Série que retrata a vida de jovens gays soropositivos vira fenômeno na internet

 

A série Positivos conta a história de um grupo de jovens gays e portadores do vírus HIV, que moram em um apartamento no Rio de Janeiro. Criada por Daniel Sena, baiano, de 26 anos, formado em jornalismo, o trabalho tem como finalidade  alertar sobre o perigoso da doença.   

Uma trilogia que explora alguns dos estereótipos mais comuns da comunidade homossexual como: o ‘homem mais velho’ que se descobriu gay mais tarde e serve de mentor para os outros; o ‘jovenzinho apaixonado’ que tem medo de transmitir o vírus para o namorado; o ‘gato’ que tem relação sexual sem preservativo para transmitir o vírus; e a ‘bichinha traiçoeira’ que se dedica a semear a discórdia entre os amigos.

Outros personagens também estão na história: como um heterossexual que ainda não contou para a noiva que é soropositivo, e uma mãe que transmitiu o HIV para o filho por acidente. Todos fazem parte de um grupo de apoio que se reúne no apartamento.

Sem nenhum patrocínio ou recurso, a produção independente tem como principal tema a AIDS. Segundo Daniel Sena, criador da série, a produção tem o objetivo alertar não apenas para a prevenção à doença, mas também para a necessidade do acompanhamento médico periódico do quadro de saúde por soropositivos e como lidar com a doença.

Positivos é um mix de drama e comédia inspirado na vida real, uma vez que os personagens remetem suas vidas à evolução do tratamento e as consequências que a doença pode causar. Um ponto marcante da série é a trilha sonora, toda de artistas nacionais independentes que cederam as faixas gratuitamente. O telespectador pode conferir as músicas no site [http://www.seriepositivos.com/].

A série que já tem 10 episódios, exibidos semanalmente no Youtube, ganhará no ano que vem mais 10 capítulos. A promessa foi feita na página do seriado no Facebook, por Daniel Sena. A segunda temporada está prevista para estrear Janeiro de 2014. A produção pede doações para a realização da próxima edição. O Sopa Cultural conversou com Daniel Sena, o baiano criador de Positivos.

Abaixo a entrevista completa

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Foto: Divulgação

Sopa Cultural: Antes de mais nada, por que “Positivo”?
Daniel Sena: É um desdobramento da palavra “soropositivo” e porque dá essa ideia de seguir em frente, ter bons pensamentos. Apesar do diagnóstico as pessoas tem que ser positivas, lutar contra a doença e viver bem. É um título que nos permite trabalhar com os dois sentidos, médico científico e dos sentimentos.

“Positivos” é um mix de drama e comédia inspirado na vida real e mostra um grupo de jovens que vivem no Rio. De onde veio à inspiração para a criar a série?

Eu já escrevi e produzi outras produções do gênero, mas eu queria falar de algo que tivesse uma relevância social e que contribuísse para acrescentar a vida das pessoas sem a necessidade de ser chato ou didático. Quando vou escrever, sempre parto de uma história de amor, é a minha base e ao redor dela destrincho as situações e personagens. Mas creio que a inspiração vem da inquietação ao ler coisas que nos incomodam, ao ver o preconceito por falta de informação.

Essa trilogia [não sei se posso chamar assim] é baseada em algum fato real de sua vivencia? Você, alguém de sua família ou algum amigo tem AIDS?

A vida pessoal do autor sempre é o ponto de partida pra uma história, seja por algo que ele viu ou vivenciou. No caso de “Positivos”, o ponto de partida foi ter visto um tio meu, Djalma, que foi diagnosticado com HIV nos anos 80 e faleceu no fim da década de 90. Ele conviveu tão dignamente e bem com isso que eu queria mostrar as pessoas que era possível superar apesar do preconceito e das adversidades que a AIDS provoca. E ele sempre ajudava as pessoas com seus conselhos e atitudes foi aí que resolvi concentrar meus personagens no apartamento. E além disso, conheci algumas pessoas soropositivas que se tornaram amigos e queria de alguma formar ajudá-los contando uma história que os representasse.

No Brasil são descobertos cerca de 36 mil nossos casos por ano e cerca de 11 mil pessoas morrem em consequência do vírus. Você acha que a série mostra uma situação real ‘nua e crua’ da doença? E por isso tende a passar para o público informações de como combater a AIDS e como não transmitir a doença?

