Abuso reiterado

FONTEFolha de São Paulo
Fachada da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) - Foto: Renato S. Cerqueira/FuturaPress

O caso do deputado estadual Fernando Cury (Cidadania), filmado ao apalpar a colega Isa Penna (PSOL) no plenário da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo no final de 2020, é exemplar ao retratar a displicência e a permissividade com que são premiados os agressores de mulheres no Brasil.

O Conselho de Ética decidiu, por 5 votos a 4, abrandar a pena do parlamentar, acusado de quebra de decoro por importunação sexual. Em vez da punição de seis meses prevista pelo relator, Cury recebeu 119 dias de licença não remunerada e poderá, dado que o afastamento é inferior a 120 dias, manter o gabinete em funcionamento.

O concerto reafirma a agressão a Isa Penna e a estende, simbolicamente, às demais deputadas e à metade feminina da sociedade.

Não se pode admitir que a prática de assédio, perpetrada durante uma sessão parlamentar, diante do presidente da Casa, testemunhada por outros deputados e registrada em vídeo, seja tratada com a leveza de uma traquinagem.

A cassação, desejável pela abordagem abjeta em plenário, deu lugar não à suspensão de seis meses costurada como resposta mínima à conduta abusiva, mas a uma operação de resgate feita de véspera.

Ao votarem a favor do abrandamento da pena, os integrantes do Conselho de Ética da Alesp Wellington Moura (Republicanos), Alex de Madureira (PSD), Adalberto Freitas (PSL), Delegado Olim (PP) e Estevam Galvão (DEM) na prática reputam aceitável que uma mulher seja tratada como objeto.

Com a decisão, ainda, o grupo protege a manutenção de um gabinete inteiro para um deputado suspenso, em claro desperdício do dinheiro da população paulista.

Para não deixar dúvida sobre a covardia que guiou sua decisão, o grupo ainda fugiu após a votação, com o objetivo de que não houvesse quórum para manifestação contrária ao resultado.

Um deles, Delegado Olim, acha que Cury deverá pagar nas urnas.

Olim provavelmente sabe, no entanto, que delegar a punição do comportamento de Cury apenas aos eleitores é inútil, uma vez que o recado dado pela Conselho de Ética é o de que não deve haver maiores consequências àquele que comete assédio contra uma colega —apenas uma “brincadeira idiota”, segundo esse mesmo deputado.

A atitude de Cury e a complacência de seus pares reafirmam a covardia de homens que estão acostumados a reivindicar o tratamento de garotos inconsequentes quando lhes convém. Que o plenário da Assembleia estadual possa reverter uma decisão que tanto o diminui.

 

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