Seun Kuti lança seu clipe Black Woman

“Seun Anikulapo Kuti, filho mais novo do lendário músico e ativista nigeriano Fela Kuti, presta homenagem às mulheres pretas em sua música “Black Woman”, última faixa do disco “A long way to the begining” (2014). 

enviado por Pedro Rajão  para o Portal Geledés

A história do afrobeat é definitivamente marcada pela presença feminina. Fela Kuti, líder da banda Afrika 70 (hoje Egypt 80), é muito criticado por suas posições machistas em letras de músicas como ”Lady” e comentários, falas e entrevistas em que fala de sua visão sobre a influência ocidental do feminismo buscando equidade de gênero sob as mulheres africanas, bem como sua rotina sexual com as 27 Queens com as quais era casado.

É claro que contextualizar Fela não diminui o peso de suas frases nem os fatos sobre a sua vida e comportamento. E o que o torna ainda mais interessante enquanto figura humana são suas muitas contradições. Há de se pontuar que o músico cresceu na Nigéria militarista dos anos 1940, vinte anos antes da Nigéria se tornar independente.

Porém, é indiscutível e fundamental a influência de sua mãe, (talvez uma das mais respeitadas feministas do mundo) Funmilayo Kuti e de Sandra Izidore, cantora americana black panther com quem Fela muito aprendeu sobre seus ideiais panafricanistas e através de quem teve seu primeiro contato com o movimento negro americano, em 1969.

Nascido e criado na República da Kalakuta, Seun Kuti recebeu do pai a incumbência de liderar sua banda quando ainda tinha 12 anos. Fica clara a diferença de abordagem do tema com relação a seu pai, quando Seun dedica a música às mulheres negras, falando sobre a beleza do cabelo, cor da pele, atentando para que não se enquadrem em padrões estéticos estrangeiros e da TV. Seun também lembra da força das mulheres negras ao falar do sofrimento físico com agressões e guerras pelas quais são historicamente submetidas. E também fala sobre um problema gravíssimo no continente africano: o branqueamento de pele. O procedimento estético através de um creme (bleeching cream) que fere e queima a pele de muitas mulheres é uma questão de saúde pública na Nigéria. Fela já denunciava o problema no disco Yellow Fever e segundo Seun, usa-se mais hoje do que nos anos 70.

Tive o prazer e responsabilidade de idealizar o projeto. Logo depois convidei Micael Hocherman, o fotógrafo que viajou comigo para a Nigéria e quem mais filmou para o documentário ANIKULAPO. Para que os equipamentos usados fossem os melhores possíveis, nos aliamos à Cadenza Filmes e à Maraberto Filmes, e convidamos o Wagner Novais para somar na direção das personagens.

Quando soube que Seun viria de novo ao Brasil em 2014, perguntei a ele se não queria gravar um clipe aqui. Como já trabalhamos juntos em outras ocasiões, ele topou. Me disse para qual música queria o video e eu caí dentro da pré-produção e conceito do roteiro. Convidei os profissionais mais próximos, amigos entusiastas e nos aventuramos nessa empreitada independente.

No elenco do clipe, destacam-se as dançarinas e militantes do Balé das Yiabas, além de Vanessa Soares, educadora e dançarina que há anos usa a biografia de Fela em seus trabalhos e esteve recentemente no palco do Shrine, em Lagos, Nigéria. Há também uma breve aparição de Selma Candeia, filha do próprio, atual presidente do G.R.A.N.E.S. Quilombo e uma das yabás da feira homônima de Madureira. O belíssimo figurino é assinado por Tenka Dara, da Baobá Brasil, que também atua no clipe.

Filmamos entre 2014 e 2015. A primeira tomada foi na antiga estação de trem Augusto Pestana, em Porto Alegre (com SK e banda) e depois com um timaço de mulheres negras – dentre dançarinas, educadoras, musicistas, atletas paralímpicas, atrizes e militantes – em outras duas locações no Rio de Janeiro, uma delas, a favela do Jacarezinho.

Ao final da música, Seun cita seis mulheres negras:

Olufunmilayo Anikulapo (sua avó),
Maya Angelou (poetisa, escritora e militante americana),
Angela Davis (filósofa e militante Black Panther americana),
Zeina Badawi (jornalista e ativista sudanesa),
Rainha Amina (notável rainha nigeriana do séc. XV) e
Nina Simone (musicista e militante americana).

