Reisado

O reconhecimento do reisado como patrimônio brasileiro, foi reinvindicado em seminário no IV Encontro Mestresdo Mundo, encerrado no último sábado 06/12/08. Segundo o pesquisador cearense Oswald Barroso, “O reisado é um folguedo que se desenvolve no Brasil inteiro, com uma variedade imensa e uma importância enorme para as diversas artes. Mapear essa manifestação, para esse processo de registro seria um desafio enorme, dada a sua complexidade e diversidade”. Juntamente com a capoeira, agora teremos a certeza que essa bela festa popular, será preservada para o deleite de gerações futuras.

REISADO

O Reisado é uma das pantomimas folclóricas mais ricas e mais apreciadas, principalmente no Nordeste. Faz parte do repertório das Festas Jesuínas, e é apresentado de 24 de dezembro a 6 de janeiro, isto é, pelo Natal, Ano Bom e Reis. O Reisado é formado por um grupo de foliões, de pastores e pastoras que se reúnem numa espécie de rancho, com o fim de visitar as casas das pessoas mais gradas e hospitaleiras da região, a cantar e a dançar. O reisado apresenta diversas modalidades e compõe-se de várias partes: a) abrição da porta; b) entrada; c) louvação ao Divino; d) chamadas do rei; e) peças de sala; f) danças; g) a guerra; h) as sortes; i) encerramento da função. Tem como principais personagens: o rei, o mestre, o contramestre, Mateus, Catarina, figuras e moleques.

Indumentária:


Rei

– culote até os joelhos, terminado por franjas, blusa de cetim de cor diferente com mangas compridas; no peito, espelhinhos; manto de cetim dourado que cai até os joelhos; coroa de ouro, cetro.

Mestre

– chapéu de palha, forrado de cetim, de aba dobrada na testa (como usam os cangaceiros) adornado com muitos espelhinhos, bordados dourados e flores artificiais; da parte não dobrada da aba pendem fitas compridas de cores variadas, saiote de cetineta até a altura dos joelhos, de cores vivas, com grega de galões largos; por baixo saia branca, com dois ou três babados; blusa, peitoral e capa. Contramestre – idêntica à do Mestre, porém menos pomposa.

Mateus

– paletó e calça de brim com placas de remendos, alpercatas de couro cru, chapéu de palha enfeitado com espelhinhos e franjas, penduricalhos ao peito, como se fossem medalhas, cantil e bornal a tiracolo; pandeiro, espingarda de bambu.

Catarina/Catirina (palhaça) – roupa de tecido xadrez, de maneira a lembrar um palhaço.

Figuras – trajes idênticos ao do mestre, porém mais pobres e mais simples.
Inicia-se o folguedo com o rei seguido do mestre e do contramestre e acompanhado de meninos que trazem grandes candeias de querosene, conduzindo o reisado. Atrás seguem os dançadores de entremeios, com baús cheios de máscaras e trajes. Entoam marchas ao som de violas, harmônicas, maracás, rabeca, pandeiros e vão em demanda das casas onde celebram sua função.

Abrição da porta:

O mestre dirige a evolução do episódio por meio de apitos. Canta-se e dança-se com volteios altivos e elegantes. O reluzir dos espelhos e das lantejoulas produz grande efeito pictórico. Mateus vai aboiando dando uma nota de comicidade à função. Terminam pedindo licença para entrar.

Entrada:
Entram os tocadores, criando animação, seguidos do rei, do mestre, do contra-mestre e das figuras, portando-se todos com garbo e imponência. Cantam a peça da entrada e fazem elogios ao dono da casa. Executam marchas e contramarchas em ritmo ligeiro e com passos arrastados.

Louvação ao Divino: 
O reisado dirige-se ao presépio ou à capela da casa visitada. Ajoelham.
Cantam em louvação ao Divino, ao som da música, mas os maracás são abafados com as mãos para produzir um som surdo. Voltam à sala. O rei ocupa o trono. As figuras colocam-se em duas filas. Realizam-se, então, os entremeios, os episódios de guerra e as embaixadas. O mestre dirige a peça.

Chamadas do rei: 
Ao fim de uma peça, ou de um entremeio, o rei levanta-se do trono, chama o mestre e com ele cruza sua espada, em ressoantes entrechoques, enquanto estabelece com ele uma série de embaixadas.

