Como grupos do Facebook contribuem para o feminismo

Nossa repórter, Nathalia Levy, participou de grupos feministas do Facebook e conta sua experiência aqui.

Ser ativista é exercer uma atividade política com grande empenho. Segundo o dicionário Michaelis, é também direcionar toda a criação espiritual, como a arte e a teoria científica, a uma meta específica. Nas ruas ou atrás de um computador, é possível, sim, discutir ideias, aumentar o debate e contribuir para a causa na qual você acredita. E como eu percebi isso? Em grupos no Facebook!

No meu caso, minha meta é o fim da desigualdade de gênero. Sou feministae, quando me falam de forma pejorativa sobre o tal “ativismo de sofá”, só consigo pensar em como esses espaços virtuais de discussão me ajudaram arepensar tantos preconceitos, que, no fim, refletiu em tudo o que faço offline.

Isso não é exclusividade do feminismo. Há grupos que abordam racismo, orientação sexual e identidade de gênero, por exemplo, que servem para quem deseja se aprofundar nessas questões ao conversar com pessoas desconhecidas. É verdade que qualquer postagem no Facebook pode desencadear uma grande discussão, mas, dentro desses grupos, o debate costuma ser mais corpulento e com uma diferença importante: ele é sequencial. Os temas são discutidos tantas vezes – com novos links, textos, imagens e dúvidas – que é impossível não acompanhar pelo menos uma delas, já que os posts pipocam o dia inteiro na sua timeline.

Possivelmente você já foi colocado por amigos em algum grupo fechado, que pode ser sobre qualquer assunto. Ainda que exista a impressão de que todos utilizam o Facebook da mesma maneira, há uma parcela que nunca ouviu falar desses parte da rede social. Então, vale a pena se aprofundar um pouco:

Como eles funcionam?

Muirtos deles são fechados ou secretos por questões de segurança (e este também é um dos motivos pelo qual alguns pediram a não divulgação de seus nomes nesta matéria) e para que seja possível filtrar as pessoas que têm realmente a ver com a proposta. Um dos maiores grupos femininos em atividade possui cerca de 20 mil participantes, entre 15 e 30 anos, que estão lá para discutir uma variedade imensa de assuntos, que inclui sexo, relacionamentos, saúde da mulher, etc. Apesar dele não levantar a bandeira do feminismo logo em sua descrição, esse foi um caminho espontâneo. “É absolutamente natural que isso aconteça, já que o grupo foi criado para falar sobre sexo e tabus entre mulheres. É também bastante óbvio, quando se vê as moderadoras e as participantes mais atuantes. Além disso, o contexto é importante: o feminismo é, ainda bem, um assunto cada vez mais discutido”, explica a jornalista Amanda Previdelli, umas das moderadoras.

Lá dentro, é possível postar pelo seu próprio perfil ou pedir para que uma das moderadoras jogue a sua pergunta, ou relato, anonimamente. No começo, você pode se sentir um pouco intimidada, principalmente ao perceber que há muitas discussões que já estão rolando sem que você seja, necessariamente, familiarizada com o assunto. É a tal da continuidade que falei acima. Isso, entretanto, é um processo importante. O momento em que você não participa, mas se dedica a ler o que já está acontecendo lá dentro é muito rico e essencial para uma boa convivência.

Assim como uma família, cada grupo acaba criando a sua própria dinâmica. Luíse Bello, publicitária e uma das moderadoras de um grupo declaradamente feminista, destaca que a harmonia é uma das características mais valiosas. “Colocar integrantes novos costuma trazer desequilíbrio entre aquelas que não sabem muita coisa e outras já avançadas. Isso causa brigas muito sérias e a experiência prova que dar um tempo na inserção de novos participantes faz o equilíbrio reaparecer. Pessoas novas são importantes, dão diversidade às opiniões, mas isso faz com que fique mais difícil se conhecer. A intimidade do grupo também é importante. A familiaridade aumenta o respeito e faz com que as pessoas tenham mais vontade de falar.”, pondera. Essa é uma das lições mais valiosas. Antes de falar algo que você sinta que pode ser ofensivo para alguém, pesquise o que já foi dito por lá!

O que aprendemos?

Você abre um tópico sobre, por exemplo, um gif divertido e, de repente, ele vira um grande debate sobre algo que você nunca imaginaria. É essa a mágica dos grupos no Facebook. Enquanto você precisaria fazer um curso focado no seu assunto preferido, ou encontrar tempo para reunir pessoas dispostas a conversar em um local físico, nestes espaços online a resposta é imediata e bem mais diversa do que a que encontramos em nossos perfis pessoais. Foi dentro de um deles que eu descobri o que é a apropriação cultural e, depois de ler muitas opiniões diferentes, me senti motivada a navegar por outros sites, buscar blogs e, até, começar conversas com mulheres descendentes de culturas diferentes da minha fora da internet.

Mayara Liz, criadora do grupo “desconstrução das mina”, dá um exemplo próprio de mudança de opinião. A estudante de 19 anos faz parte de 23 grupos. “Eu confesso que via muitas mulheres como rivais. O feminismo me ensinou que elas não são rivais e que isso é uma ideia que a sociedade coloca na nossa mente. Não é só porque uma mulher está olhando para a minha roupa que está com inveja ou falando mal de mim”.

A internet em si é um espaço para enriquecer debates – nunca foi tão fácil chamar alguém por inbox, por exemplo, e trocar ideias. Os grupos, por sua vez, são braços deste movimento, que passaram a incentivar ainda mais essa interação. Sua popularidade revelou que há muita gente ávida por mudanças, principalmente quando espaços de discussão de filmes, séries e esportes acabam levantando questões sobre racismo, homofobia e machismo que estão tão internalizadas a ponto de passarem despercebidas por anos.

Você provavelmente não vai conseguir digitar na busca o nome de um grupo e encontrá-lo facilmente. É preciso conhecer alguém que já está lá e pedir para que a pessoa te indique. As moderadoras checam cada uma das interessadas para se certificar de que não estão aceitando fakes ou pessoas que fogem da proposta. Há opções com milhares de participantes e outras menores, e você sempre poderá abrir um espaço com suas amigas que, através de convites, pode ir crescendo de acordo com a intenção do grupo. O fato é que grandes campanhas feministas, como a #primeiroassedio e a chuva de comentários contra assédio na página do bar Quitandinha, por exemplo, ganharam ainda mais força depois de serem debatidas dentros desses ambientes. Seja como fonte de informação ou espaço para se sentir acolhida, vale a pena dar uma chance e pedir para aquela sua amiga que está sempre falando sobre como a internet a ajudou a crescer te inserir em um deles.

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