A ativista colombiana estuprada por denunciar estupro

Uma mulher colombiana negra, ves tindo um turbante colorido e roupas soltas, se debruça sobre seu paciente e suavemente pressiona sua barriga.

Do Terra

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“Onde dói?”, ela pergunta, em uma sala cheia de plantas e posteres coloridos. Ela usa raízes e sementes para tratar pacientes no Centro de Vítimas do Conflito Armado, no subúrbio de Bogotá.

As pessoas vão à clínica estatal em busca de algum alívio para o sofrimento a que foram submetidas durante os combates entre guerrilheiros e governo colombiano, que durou mais de meio século até que um acordo de paz fosse firmado, na última semana.

A própria Maria (nome fictício), a mulher do turbante, está se recuperando de um trauma horrível, que a forçou a deixar sua casa.

Como 1 em cada 10 colombianos, ela virou uma refugiada em seu próprio país. Quase 7 milhões de pessoas foram deslocadas e mais de 220 mil mortas desde 1964, quando as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) passaram a pegar em armas contra o Estado para pedir igualdade social e reforma agrária.

E embora as Farc tenham assinado o acordo de paz, outros grupos armados, incluindo paramilitares de direita, ainda aterrorizam partes do país.

Maria sente saudades e sonha em voltar para casa, em Quibdo

Há seis anos, Maria morava em Quidbo, capital do departamento de Choco, um dos mais pobres do país.

Maria era líder de uma grupo feminino chamado AfroMuPaz, que dava apoio a famílias deslocadas pelo conflito.

Ela também era uma ativista contra o recrutamento de crianças-soldado e denunciava grupos armados por abusos sexuais cometidos contra mulheres e meninas.

A região, que é cortada por rios e tem fronteira tanto com as costas do Pacífico quanto do Caribe, é alvo de disputa entre grupo armados que lutam pelo controle das rotas de tráfico e acesso a minas de ouro ilegais.

Esses grupos abusavam de mulheres, e o AfroMuPaz foi um dos poucos a denunciar os crimes.

Em julho de 2010, um homem disse a Maria que queria doar roupas e sapatos de crianças para o grupo. Ele se ofereceu para levá-la para outro bairro e buscar as coisas.

‘Entrei no caminhão dele sem suspeitar de nada”, diz ela. “Mas quando ele começou a dirigir me senti inquieta e perguntei onde estava a doação. Aí alguém apontou uma arma para a minha cabeça e colocou um capuz em mim.”

Região é disputada por traficantes

Maria foi levada para a selva e, quando tiraram seu capuz, ela viu que estava cercada por homens armados e, para seu horror, viu um soldado saindo de uma cabana com a filha dela, Camila, de 13 anos.

Camila havia sido enganada por uma integrante do grupo paramilitar Los Rastrojos. A mulher havia dito à menina que eles iriam encontrar sua mãe. “Mas fomos sequestradas, as duas”, diz Maria.

Oficialmente, essas milícias de direita não existem mais. Elas foram desmobilizadas há uma década, mas muitas ressurgiram ou viraram grupos criminosos.

Originalmente sob um grupo “guarda-chuva”, o AUC (Autodefensas Unidas de Colombia), as milícias eram financiadas por donos de terra e traficantes que queria proteção contra sequestros e extorsões feitas pelas guerrilhas de esquerda.

Ao cair da noite, a adolescente foi levada, e Maria foi amarrada a uma árvore com três homens de guarda. Ela ficou coberta de sangue devido a golpes que recebeu na cabeça.

“Primeiro achei que eles iam me matar”, diz. “Mas aí um deles me disse que eles iam me punir por falar demais. Começaram a me mostrar suas genitais e percebi o que fariam. Comecei a gritar: Ok, façam o que vocês quiserem, mas por favor não toquem na minha filha. Não toquem na minha filha!”

Maria foi estuprada repetidas vezes por cinco homens, durante cinco dias. Uma hora ela desmaiou – e quando acordou estava em um hospital em Quidbo. Ela havia sido encontrada no acostamento de uma estrada após sua filha mais velha dar o alerta e pessoas começarem a procurar por ela.

Camila, a filha mais nova de Maria, havia sido devolvida para a casa da família, muito traumatizada mas sem lesões físicas. “Eles disseram que se ela falasse alguma coisa sobre o que havia acontecido eles me matariam”, conta Maria. “Então ela parou de falar. Por muito tempo, só dizia ‘sim’ e ‘não’ e chorava quase todo dia.”

O conflito já dura mais de 50 anos

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