Filha de somalis, Igiaba Scego lança obra sobre uma africana e seu pai, que serviu ao fascismo

A escritora Igiaba Scego, que vem para a Flip - Divulgação

Adua, protagonista do romance que leva seu nome, conta sua história à estátua de um elefante em uma praça de Roma.

por Maurício Meireles no Folha 

A escritora Igiaba Scego, que vem para a Flip – Divulgação

Ela é uma moça da Somália que imigrou, nos anos 1970, para a Itália —seu sonho era ser uma diva de cinema como Marilyn Monroe, mas as coisas acabam sendo bem piores do que imaginava.

A história de Adua é alternada com a história de seu pai, que serviu aos fascistas italianos na década de 1930. A relação difícil entre os dois será um dos eixos do romance.

Esta é a sinopse da história escrita por Igiaba Scego, autora italiana de pais somalis, que sai neste mês no Brasil pela editora Nós. Ela é uma das convidadas da Flip neste ano.

É um romance que fala do colonialismo e da imigração —passando pelos africanos que ligados à Itália durante o fascismo, depois nos anos 1970 e os que chegam agora à Europa. Há alguma relação entre todos eles?

“Sim, o colonialismo é a ligação. Quando a Europa fecha as portas às imigrantes, ela está fechando os olhos para o que fez na África. E do que faz hoje, porque para mim o colonialismo não acabou. Também quis lembrar que a imigração não é algo novo”, diz Scego em entrevista à Folha por telefone.

Ela conta que também quis escrever o romance para que não só a Itália do césares fosse conhecida, mas também o país na época do regime fascista. Antes do romance, já havia escrito um ensaio sobre os monumentos de Roma que remetem ao período.

“Os personagens são africanos, mas o livro fala da Itália. Quando saiu [em 2015], algumas italianas que haviam migrado do sul para o norte me disseram: ‘Essa também é a nossa história’”, diz.

A autora chega a trazer questões delicadas, como a mutilação genital feminina —praticada ainda na Somália e em outros países. No livro, Adua passa pelo processo, que às vezes constrange europeus por não saberem decidir se devem respeitar supostas diferenças culturais.

“Não é uma diferença cultural, é algo horrível. Em alguns países na África, já existem leis que proíbem. Não passei por isso, porque minha mãe não deixou, mas ela sim. E não se vive bem com a mutilação.”

Scego reclama quando, em seu país, às vezes a definem como escritora imigrante.

“Nasci aqui. Falo e escrevo em italiano. As pessoas dizem isso porque querem entender o que não conseguem. E não há uma literatura de imigrante, literatura é literatura.”

Não será a primeira vez que Scego vem ao Brasil —há oito anos, ela esteve como turista em cidades como o Rio de Janeiro, São Paulo e Curitiba. Scego entende bem o português, que fala razoavelmente.

A autora tem uma relação bem próxima com o país: ouve Chico Buarque, lê Mário de Andrade e Clarice Lispector, entre outros. Chegou a participar de manifestações em Roma após a morte da vereadora Marielle Franco, em março.

Em 2016, a relação virou livro com “Caetano Veloso – Camminando controvento”, ensaio sobre o tropicalista.

“Vou comprar ingressos para o show dele com o filhos em Roma. Como diz o Djavan, é preciso caetanear a vida”, ri.

A obra sairá no país até a Flip em coedição da Buzz e da Nós. A segunda lançará ainda “Minha Casa é Onde Estou”.

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