigas entre alunos. “O Qual é a graça vai além da questão racial, busca o bom convívio e o combate ao preconceito de todas as formas”, afirma Rosa.

 

Qual é a graça

+ sobre o tema

O Plano Nacional de Educação em disputa

Enviado para o Portal Geledés     Nina Madsen Está em disputa, no...

Governo suspende novas vagas do Pronatec, ProUni e Fies

Brasília - Uma das vitrines da área social da...

Lorrayne: ‘Espero que outros jovens tenham grandes oportunidades para se desenvolver’

Nossa campeã está de volta! Depois de arrasar na...

Educação em Portugal “não ultrapassou as desigualdades criadas pelo racismo”

A recém-criada Djass-Associação de Afrodescendentes organiza debate onde serão...

para lembrar

Lançamento – Coleção Educação e Relações Raciais: apostando na participação da comunidade escolar

Lançamento: Coleção Educação e Relações Raciais: apostando na participação...

Um trabalho pioneiro sobre gênero e escolarização no Brasil

Um tema recorrente neste blog é a interface entre...

Em 13 anos, número de professores com doutorado em universidades federais cresce 189%

Há 13 anos, apenas 20.711 docentes efetivos da carreira...

“Eles querem retirar a diversidade da escola”

Para a integrante do movimento que critica o Escola...
spot_imgspot_img

Faculdade de Educação da UFRJ tem primeira mulher negra como diretora

Neste ano, a Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) tem a primeira mulher negra como diretora. A professora Ana...

O que a proibição de livros nos diz sobre o futuro que nos aguarda

Reportagem da Agência Pública mostrou que existe um movimento coordenado para barrar a entrada de determinados livros no sistema prisional de Minas Gerais. Apenas títulos...

Encontro anual do SETA definiu ações e estratégias para uma educação antirracistae emancipatória.

Geledés - Instituto da Mulher Negra participou do planejamento anual Projeto SETA  (Sistema de Educação Por Uma Transformação Antirracista) em Paraty, Rio de Janeiro....
-+=