Feminismo me ensinou que, como mãe, não preciso me desculpar

Chimamanda Ngozi Adichie: Em Como Educar Crianças Feministas, a escritora lança um olhar terno às necessidades das mães (Foto: (Photo by Jack Taylor/Getty Images))

Em sua nova coluna, Isis Vergílio fala sobre a experiência de ler “Para Educar Crianças Feministas – Um Manifesto”, de Chimamanda Ngozi Adiche, no qual a nigeriana escreve sobre feminismo e maternidade

Por Isis Vergílio, no Marie Claire

 

Chimamanda Ngozi Adichie: Em Como Educar Crianças Feministas, a escritora lança um olhar terno às necessidades das mães (Foto: Jack Taylor/Getty Images)

 

Um dia desses, resolvi ler Para Educar Crianças Feministas – Um Manifesto, de Chimamanda Ngozi Adiche, livro escrito a partir de uma carta que a autora fez a pedido de uma grande amiga de infância sobre como educar sua filha como feminista _e adaptado, posteriormente, em reflexões divididas em 15 partes. Não acho elegante dar “spoiler”, mas peço licença para comentar sobre a experiência que vivi durante a leitura. Assumo que chorei, me emocionei e espero que, quem ainda não tenha feito essa leitura, o faça.

Quando li o livro pensei sobre como é maravilhoso o amor de Chimamanda pela amiga, ao escrever uma carta de maneira tão generosa, dando sugestões sobre um processo tão complexo que é a educação de uma criança. Pensei imediatamente na minha rede de afetos, sendo muito honesta, seria impossível pra mim, que moro somente com a minha filha, se essa rede não estivesse conectada a nós, a mim e a ela. Quantas vezes você, mãe, não se percebe tendo que fazer malabarismo para conseguir “dar conta de tudo” o que é extremamente desumano e impossível. Ninguém é capaz de dar conta de tudo, se nós, mulheres, sobretudo as negras, seguimos tentando fazer isso é porque o Estado nega direitos, e a sociedade, por conta das estruturas e imposições de gênero, nos tensiona ao sentimento de culpa quando não conseguimos entregar o que se espera de nós. No livro, Chimamanda fala da urgência em estabelecer diálogos honestos sobre outras possibilidades de se construir uma educação antiracista, antimachista, “na tentativa de preparar um mundo mais justo para homens e mulheres”.

Logo que comecei a ler a obra, em especial na primeira sugestão, me deparei com as seguintes frases: “Seja boa com você mesma. Peça ajuda. Espere ajuda”;
“Permita-se falhar. Não ache que precisa saber de tudo”; “Tire um tempo para si mesma. Atenda às suas necessidades pessoais”; “Nunca se desculpe por trabalhar. Você gosta do que faz e gostar do que faz é um grande presente que você dá a sua filha”. Fui lendo e falando comigo mesma. É ISSO! É ISSO!

Me lembrei de bell hooks em Vivendo de Amor no trecho em que ela diz: “Para conhecermos o amor, primeiro, precisamos aprender a responder às nossas necessidades emocionais. Isso pode significar um novo aprendizado, pois fomos condicionadas a achar que essas necessidades não eram importantes”. As mais velhas vêm falando há tempos da necessidade de olharmos para nós. O Oriki diz: “Oxum limpa suas joias de cobre antes de limpar seus filhos”. Sempre que meu pai de santo, Rodney William, me diz essa frase, me faz pensar de que só é possível estar bem em coletivo se estivermos bem com nós mesmas.

Não saber de tudo é ótimo, dizer “não” é maravilhoso. Esse medo de desagradar, do julgamento social, faz com que nós passemos uma vida dizendo: “Sim, obrigado”. Repito, colegas, isso é desumanizante, e desumanizar alguém ou um grupo é extremamente violento. Quando Chimamanda, na introdução do livro, diz: “A gente pode inverter X e ter os mesmos resultados?”, imediatamente me vem à resposta à cabeça, e ela seria NÃO.

Caras leitoras, escrevo essa coluna pra dizer que, cada vez mais, tenho tentado me livrar do peso da culpa, o que é um exercício contínuo. Fomos condicionadas a reproduzir comportamentos sistêmicos por conta das estruturas que fundamentam a sociedade racista e machista, no entanto, é necessário que sejamos generosas com nós mesmas e nossos processos. Não há fórmula mágica: se apegue a sua rede de afetos para se fortalecer, leia mulheres negras e, como diz, Chimamanda: “Tire um tempo para si mesma. Atenda suas necessidades pessoais”.

Fecho com um trecho do texto Vivendo de Amor, de bell hooks, que diz: “O amor precisa estar presente na vida de todas as mulheres negras, em todas as nossas casas. É a falta de amor que tem criado tantas dificuldades em nossas vidas, na garantia de nossa sobrevivência. Quando nos amamos, desejamos viver plenamente. Mas quando as pessoas falam da vida de mulheres negras, raramente se preocupam em garantir mudanças na sociedade que nos permitam viver plenamente”.

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