“No estado de São Paulo, nas promoções, seja no critério da antiguidade ou no do merecimento, não há e nunca houve discriminação de gênero. É dizer, em ambos os critérios, promove-se o mais antigo, seja homem, seja mulher.” Este é trecho do ofício do TJ-SP ao Conselho Nacional de Justiça. Os dados do tribunal mostram o contrário. No TJ-SP, há menos de 10% de desembargadoras: há mais desembargadores chamados Luiz ou Luís do que mulheres, segundo dados de 2022 da Anafe. Isso sem falar de raça. Apenas 1,7% de juízes/as são pretos no país, de acordo com levantamento de 2023 do CNJ.
Espanta que tribunais de justiça desconheçam elementos básicos sobre discriminação. De um lado, há o conceito de dependência da trajetória (“path dependence”): um sistema que privilegia a antiguidade é inercial, reproduzirá as desigualdades de gênero anteriormente estabelecidas na instituição. Sem combate ao assédio, sem listas tríplices apenas com mulheres, sem políticas afirmativas, sem letramento de gênero, o que sobra são cortes masculinas em um país plural, mas governado por um Supremo com, se tivermos sorte, duas mulheres.
Outro ponto: limitam o conceito de discriminação a apenas instâncias onde explicitamente o critério “ser homem” seja usado (discriminação direta). Ignoram, portanto, outras instâncias em que a ausência de ações afirmativas leva a um estado inconstitucional de discriminação (mesmo que indireta por regras supostamente neutras, como a antiguidade).
Na última terça-feira (19), o conselheiro do TJ-SP no CNJ pediu vista, adiando a decisão sobre a proposta de alternância de gênero no preenchimento de vagas para a segunda instância do Judiciário para o dia 26.
Não façam como ele; façam como um outro Luiz (o Vieira de Mello), um dos votos pró-paridade até o momento no CNJ. A situação de desigualdade de gênero e raça no Judiciário é vergonhosa, mas é mais obscena ainda a resistência de parte da magistratura a aproximar a instituição oitocentista do século 21.