Divisão social, racial e de gênero confinou negra no mercado informal

Djamila Ribeiro é mestre em filosofia política pela Unifesp e coordenadora da coleção de livros Feminismos Plurais. (Foto- Marcos Alves)

Não há análise e política pública que possam avançar sem a compreensão das raízes da opressão

Por Djamila Ribeiro, da Folha de S.Paulo

Djamila Ribeiro é autora do best-seller ‘Quem tem medo do feminismo negro’ Foto- Marcos Alves : Agência O Globo

Entender as raízes coloniais do Brasil é compreender fatos históricos que contribuíram na estruturação de desigualdades. Para citar alguns, a lei de Terras de 1850 foi um divisor importante, pois a partir daquele momento a aquisição de terras somente poderia ser feita mediante compra com Estado e não mais por ocupação, o que criou uma elite fundiária.

Mulheres negras, no pós-abolição, sem acesso a oportunidades e políticas do Estado, saíram da condição de escravizadas para o trabalho doméstico. Essa relação direta entre a escravidão —considerada um crime contra a humanidade, segundo tratado assinado pelo Brasil na Conferência de Durban de 2001— e os tempos atuais é patente.

Essa divisão social, racial e de gênero do trabalho confinou a mulher negra no mercado informal, sobretudo no serviço doméstico, contribuindo para o que se conhece como “feminização da pobreza”. Apontamento recente do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) calcula que no país há 6,2 milhões de empregadas domésticas, a maioria mulheres negras, uma profissão historicamente tratada à margem.

Segundo pesquisa do Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio) e dados colhidos pelo Instituto Ethos, mulheres negras ostentam os maiores dados de exclusão e precarização. Ganham menos da metade da renda do homem branco e, entre suas ocupações, um quinto está em serviço doméstico, mais precisamente 19,1%. Na segunda colocação, serviço de limpeza.

Nos cargos de executivo das “500 Empresas mais admiradas”, 0,4% é composto por mulheres negras. Os dados piores de mulheres negras na economia são seguidos pelos dados de homens negros, mulheres brancas e homens brancos no topo.

Sendo as mais precarizadas, mulheres negras sofrem o maior impacto com os impostos, os quais carregados no consumo oneram desproporcionalmente grupos da base da pirâmide.

Na reforma da Previdência, verdadeiro desastre, as mulheres negras serão mais afetadas, por conta da própria informalidade, de uma relação descontínua no mercado de trabalho e os próprios lugares do que significa experienciar diversos vetores de opressão.

Quem são as mulheres responsáveis, muitas vezes unicamente, pela criação de filhos, por lutar por creche, ir trabalhar, atravessar a cidade de transporte público? Quantas são as mulheres negras que não tem qualquer condição de contribuir com o INSS. O que a reforma da Previdência fará com elas?

Sem contar a reforma trabalhista flexibilizou os direitos trabalhistas, liberou a terceirização e afastou as pessoas de buscarem suas reparações na Justiça do Trabalho. Quais são os grupos sociais mais enfraquecidos com essas medidas?

São perguntas que mostram a inviabilidade de qualquer análise ou política econômica de êxito sem antes entender as opressões postas no país.

 

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