A maioria delas foi grafitada ao fundo das locações.

O único pedido de Seun foi que incluíssemos sua filha na filmagem. Alguns meses depois da vinda ao Brasil, um amigo fotógrafo que mora em Berlim (Felipe Levy) voou até Paris e encontrou com Seun, Adhara (sua filha) e a mãe dela, a backvocal e dançarina do Egypt 80s, Yetunde Ademiluyi para fazer o registro da pequena Kuti.

Filmar numa estação de trem abandonada desde 94 e num hotel abandonado desde os anos 60 foi bem cansativo e imprevisível. Toda a equipe trabalhou num espírito de cooperação e paixão pelo tema inspiradores.

Seun e todos os membros da banda e da produção foram muito generosos e demonstraram entusiasmo com o projeto, confiaram na nossa parceria.

A diária de gravação no Jacarezinho foi acolhedora demais, toda a comunidade ficou curiosa e receptiva com a equipe. Desde a marcha de mulheres pretas pelas vielas, à locação do bar do Edgar, até a dança nos trilhos do trem ao cair do sol.

‘Black Woman’ foi gravada no maior país negro fora da África, durante as prévias da Marcha Nacional das Mulheres Negras em Brasília. É um tributo, uma exaltação à potência e majestade das muitas mulheres negras frutos da diáspora africana pelo mundo. Uma pequena reverência em meio à brutalização e hipersexualização do corpo feminino, as vítimas do Boko Haram, as Claudias brutalmente assassinadas pela PMERJ, as mães e viúvas da Black Live Matters.
Todo brilho às mulheres pretas do mundo.”

Pedro Rajão
Diretor, idealizador e produtor do clipe
Diretor do documentário ANIKULAPO

 


FICHA TÉCNICA

Elenco:

Balé Das Yiabas { Ana Flávia, Ludmilla Almeida e Sinara Rúbia}

Aline Valentim
Eder Francisco de Souza
Edgar Caldas Lima
Isabel Martins
Isabel Zua
Julyana Cristina
Josy Kelly
Le Kita
Lucas Nascimento Santos
Marcelo do Patrocínio
Marta Oliveira
Nay Mahim
Pedro Rajão
Samille Possidonio
Selma Candeia
Suzana Barbosa
Tenka Dara
Thauany Furtado
Thiago Reis Cavalcante
Vanessa Soares

Direção:

Micael Hocherman

Pedro Rajão

Wagner Novais

Idealização:

Pedro Rajão

Direção de Fotografia: 

Micael Hocherman

Edição:

André Tertuliano

Finalização:

Bernardo Neder

Produção Executiva:

Micael Hocherman

Pedro Rajão

Produção Local:

Elcimar Pereira
Josy Kelly
Rafael Rubim

Direção de Arte: 

Érick Citron,

Micael Hocherman,

NAVIU (Nando Pontes e Rafael Bandeira)
Grafites: 

Érick Citron

NAVIU (Nando Pontes e Rafael Bandeira)

Câmeras:

Breno Soares
Felipe Drehmer
Filipe Tomassini
Fernando Teixeira
Micael Hocherman

1o Assistente de Câmera:

Filipe Tomassini
Lucas Cunha
Rodrigo Savastano

2o Assistente de Câmera:

Claudio Gustavo
Thiago Vasques

Gaffer:

Marx Franzen

Elétrica:

Lucas Noleto
Hugo Leo Ribeiro
Marcell Carrasco
Marx Franzen

Figurino:

Baobá Brasil

Maquiagem:

Leilane Morsch
Marta Oliveira

Fotografia Still:

Stephane Goanna

Cathering:

Dhalia Rajão
Kátia Guimarães

Transporte:

Antonio Pessoa
Fernando

Making Of:

Paulo Rhasta

Produção Audiovisual:

Cadenza Filmes
Maraberto Filmes

Co-Produção:

Voodoo
Odun Filmes
Groove Cultural

Imagens Aéreas:

Libélula Produções

Apoio:

Eduardo Guspe – Duque Galo 250
Produtora Jacaré É Moda
Associação dos Moradores do Jacarezinho

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