Minha maior preocupação foi não ser didático e não passar a impressão de que a história da webserie era a verdade absoluta. O que acontece em “Positivos” é baseado numa realidade, mas que condiz ao universo dos personagens. Acho que a trama é representativa, consegue chegar muito perto do que realmente acontece, mas ainda assim é uma história de ficção. Acredito que funciona muito mais como um alerta a sociedade, informa, cutuca, faz refletir, mas ainda tem muitos temas a serem abordados. É um produto de entretenimento, com sua função social bem definida e que propõe um debate pautado sempre numa pesquisa verídica. Talvez por isso as pessoas se identifiquem tanto porque conseguem reconhecer um amigo, um parente ou sua própria história ali relatada.

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Foto: Divulgação

Como foi a captação para o filme? E como se deu à escolha dos diretores, atores, equipe técnica do filme?

“Positivos” é um produto independente e feito sem qualquer recurso financeiro. Os atores foram convidados para o projeto e viraram voluntários, já que não houve pagamento de cachê e as despesas de transporte, alimentação, figurino eram custeados por eles. A equipe técnica foi formada por mim e pelo Mateus Cabral, que foi quem emprestou os equipamentos para as gravações. Mas não houve uma produção efetiva, mas queríamos levar o trabalho para o conhecimento do público.

Como foi a construção de cada personagem? Algum foi mais difícil para criar?

Pro autor todo personagem é difícil porque ele precisa parecer verdadeiro para o público. Mas posso arriscar que a construção do Guilherme (Hugo Carvalho) e do Ícaro (Tunai Menandro) foram as que mais me consumiram, pois tratam de personagens que estão em pilares éticos e morais bem diferentes um do outro, mas que são facilmente apontados no convívio real. Existem muito deles por aí.

Qual é a dificuldade em fazer uma série independente? Você tem ajuda de parentes ou de amigos?

Produzir algo do porte de “Positivos” sem recurso financeiro é realmente uma luta. A gente tem que se virar, improvisar e isso reflete no resultado final. Mas a equipe se uniu e fez um bom trabalho. Família, amigos, os atores, sempre ajudam, mas infelizmente não é o suficiente, o que não quer dizer que vamos parar, mas estamos buscando melhorar e aberto ao apoio.

Cresceu muito nos últimos anos o número de jovens homossexuais infectados pela AIDS. Você atribui isso a que?

O jovem perdeu o medo achando que o tratamento eficaz da AIDS ameniza as consequências do HIV. Acrescenta-se isso a irresponsabilidade e imaturidade natural a maioria dos adolescentes e temos uma proliferação da coisa. As pessoas acham que vai acontecer com todo mundo, menos com ela, aí mora o perigo.

Em sua opinião, o governo federal deveria investir mais em que para prevenção da AIDS e de outros DSTs?

 Sim. Claramente o governo prioriza remediar do que prevenir. Falta falar para o público de uma maneira mais efetiva. As campanhas são falhas, mas também não posso criticar totalmente o governo, pois temos, por outro lado um bom trabalho de assistência ao soropositivo muito bem avaliado se comparado a outros países.

Você pretende produzir uma segunda temporada?

Já estamos produzindo e desta vez com uma qualidade técnica melhor, através da NeoCanal, um projeto que reúne algumas produtoras do Rio que trabalham nesse processo independente. A segunda temporada estreia em janeiro de 2014 e contará com outros personagens além do entrecho principal da primeira temporada. Agora vamos abordar mais a fundo as consequências do HIV e trazer questões que não foram tratadas nos 10 episódios.

Qual a mensagem que você gostaria de deixar para quem tem relação sexual sem camisinha ‘a Deus dará’ e para aquela pessoa que descobriu que foi infectado?

Para quem faz relação sexual sem camisinha eu digo que a pessoa deve ter respeito com seu corpo, com a sua vida. É um caminho sem volta e arriscado e a culpa de qualquer consequência é dela própria. Para quem descobre o diagnóstico é respirar fundo e seguir em frente porque existem inúmeras possibilidades para se ter uma boa qualidade de vida, mas num caso e no outro, sempre somos responsáveis pelo caminho que seguiremos.

 

Fonte: Sopa Cultural

 

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