Artista negro morre baleado em distribuidora de bebidas em SP, e policial suspeito é detido

FONTEPor Dhiego Maia, da Folha de S. Paulo
O artista NegoVila, 40 (Foto: Arquivo Pessoal)

O artista NegoVila Madalena, 40, morreu atingido por um tiro que, segundo testemunhas, foi disparado por um policial na frente de uma distribuidora de bebidas de Vila Madalena, na zona oeste da capital paulista, na madrugada deste sábado (28).

A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo informou, no fim da tarde deste sábado, que um policial militar foi detido após um homicídio ocorrido em um bar na Vila Madalena.

“O caso está sendo registrado pelo 14º DP (Pinheiros), que apura os fatos. A Polícia Militar também instaurou um IPM [inquérito policial militar] para investigar todas as circunstâncias relacionadas à ocorrência”, diz a nota.

O assassinato do artista negro acontece nove dias depois de Beto Freitas, também negro, ser espancado até a morte por seguranças de uma unidade do Carrefour, em Porto Alegre. O crime, ainda sob investigação, chocou o país.

NegoVila era o nome artístico de Wellington Copido Benfati. O “Vila Madalena” homenageava o bairro, também da zona oeste de São Paulo, onde ele nasceu e, agora, morreu de forma violenta.

NegoVila estava acompanhado de ao menos nove amigos no Royal Bebidas, uma distribuidora de bebidas. O grupo chegou na noite desta sexta (27) e lá permaneceu bebendo na calçada até a confusão que terminou com o artista baleado, por volta das 4h30 deste sábado.

A Folha apurou com amigos da vítima, que preferiram não se identificar por segurança, que o artista foi baleado ao tentar separar uma briga entre um de seus amigos e o PM. Os motivos da briga ainda não estão esclarecidos.

As testemunhas disseram que, ao tentar acabar com a confusão, NegoVila foi agredido com um soco no rosto desferido pelo policial. Ele revidou.

Armado, o policial deu um tiro para o alto e causou uma correria entre os frequentadores da distribuidora que estavam na calçada. Assustado, NegoVila também correu, mas caiu no chão.

Foi, então, que, segundo as testemunhas, o policial se aproximou e atirou contra o artista. O tiro atingiu o tórax da vítima.

Amiga do artista, Luana Cruz de Campos, 37, conta que só percebeu que NegoVila havia sido baleado quando viu ele caído.

“Quando ele caiu, o policial veio e apontou a arma na direção dele para atirar mais. Foi quando eu coloquei meu corpo em cima do dele e implorei: por favor, não!”, diz a assistente administrativa, em versão corroborada por outras testemunhas.

Campos diz que o policial se afastou, e ela conseguiu conversar com NegoVila até a chegada do resgate. “Está tudo bem?”, perguntou. O artista só conseguiu responder: fui baleado. “Eu vi o sangue e comecei a gritar. Foi horrível”, diz ela.

NegoVila foi socorrido e levado ao Pronto-Socorro da Lapa, mas segundo a irmã do artista, Tatiane Cristina Benfati, ele chegou morto na unidade hospitalar. Muito abalada, Tatiane disse que seu irmão “não merecia ter morrido dessa forma”.

“O racismo é algo que existe, né, no Brasil. O cara que matou meu irmão é branco. Ele nunca viu meu irmão na vida dele. Ele não tinha nenhum motivo para fazer isso”, afirma.

A polícia chegou rapidamente ao local, a poucos metros do 14º DP, onde o caso foi registrado e está sendo investigado, e o policial foi detido em flagrante.

A Folha não localizou a defesa do suspeito.

NegoVila era rapper, skatista, muralista, artista plástico e assistente de produções cinematográficas. Ele deixa uma filha, de nove anos que, segundo a família, estava ansiosa para viajar com o pai no final deste ano, três irmãos e muitos amigos.

Nas redes sociais, amigos da vítima protestaram contra a morte do artista. Numa das postagens, uma foto de uma faixa estampava: “PM assassina”.

‘ERA UM PAI EXTREMAMENTE CARINHOSO’, DIZ EX-NAMORADA

Arrancaram uma pessoa que ia estar sempre na nossa vida. Uma pessoa que queria muito bem a gente —e era recíproco.

O Wellington era amoroso. Gostava de fazer todos os passeios culturais da cidade com a nossa filha, Sara. Era um pai extremamente carinhoso.

Ele sempre fazia ela dar risada e cuidava dela com muito carinho. Nós éramos namorados e, um belo dia, fiquei grávida.

Quando a gestação completou seis meses, a gente se separou, mas ele sempre esteve presente para o que desse e viesse na criação da nossa filha.

O Wellington era uma pessoa que gostava de viver. Sempre deixava o ambiente animado onde chegava.

Era um artista. Cantava, fazia obras de vidro lindas, grafitava e tocava na Escola de Samba Pérola Negra.

Sempre alto-astral, animava todo mundo. Enfim: era uma pessoa que não media esforços para ajudar os outros.

Depoimento de Ágatha Yazbek, 32, psicóloga

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