Peças de sala: 
Antes e depois das embaixadas, são cantadas e dançadas as peças de sala. Estas são críticas, comentários, sátiras sobre fatos ou acontecimentos ligados à vida de pessoas ou do povo da região.

Danças: 
As danças são numerosas e variadas, como, por exemplo, a dança do gingá com o entremeio da mamãe velha.

A Guerra: 
O mestre apita e o primeiro embaixador atende. Cruza espadas e inicia embaixadas de guerra, primeiro com o mestre, depois com o rei. Quando chega a vez do segundo embaixador, as embaixadas já se tornam cansativas, repetindo-se as batidas de espadas. Por fim, todos os figurantes, inclusive o rei e o mestre se empenham na luta e o combate se torna geral.

As sortes: 
Todos os figurantes, até o próprio rei, atiram seus lenços aos donos da casa e à assistência. Estes os devolvem com dinheiro dentro. Recolhidas as sortes, o mestre apita e as filas de dançarinos se afastam para os lados. Então começam os entremeios. Estes são composições teatrais, jocosas, burlescas, como o bumba-meu-boi, o cavalo-marinho, etc.
Encerrados os entremeios, voltam as danças e cantorias de peças, sucedem-se as embaixadas até que sejam apresentados novos entremeios. Note-se, de passagem, que os personagens dos entremeios não tomam parte nas danças das embaixadas.

São os entremeios que dão maior brilho a esta dança dramática e são tão apreciados que alguns são apresentados mesmo fora de sua época como, por exemplo, (o famoso bumba-meu-boi, o boi simboliza o do presépio) que, inicialmente, era o principal entremeio do reisado e é levado agora também nas Festas Juninas.

Muitos destes entremeios, deliciosos quadros independentes, revelam um espirito chistoso, outros se inspiram em motivos míticos ou totêmicos, como o Zabelê.

Folharal: 
Nesta dança, o personagem oculta a cabeça sob uma cabaça donde pendem longas folhas de samambaia, traja um camisolão coberto de folhas e capim. Aumenta seu fantástico aspecto quando os longos cabelos de samambaia esvoaçam nos continues rodopios dados pelo bailarino.
Zabelê: O dançarino, disfarçado num saco pintado, usando máscara com bico, dança e assobia, imitando o pássaro jacu.

Curiabá: 
O dançarino imita o macaco, se coça dançando e faz mil trejeitos engraçados.

Sapo Cururu:
Agachado no chão, o dançarino coaxa e dá estranhos pulos.

Alma, Diabo e Miguel:

É um entremeio que deixa a assistência suspensa e trêmula de medo. A alma, envolta em lençol branco, desfiando um rosário, gemendo, aparece. Foge do Diabo que, todo vestido de vermelho com rabo e garras afiadas, a persegue. Agarra-a mas quando já a arrasta para o inferno, interpõe-se no seu caminho o anjo São Miguel, geralmente representado por uma moça, de asas brancas e espada em riste. Trava-se uma luta entre ele e o Diabo que é vencido. Há um forte estouro de pólvora na sala e o Diabo aproveita a oportunidade para desaparecer da cena. Suspiros de alívio na assistência.
Entre inúmeros outros, podem-se ainda citar o Lobisomem, o Matuto e o Fantasma, o Capitão de Campo, o Pescador e a Sereia.


E assim, os artistas que representam os entremeios aproveitam cada embaixada para correrem aos baús por eles trazidos no cortejo, de onde tiram febrilmente suas fantasias inesgotáveis.

Data de registro: meados do século XX (~1950)

 


REISADO NA VISÃO DE LUÍS DA CÂMARA CASCUDO

Luís da Câmara Cascudo, no seu Dicionário do folclore brasileiro, diz que Reisado é a denominação erudita para os grupos que cantam e dançam na véspera e Dia de Reis.
O Reisado chegou ao Brasil através dos colonizadores portugueses, que ainda conservam a tradição em suas pequenas aldeias, celebrando o nascimento do Menino Jesus. Em Portugal é conhecido como Reisada ou Reseiro.

