“Estamos vivendo a estatização dos homicídios no Rio”, diz Pedro Abramovay

RJ - VIOLÊNCIA/RIO/OPERAÇÃO - GERAL - Movimentação policial no Morro da Mineira, no Rio, na manhã desta sexta- feira, 27. As forças de segurança do Rio de Janeiro realizam duas operações nesta sexta-feira, 27, em comunidades do centro e da zona norte da capital fluminense. A maior delas, em busca de traficantes envolvidos na invasão da Rocinha, começou por volta das 3h30 nos morros do São Carlos, Zinco, Querosene e Mineira, na área central. 27/10/2017 - Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO CONTEÚDO

O governador Witzel deu um duplo twist carpado argumentativo ao dizer que são os defensores de direitos humanos os responsáveis pelas mortes de inocentes causadas pelas polícias. 

Por Pedro Abramovay, do Justificando 

Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO CONTEÚDO

Ele disse que, como quem defende direitos humanos não quer a polícia atire em quem tem fuzil, a polícia acaba matando inocentes.

O argumento evidentemente é desses delírios para confundir o debate público. Mas há algo de revelador, além da má-fé de quem comanda a desastrosa política de segurança do Rio. 

A Polícia está mesmo assumindo um protagonismo nos assassinatos no Estado. Estamos vivendo um fenômeno que pode ser chamado de estatização dos homicídios. Apesar do governo divulgar que houve uma redução nos homicídios em 25%, o número de pessoas assassinadas segue praticamente igual no Estado. É que na verdade houve uma redução no número de homicídios cometidos por não policiais que foi compensado pelo número de mortes pela polícia.

Em resumo, o Estado passou a matar mais e retirou essas mortes da conta. Para se ter uma ideia, só na cidade do Rio a polícia foi responsável por 38% dos assassinatos.

Só quem não entende de segurança pública e nem de Rio de Janeiro, poderia afirmar que isso é algo positivo. Que isso representa que antes eram os cidadãos que morriam e agora são os bandidos. 


Claro que uma parte dos mortos são pessoas envolvidas com o crime organizado. Tanto por parte dos mortos pelos policiais quanto dos mortos pelo próprio crime organizado. No final das contas, a
 gestão dos homicídios é alvo de disputa política entre os que querem atuar fora da lei, sejam eles policiais ou não. Os homicídios regulam o comércio e as relações ilegais. Quando a banda podre da polícia quer roubar mais, extorquir mais, ela mata mais, fica com mais poder sobre os territórios. A carta branca que o governador dá à polícia para matar, sem qualquer controle, apenas reforça essa mesma banda podre da polícia que estatiza os homicídios para fortalecer seus negócios. 

E isso é feito também aumentando o número de mortes de pessoas sem qualquer relação com o crime (porque o governador também justifica até essas mortes) e espalhando o terror nas comunidades, aumentando os dias de escola fechadas, prejudicando os trabalhadores.

O maior prejuízo que o filme Tropa de Elite causou ao Brasil foi criar no nosso imaginário a ideia de que há duas policias: a corrupta e a violenta. A primeira é vilã, a segunda heroína. Isso é mentira. A polícia corrupta é a que mais mata. A mais violenta. Porque ela precisa da violência para poder ser corrupta. 

Quando o Tropa de Elite 2 chegou. Mostrando a relação do poder político com essa corrupção e violência policial, já era tarde de mais. Witzel, o governandor, aponta seu dedo aos defensores de direitos humanos. Diz que a polícia mata inocentes porque a impedem de atirar em quem tem fuzis. Ao falar esse absurdo no fundo ele confessa que é consciente e ativo o processo de estatização dos homicídios do Rio. E isso só interessa a quem ganha com o fortalecimento da banda podre da polícia.

 

Pedro Abramovay é mestre em direito constitucional pela UnB. Foi Secretário de Assuntos Legislativos e Secretário Nacional de Justiça. Hoje é Diretor para a América Latina da Open Society Foundations.

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