A Constituição precisa de uma guardiã negra

Como disse Lula, quando as instituições reproduzem as desigualdades, elas fazem parte do problema

FONTEFolha de São Paulo, por Ana Cristina Rosa
A jornalista Ana Cristina Rosa é Jornalista especializada em comunicação pública e vice-presidente de gestão e parcerias da Associação Brasileira de Comunicação Pública (ABCPública) - Foto: Keiny Andrade/Folhapress

A Constituição Federal de 1988, principal símbolo do processo de redemocratização do Brasil, completa 35 anos neste dia 5 de outubro. Não é uma data qualquer, especialmente depois de tudo o que o país viveu nos últimos anos —culminando com o 8 de janeiro de 2023, um verdadeiro atentado à nossa democracia.

As bases da Constituição Cidadã estão fundamentadas em pressupostos de liberdade e igualdade que norteiam o Estado democrático de Direito. Nesse sentido, ela introduziu avanços em termos de direitos e garantias fundamentais e de direitos coletivos que passaram a integrar os objetivos programáticos do Estado —embora vários não tenham ultrapassado o plano formal.

OAB-SP faz manifestação em defesa da indicação de uma jurista negra para o Supremo Tribunal Federal – Zanone Fraissat – 20.set.2003/ Folhapress

Fato é que a Carta Magna criou condições para inovações, entre as quais a regulação de terras indígenas e quilombolas, uma resposta a demandas históricas dos povos originários e dos movimentos sociais negros —ainda que pendente de desfecho satisfatório.

São muitos os avanços, especialmente no plano dos direitos sociais. Mas há também entraves que precisam ser superados com urgência para conter ameaças que diuturnamente desafiam a democracia em nome de interesses nada republicanos.

Por capricho ou ironia do destino, a terceira mulher a ocupar o cargo de ministra do Supremo Tribunal Federal em 132 anos se aposenta compulsoriamente na semana de aniversário da Constituição. Também foram só três os ministros negros da Corte até hoje.

Sendo o STF o guardião da Constituição Federal, parece óbvia a necessidade de preencher essa vaga indicando uma mulher negra —não obstante quem pense em gênero e raça como questão superada.
Seria, ainda, uma ótima forma de demonstrar comprometimento com o cumprimento voluntário do objetivo de alcançar a igualdade racial na sociedade brasileira, referido pelo presidente da República na 78ª Assembleia Geral da ONU. Afinal, como disse Lula, “quando as instituições reproduzem as desigualdades, elas fazem parte do problema”.

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