No Brasil é uma espécie de revista popular, recheada de histórias folclóricas, mas sua essência continua a mesma, com uma mistura de temas sacros e profanos.
O Reisado é formado por um grupo de músicos, cantores e dançarinos que percorrem as ruas das cidades e até propriedades rurais, de porta em porta, anunciando a chegada do Messias, pedindo prendas e fazendo louvações aos donos das casas por onde passam.

A denominação de Reisado persiste ainda em Alagoas, Sergipe e Bahia. Em diversas outras regiões o folguedo é chamado de Bumba-meu-boi, Boi de Reis, Boi-Bumbá ou simplesmente, Boi. Em São Paulo é conhecido como Folia de Reis, onde a festa é composta de apresentações de grupos de músicos e cantores, todos com roupas coloridas, entoando versos sobre o nascimento de Jesus Cristo,liderados por um mestre.

Fazem parte do espetáculo os “entremeios” (corruptela de entremezes), pequenas encenações dramáticas que são intercaladas com a execução de peças, embaixadas e batalhas. Os personagens são tipos humanos ou animais e seres fantásticos humanizados, cheios de energia e determinação.

O folguedo do ciclo natalino é comemorado em várias regiões brasileiras, principalmente no Norte e Nordeste, onde ganhou cores, formas e sons regionais. Em Alagoas, constitui-se numa representação dramática, normalmente curta e pobre de enredo, acompanhada e precedida de canto.

Em Sergipe, é apresentado em qualquer época do ano e não apenas nas festas de Natal e Reis. Os temas de seu enredo variam de acordo com o lugar e o período em que são encenados: amor, guerra, religião, entre outros.

O Reisado apresenta diversas modalidades e é composto de várias partes: a abertura ou abrição de porta; entrada; louvação ao Divino; chamadas do rei; peças de sala; danças; guerra; as sortes; encerramento da função.

A música no Reisado está sempre presente. O Mestre é o solista, sendo respondido pelo coro a duas vozes. Os instrumentos utilizados alternadamente são: a sanfona, o tambor, a zabumba, a viola, a rebeca ou violão, o ganzá, pandeiros, pífanos e os “maracás”, chocalhos feitos de lata, enfeitados com fitas coloridas.

Há uma grande variedade de passos nas danças do Reisado, entre os quais pode-se destacar: do Gingá, onde os figurantes de cócoras se balançam e gingam; da Maquila, um pulo pequeno com as pernas cruzadas e balanços alternados do corpo para os lados, passo também exibido pelos

caboclinhos; Corrupio, movimento de pião com o calcanhar esquerdo; Encruzado, cruzando-se as pernas ora a direita à frente da esquerda, ora ao contrário.

Tem como personagens principais o Mestre, o Rei e a Rainha, o Contramestre, os Mateus, a Catirina, figuras e moleques.

O Mestre é o regente do espetáculo. Utilizando apitos, gestos e ordens, comanda a entrada e saída de peças e o andamento das execuções musicais. Usa um chapéu forrado de cetim, de aba dobrada na testa (como o dos cangaceiros), adornado com muitos espelhinhos, bordados dourados e flores artificiais, de onde pendem fitas compridas de várias cores; saiote de cetim ou cetineta de cores vivas, até a altura dos joelhos, enfeitado com gregas e galões, tendo por baixo saia branca, com babados; blusa, peitoral e capa.

O traje do Rei deve ser mais bonito e enfeitado. Veste saiote ou calção e blusa de mangas compridas de cores iguais, peitoral, manto de cores diferentes em tecido brilhante (cetim ou laquê);calça sapato tênis (tipo conga), meiões coloridos e na cabeça uma coroa feita nos moldes das dos reis ocidentais, semelhante a das outras figuras, porém encimada por uma cruz; levam nas mãos uma espada e, às vezes, também um cetro. Durante o cortejo os Reis vêm na frente, logo atrás do Mestre e do Contramestre. A Rainha é representada por uma menina, com vestido “de festa”, branco ou rosa, uma coroa na cabeça e um ramalhete de flores nas mãos.

O Contramestre é o responsável pelo Reisado na ausência do Mestre. Seu traje é semelhante ao daquele, só que menos pomposo.

