Blindado pela Confederação de Ginástica, Ângelo Assumpção é cauteloso ao falar de injúrias raciais

‘Todos são meus amigos e não cabe a mim determinar o que deve ser feito’, disse o ginasta

Por Claudio Nogueira  Do O Globo

Desde o início da repercussão do vídeo contendo injúrias racistas divulgado com exclusividade pelo GLOBO na última sexta-feira, Ângelo Assumpção ainda não veio a público explicar de maneira clara o que aconteceu na concentração dos atletas brasileiros em Portugal. O ginasta permanece em silêncio e o único contato possível é através de e-mails, que passam pelas mãos da assessoria de imprensa da Confederação Brasileira de Ginástica (CBG). As resposta carregam um tom político.

Com a velocidade da internet, tudo se espalha rapidamente e ultimamente tudo o que cai nas redes sociais, sendo bom ou ruim, pode tomar a proporção que tomou — escreveu ele, ao ser perguntado se a repercussão foi maior do que deveria ser.

Não deixar o atleta ter contato direto com a imprensa para explicar o caso tem sido a tática da CBG. Os treinos estão sendo realizados a portões fechados no CT na Barra da Tijuca e não existe previsão de data para uma entrevista coletiva. Procurada, a CBG informou que a presidente Luciene Resende não pode falar sobre nenhum assunto, nem mesmo a grave acusação de injúria racial.

No meio desse silêncio, fica impossível saber como Ângelo está emocionalmente e de que forma tem sido orientado. Sua última aparição foi em um vídeo no qual parece constrangido, afirmando que tudo não passou de uma brincadeira, ao lado dos três outros atletas que teriam cometido a injúria: Arthur Nory, Fellipe Arakawa e Henrique Flores (filho de Marcos Goto, que é negro, e treina o campeão olímpico e mundial nas argolas Arthur Zanetti).

— O meu objetivo é muito claro: quero continuar fazendo parte da seleção e buscar resultados para o meu país. É nisso que estou focado — afirmou Ângelo.

Em uma de suas respostas à entrevista por e-mail, Ângelo prefere não emitir opinião e transfere para a CBG todas as responsabilidades das medidas que devem ser tomadas sobre o episódio:

Todos são meus amigos e não cabe a mim determinar o que deve ser feito. Essa decisão cabe à CBG.

DEFESA PELA COMISSÃO TÉCNICA

Na esfera judicial, só é possível julgar um caso de injúria racial caso a vítima registre uma ocorrência contra os acusados. Pelas declarações e o próprio posicionamento da CBG, tudo indica que Ângelo não levará o caso adiante. No entanto, a Educafro, entidade que organiza pré-vestibulares para jovens negros e carentes, estuda uma ação judicial. Eles irão alegar que as ofensas atingiram não só a Ângelo, mas como a todos os negros brasileiros.

— A ofensa chamando os negros de saco de lixo está até agora machucando a minha autoestima enquanto negro. Não sou lixo — disse frei David dos Santos, diretor da Educafro.

Perguntado se defenderia os colegas em algum julgamento, Ângelo foi direto:

— Eles se arrependeram, estão sofrendo as consequências do que fizeram e, se for necessária alguma defesa, prefiro que seja feita pela comissão técnica.

Apesar de toda a repercussão negativa do vídeo, Ângelo garante que o ambiente da seleção brasileira não mudou:

— O ambiente segue como antes e com um só objetivo: representar bem o país nas competições importantes. Nós somos uma equipe e continuamos unidos.

Ângelo, Fellipe, Arthur e Henrique estão treinando juntos no CT na Barra da Tijuca. A entidade já informou que um inquérito foi aberto no Superior Tribunal de Justiça Desportiva da ginástica para definir “eventuais punições”, mas não existe um prazo para anunciar as medidas que serão tomadas.

Após a divulgação do vídeo, os acusados de injúria passaram a receber inúmeras ameaças nas redes sociais. Neste ponto, Ângelo se mostra preocupado com a integridade física de seus colegas:

— Sou contra qualquer tipo de agressão, mesmo verbal. Eles não podem ser tratados como criminosos. Eles erraram, se arrependeram, e não há motivos para serem ameaçados. Nada pode ser resolvido dessa forma.

-+=
Sair da versão mobile