Cleissa Regina Martins participou do Laboratório de Narrativas Negras para o Audiovisual, parceria entre a emissora e a Flup, e convidou Milton Gonçalves para viver o personagem
Por Amanda Pinheiro, do O Globo
O que fazer ao receber um cartão de visitas do ator Milton Gonçalves? Imaginá-lo como Papai Noel e convidá-lo para fazer parte do seu especial de Natal. Foi o que fez Cleissa Regina Martins, de 24 anos, que faz sua estreia como autora no especial de Natal da TV Globo ‘Juntos a Magia Acontece’, que irá ao ar nesta quarta (25) depois da novela “Amor de Mãe”.
Após participar do Laboratório de Narrativas Negras para o Audiovisual, em 2017, uma parceria da TV Globo com a Festa Literária das Periferias (Flup), Cleissa pode tirar do papel suas ideias e retratar na TV uma família negra. Cleissa espera que o especial tenha um impacto positivo na vida das pessoas:
— A gente precisa normalizar as famílias negras, que são o verdadeiro retrato do Brasil. Espero que o especial seja uma abertura para isso, e que o público entenda que uma família negra também pode emocionar; e que o Papai Noel negro e a criança negra causem um impacto positivo nas pessoas. Acredito que mostrar isso na TV, com o alcance que ela tem, é uma outra experiência. Então, espero que o público goste e que eu atenda a toda essa expectativa boa que foi criada mesmo antes de o especial ir ao ar — afirma.
Nascida em Magalhães Bastos, na Zona Oeste do Rio, Cleissa foi aluna do ensino público. Formada em Ciências Sociais, por meio de bolsas de pesquisa fez intercâmbios nos Estados Unidos e no Canadá. Para ela, o Laboratório de Narrativas Negras foi uma oportunidade de fazer as conexões necessárias para colocar seus projetos em prática.
— Eu pesquisava sobre as desigualdades de gênero e de raça no audiovisual brasileiro. Mais do que fazer pesquisa, eu queria muito produzir e vi que era possível. Sou formada em Ciências Sociais, mas eu achava que mudaria o mundo fazendo pesquisa. Mas, nesse universo, muitas vezes, a gente tem conhecimento porém não se comunica com outras pessoas — explica Cleissa, que decidiu juntar sua formação com o cinema. — Assim eu entendi que, mais do que fazer pesquisa, é necessário produzir. O Laboratório foi crucial para isso. Conheci pessoas maravilhosas, entre elas o Milton Gonçalves, que me deu o cartão dele e disse que eu poderia escrever algo e convidá-lo. Pensei nele como Papai Noel e, durante a Flup do ano seguinte, nasceu a história — conta Cleissa.
Uma das poucas negras na equipe de produção do especial, Cleissa também integra o grupo de colaboradores de “Malhação”. A autora ainda trabalha em uma websérie, com dez episódios, que retrata os negros na moda. Toda a equipe deste projeto é formada por jovens negros. Cleissa faz ressalvas sobre a necessidade de mais pessoas como ela nesses espaços.
— O tempo todo eu vejo diversos lados do que está acontecendo. Precisamos estar nesses espaços e cobrar representatividade. Mas, ao mesmo tempo, é muita responsabilidade. Talvez eu não consiga representar todas as pessoas negras porque considero minha trajetória diferente e muitos não têm as oportunidades que eu tive — reflete a autora, para quem a presença de pessoas negras nos bastidores é necessária. —Tivemos ajuda da consultora Kênia Maria, a equipe de maquiagem, os atores… Tudo isso contribuiu para que o produto final ficasse incrível. Precisamos valorizar essas pessoas que estão por trás das câmeras — reitera.