Efeito colateral

FONTEBrasil de Fato, por Eloá Kátia Coelho
“A Vida e a Morte” (1916), Gustav Klimt - Reprodução

Tira o pé do meu pescoço… Eu não consigo respirar

Lastro da realidade
Onde está?
Não é pontual!
É constante…
E se eu fechasse os olhos agora?
Tira o pé do meu pescoço…
Eu não consigo respirar.
Estou sem ar…
Você já me matou ontem
Imploro a minha vida hoje
Tire o seu peso do meu pescoço
Eu não consigo respirar.
Dor
Morte
Sofrimento
Minha alma
Desalma
Efeito colateral
Num processo seletivo
Da morte a espreitar
Ao enterro seletivo
Milhares de vidas ceifar
As palavras me faltam
As letras também
Saravá
Axé
Amém
Mesmo que ore
Mesmo que chore
Mesmo que implore
Mesmo que…
Cadê você?
O efeito colateral
Disseminou descomunal
Ansiedade generalizada
Pânico
Agorofobia
TOC
Calafrio
Falta de ar
Sudorese
Fome
Abandono
MORTE MATADA
Efeito colateral
Onde está polícia quando eu precisei?
Onde está polícia quando vou precisar?
Truculência policial
Polícia para quem precisa?
O PM no pescoço pisa de novo…
Pisa e desmaio 4 vezes antes de morrer.
Quebrou a mandíbula.
Foi atirada ao lado da calçada.
Eu sou a Maria
Aquela que foi arrastada pelo carro na rua, lembra?
O corpo nada vale?
O médico não deu anestesia?
Em 5 minutos o médico faz a consulta?
Quando acordo…
Choro rios de lágrimas.
Dor no peito…
Cadê a justiça PM?
A delegada sumiu?
Mora quem morrer!
E daí?
Prendam ou matam todxs os negrxs e todxs os indígenas…
Os racistas e os capitães de mato estão lá em seus castelos.
Dando ordens ao reles mortais…
A você também ignóbil
Rebanho, manada…
Assaltaram o Brasil
Ninguém sabe.
Ninguém viu.
Elles riem e nas lives
No sul dão carteiradas, como que em chibatadas
De sobrenomes europeus
Que dizem saber a origem
(duvido)
Todos os nomes são inventados…
Está frio…
Tudo parece morte
A manhã parece morte
A tarde parece morte
A noite parece morte
São muitas mortes registradas da covid-19
E têm as mortes matadas
Da polícia armada
E preparada pra matar
E não pra proteger
Nem ela e nem eu…
Frio
Frio de cemitério
Frio de solidão
Frio de fome
Frio de abandono
Frio de desemprego
Frio de R$ 600,00
Na fila da humilhação
Da “agromeração”
Da contaminação
Quero leite e quero pão
E na cesta básica de doação
Tem a lona pra proteger
A chuva e o vento até amanhecer…
Tem livro pra ler
E acreditar na esperança
Tem camisinha
Pra proteger e amar!
Efeito colateral
Desigualdade Descomunal
Levantaram o tapete
Da ponte pra lá é outro rolê
Cadê
Cadê você?
Faz muito tempo que não tem carne no prato
E tudo aumentou até o ovo…
Nunca mais eu vou sair de casa…
O mundo desabou e caiu em minha cabeça.
Se a morte fosse bonita ela iria matar tanta gente?
A morte ronda as noites frias do inverno em Porto Alegre/RS.
2° Graus Celsius
Dias gélidos
Coração
Emoção
Medo
Angústia
Pânico
Tudo
Em compasso de espera
Sobressaltos
Saltimbancos
Trapalhões
Põe máscara
Tira máscara
Põe máscara
Tira máscara
A morte naturalizada
Escancarada
A elite do atraso
Fez escárnio
Do estágio
E do vírus
Na pandemia
Com esse pandemônio e seus seguidores
Tudo mata
O racismo
O feminicídio
O classismo
A LGBT fobia
A fome
O abandono
Mora quem morrer
E daí?
Riem e fazem festas
Zombam da vigilância sanitária…
“Agromerados”
Falam 2 ou 3 idiomas
E tem sangue francês…
Chico Buarque os jovens do Leblon, não são inocentes…
São prepotentes!
Eu tenho chorado de lágrimas em rios
Fui embora novamente ontem;
Agora pra bem longe de mim mesma…
Não quero mais me encontrar…
Cadê
Cadê você?
Aceleraram a morte
Mora quem morrer
E daí
A morte ronda as noites frias do inverno em Porto Alegre/RS…
Bandeira vermelha…
Perigo
Não ultrapasse
Fica em casa!
Aceleraram a morte
Naturalizaram
Sem despedida
Sem pão
Sem arroz
Sem feijão
Com lona
Assim aquece o pé e a mão
Mesmo dentro do caixão
Aja coração
Aja razão
Aja emoção
Eu não sei onde está
O horizonte…
Eu não sei…

Edição: Katia Marko

-+=
Sair da versão mobile