Os Mateus, que sempre aparecem em dupla, usam trajes diferentes dos outros figurantes: vestem paletós e calças de tecido xadrez, usam um grande chapéu afunilado que chamam de cafuringa, com espelhos e fitas coloridas, óculos escuros, rosto pintado de preto, geralmente com tisna de panela ou vaselina e levam nas mãos os pandeiros. São os personagens cômicos do Reisado, junto com a Catirina.

Conhecida antigamente como Lica, a Catirina é a noiva do Mateus. Veste-se de preto, traz um pano amarrado na cabeça, o rosto pintado de preto e um chicote nas mãos, com o qual corre atrás das moças e crianças.

As outras figuras formam o coro do Reisado, que participam ativamente apenas nas batalhas, nas danças e no canto, quando respondem ao solo do Mestre. Formam duas fileiras simétricas, organizadas hierarquicamente e posicionadas uma do lado direito outra do lado esquerdo do Mestre.

É uma das tradições populares mais ricas e apreciadas do folclore brasileiro, principalmente na região Nordeste.

Folia de Reis. Xilogravura
Elias Santos. Reisado. Xilogravura
Luiz Fernando Cajueiro. Dona do Reisado. Óleo s/tela
Figura de Reisado – Cerâmica

Figuras de Reisado – Cerâmica
Bois de Reisado – Cerâmica ALAGOAS

Reisado de Zabelê.

Reisado Flor de Mandacaru, do Povoado Pedrão, apresenta-se em Olho d´Água das Flores, Alagoas, em 2007

Katarina Real (foto). Rainha do Reisado. Maceió. 1962

Katarina Real (foto). Guerreiros. Grupo de Reisado na Festa de Reis. Maceió. 1961

BAHIA

Raul Lisboa (foto). Reisado. Chapada Diamantina, Bahia

Raul Lisboa (foto). Reisado. Chapada Diamantina, Bahia

Reisado. Lençóis, Chapada Diamantina, Bahia

Brincante de Reisado. Chapada Diamantina, Bahia

CEARÁ

Palhaço . Crato, Ceará

Reisado. Crato, Ceará

Brincante de Reisado. Cariri, Ceará

Eduardo Almeida (foto). Reisado. Abertura da VII Mostra SESC Cariri de Cultura

Reisado do Mestre Zé Pio MINAS GERAIS
Palhaços

CONSUELO ABREU (FOTO). FOLIAS DE REIS D. BOSCO. PARAOPEBAS, MINAS GERAIS

PARAÍBA
UY JOSEPH (FOTO). REISADO DE MESTRE ABEL

PERNAMBUCO
Reisado de Caraíbas, Pesqueira, Pernambuco

Reisado de Caraíbas, Pesqueira, Pernambuco

PIAUÍ
Festa de Reisado. Boqueirão, Piauí

Boi do Reisado da Boa Hora. Piauí

Boi Coração. Festejo dos Santos Reis. Comunidade de Vinagreira, Município de Lagoa Alegre

Reisado de Boa Hora. Piauí

Bicho Folharal. Reisado. Piauí

RIO GRANDE DO NORTE

Reisado do Sararé. Potengi, Rio Grande do Norte

SERGIPE

Reinado Sergipano do Guarujá

Luiz Inácio Lula da Silva e brincante do reisado Quarteirão dos Trapiches. Laranjeiras, Sergipe

DISCOGRAFIA
DVD

Mitos e Lendas do Reisado de Inhamuns

FONTES CONSULTADAS:
.BARROSO, Oswald. Reis de Congo. Fortaleza: Museu da Imagem e do Som, 1996.
.RIBEIRO, José. Brasil no folclore. Rio de Janeiro: Gráfica Editora Aurora, 1970.
.DALWTON MOURA-http://diariodonordeste.globo.com;
http://www.terrabrasileira.net/folclore/regioes/6ritos/reisado.html; http://www.fundaj.gov.br/notitia/servlet/newstorm.ns.presentation.NavigationServlet?publicationCode=16&pageCode=316&textCode=5772&date=currentDate
AUTORIA; Ligia Lopes Silva

PARA SABER MAIS:
Felicitas. Danças do Brasil. Rio de Janeiro, Editora Tecnoprint Ltda., sem data.
Pesquisa de textos e seleção de imagens:
Carlos Eugênio Marcondes de Moura
Imagens obtidas em Google Imagens

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