Clementina de Jesus

(Foto: Hipólito Pereira 30/11/1984 / Agência O GLOBO)

Clementina de Jesus, nascida em Valença, Estado do Rio, a 7 de fevereiro de 1902,  ainda menina, acompanhava a sua mãe, com a incumbência de acender seu cachimbo que, lavando roupa, fumava.

Enquanto lavava, Dona Amélia cantava lundus, jongos, corimas, modas, incelenças, pontos, chulas e cantos de trabalho, que a filha guardou em sua memória e viria a registrar 50 anos mais tarde.

Um diamante bruto. Assim se poderia definir essa cantora que deu inicio à sua carreira profissional aos 48 anos de idade, depois de ter trabalhado por mais de vinte anos como empregada doméstica na casa da mesma familia que gostava de ouvi-la enquanto lavava, passava a ferro ou preparava comida, com exceção da dona da casa que dizia que sua voz a irritava por parecer um miado de gato.

Seu canto rouco e quase falado estava fora de qualquer padrão estético e até hoje sem qualquer paralelo entre as cantoras brasileiras. Almas gemeas, não pelo repertório mas pela forma selvagem e pela maneira que integrava voz e corpo, que se soltava com todo o tipo de dança, podem se comparar a cantoras afro norteamericanas como uma Bessie Smith.

Dessa forma sua ancestrialidade africana permitiu que ela estabelecesse uma ponte do riquíssimo folclore dos terreiros com a linguagem urbana e contemporanea. Clementina foi o retrato do sincretismo Brasileiro. Das rezas em gege e nagô e cantos em iorubá que ouvia de sua mãe e dos hinos católicos que cantava no coro da igreja; dos pontos de candomblé e dos sambas de roda das festas das quais participava.

Em 1963 foi convidada por Herminio Bello de Carvalho que a ouvira anteriormente numa festa a subir ao palco do Teatro Jovem, em Botafogo, abrindo o movimento Menestrel, que unia os eruditos aos populares.

O erudito que acompanhou Clementina de Jesus foi o violonista Turibio Santos.

A repercurssão foi enorme, e inspirou Carvalho a dar sequencia. Foi criado o musical Rosas de Ouro. Nele, Clementina contracenava com a cantora de Teatro de Revista, Araci Cortes e tinha como acompanhantes jovens talentos, como Paulinho da Viola, Elton Medeiros e Nelson Sargento, entre outros.

CLEMENTINA DE JESUS não foi à escola para aprender técnica vocal, aprendeu sim a cantar, ou melhor, desenvolveu seu canto durante o trabalho do dia a dia. TINA ou QUELÉ como era chamada pelos amigos, gravou ao longo de sua carreira 9 LPs e 3 compactos e participou de discos de outros artistas, como por exemplo Milton Nascimento.

Essa Afro-Brasileira maravilhosa apresentou-se também na Africa e Europa. Chegou mesmo a cantar a Marselhesa, hino nacional francês na própria França. Não foi grande vendedora de discos e como disse Carlos Calado, crítico musical “Irônico e triste, mas em certos países as bijuterias valem mais que os diamantes brutos.”

TINA ou QUELÉ, morreu em julho de 1987 aos 85 anos de idade deixando um vazio mas a memória de uma raça registrada para as gerações futuras.

Pesquisa: Carlos Eugênio Marcondes de Moura

-+=
Sair da versão mobile