Dois femicídios seguidos deixam lições para as mulheres

Foto: João Godinho

Vinte e oito de janeiro de 2012: Karina Angélica Mayer de Almeida, 32, proprietária de uma grife de moda, foi estrangulada em seu apartamento com um fio de ferro de passar roupa. Suspeito do crime: o noivo (ou ex-noivo?), Bruno Henrique Araújo, 27, montador industrial. Em 4 de fevereiro, o corpo do suposto assassino foi encontrado boiando no rio das Velhas, em Raposos (MG). A polícia suspeitava de que a ruptura do noivado foi a causa da ira assassina e aventa que ele cometeu suicídio.

Por: Fátima Oliveira

 

Dois de fevereiro de 2012: Ana Alice Moreira Melo, 35, procuradora federal, foi morta com cerca de 20 facadas, em sua casa. Suspeito do crime: o ex-marido, Djalma Brugnara Veloso, do ramo de locação de veículos, com quem era casada desde 2001 e teve dois filhos, de 7 e 2 anos.

 

Separados há duas semanas, período no qual ela solicitou às autoridades proteção de vida duas vezes, em 3 de fevereiro o suposto assassino foi encontrado sem vida no motel Capri, em Belo Horizonte, com cerca de 28 facadas. A tese é de autoextermínio. As causas da separação são segredos enterrados. E as conjecturas serão sempre hipóteses sem serventia.

 

A rigor, o que levou dois homens a matar mulheres a que, teoricamente, amavam, pois “quem ama não mata”, é desconhecido. Aparentemente não programaram matar naquele momento – usaram instrumentos caseiros. É incomum femicídio seguido de suicídio, logo dois casos na mesma cidade e semana chamam a atenção pelas evidências de sentimento de propriedade privada para com as mulheres. Relembrei vovó Maria, que, a cada novo pretendente, indagava, matreira: “E como ele é com a mãe? Não se meta com homem que não respeita a mãe! Se não respeita a mãe, qual outra mulher vai respeitar?”.

Recorri à amiga Regina Lunardi, que lê tudo sobre mulheres assassinadas. “Tá vendo, Fafá, já disse pra essas meninas daqui de casa (tem quatro filhas): ‘Separou, a primeira providência é trocar as chaves da casa’; a segunda é ‘não aceitar conversar com o sujeito em casa, só em lugar público’. Temos de ensinar pras mulheres: nunca deixar de denunciar, mas têm de andar sempre com endereço de chaveiro 24 horas e guardar um dinheirinho para trocar fechaduras, pois a gente nunca sabe quando vai precisar! Ah, e acreditar que quem diz que mata, um dia faz!”. Ela é incansável em repassar um sábio ensinamento, aprendido com sua mãe, de “‘levar sempre a briga pra cozinha’; vá saindo de mansinho, seja de costas, como quem não quer nada, até a cozinha, pois a cozinheira-testemunha pode até salvar a sua vida, se necessário”.

A Lei Maria da Penha é uma conquista valiosa, mas está na praça tempo suficiente para quem de direito, no caso a Secretaria de Políticas para as Mulheres, proceda a alguns ajustes. O primeiro é blindá-la contra interpretações segundo a moral de quem a opera – o que explica um juiz conceder proteção de vida aos pedaços, obrigando à vítima a refazer a petição para acessar as medidas protetivas de modo integral, a não ser juízo de valor de uma lei?

Em segundo, incluir atenção e medidas que cerceiem a alta periculosidade, cientificamente comprovada, de personalidades bandidas e criminosas, decorrente da falta de limites morais, o que lhes confere exacerbação do potencial ofensivo de violência. Nem todo homem que bate em mulher e a ameaça de morte é sociopata, mas os insanos morais são muito mais perigosos.

Se a vítima denuncia e, assim mesmo, perde a vida, cabe à sua família acionar o Estado por omissão na proteção da vida das mulheres

 

 

 

Fonte: Tá lubrinando – escritos da Chapada do Arapari

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