Barroso restabelece mandato de Renato Freitas e anula ato que decretou cassação

Freitas perdeu mandato após ser acusado de invadir igreja em ato antirracista. 'Quebra de decoro parlamentar não pode ser invocada para fragilizar a representação política de pessoas negras', diz decisão.

FONTEPor Ana Krüger, do G1
Vereador Renato Freitas (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), restabeleceu na noite desta sexta-feira (23) o mandato do vereador de Curitiba Renato Freitas (PT).

O parlamentar perdeu o mandato em agosto por quebra de decoro. Ele foi acusado de invadir a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, em fevereiro, durante manifestação antirracista.

A decisão de Barroso também anula decisões do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) que negaram pedidos de Freitas e que mantiveram ato da Câmara Municipal que decretou a cassação. Leia a íntegra da decisão.

“A cassação do vereador em questão ultrapassa a discussão quanto aos limites éticos de sua conduta, envolvendo debate sobre o grau de proteção conferido ao exercício do direito à liberdade de expressão por parlamentar negro voltado justamente à defesa da igualdade racial e da superação da violência e da discriminação que sistematicamente afligem a população negra no Brasil”, diz Barroso na decisão.

O recurso ao Supremo foi protocolado pela defesa do petista na última quarta-feira (21) e afirma que o processo de cassação durou mais que 90 dias, prazo máximo previsto na legislação federal.

A defesa cita que o TJ-PR manteve o ato de cassação porque o Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Municipal prevê a prorrogação do prazo de duração do processo.

Porém, o recurso argumenta que as decisões do TJ-PR desrespeitaram jurisprudência do STF segundo a qual só a União pode definir sobre crimes de responsabilidade e estabelecer regras de processo e de julgamento desses casos.

Além disso, a defesa de Freitas afirma que a manutenção das decisões implicaria “dano grave e irreparável”, já que além da perda do mandato, levaria ao indeferimento do registro da candidatura a deputado estadual.

Racismo estrutural

A decisão do ministro é liminar (provisória) e ainda terá o mérito julgado. “Sem antecipar julgamentos, é impossível, no entanto, dissociar o ato da Câmara de Vereadores de Curitiba do pano de fundo do racismo estrutural da sociedade brasileira”, diz Barroso.

“Sem me pronunciar, de maneira definitiva, sobre o mérito da cassação do mandato em questão, é necessário deixar assentado que a quebra de decoro parlamentar não pode ser invocada para fragilizar a representação política de pessoas negras, tampouco para cercear manifestações legítimas de combate ao preconceito, à discriminação e à violência contra elas”, complementa o magistrado.

O advogado Guilherme Gonçalves, que atua na defesa de Freitas, afirmou saber que em algum momento “injustiça seria corrigida”.

“A decisão não reconhece só a ilegalidade da cassação do Renato Freitas, a liminar reconhece a injustiça, a inconstitucionalidade, e a inexistência de qualquer quebra de decoro de um menino jovem, negro, periférico, que ousa superar o apartheid social e se eleger vereador”, disse.

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