Geledés e a Comunicação – Memória Institucional

Geledés e Comunicação: No princípio era o Verbo

Retrospectiva

Desde sua criação, em 1988 ao definir a Comunicação como um dos pilares estruturantes da sua ação, o Geledés- Instituto da Mulher Negra já apontava para a necessidade de se trabalhar esse tema como forma de fazer avançar a luta anti-sexista e antirracista.

Um pouco ousado para sua época, o Programa de Comunicação demorou um pouco para encontrar seu eixo. A falta de recursos específicos e da compreensão sobre sua importância levou o programa a ser trabalhado, inicialmente como um programa de suporte aos demais programas da instituição (Saúde e Direitos Humanos), e a se responsabilizar pelas publicações da instituição.Também passa a influenciar a mídia numa postura mais objetiva, entretanto de maneira empírica e sem uma base metodológica.

Isso não significou entretanto, uma acomodação frente ao tema, que se fazia presente em todos os fóruns de comunicação, nacional e internacional, como uma das raras organizações de mulheres negras com intervenção especifica sobre essa questão.

O desafio estava em colocar em ações o conceito de que,a prática da Comunicação para nós agentes de transformação social, deve ser cotidiana e requer para que tenhamos um conteúdo real de ações precedidas por atitudes racionais, apoiadas por instrumentos metodológicos adequados. Que não nos limitássemos simplesmente à intuição e ao uso de alguns princípios elementares.Implica, sobretudo, num processo permanente de aprendizagem  e que o desenvolvimento de políticas e estratégias de comunicação nos movimentos sociais, são instrumentos essenciais para se atuar com eficiência nesse contexto.

Desde então, o Programa de Comunicação do Geledés vem desenvolvendo ações consideradas precursoras no campo das comunicações, seja através de uma qualificada intervenção na mídia, sejam nas capacitações de organizações de mulheres negras e outras organizações do movimento social em comunicação, mídia e advocacy, seja através do diálogo com profissionais da grande imprensa, seja na capacitação para TICs.

Essas ações tem sido consideradas modelos e provocado mudanças substantivas nos paradigmas do pensar e agir comunicacionais na militância afro-descendente e feminista, em níveis nacional e latino-americano, elevando o patamar das discussões, e estimulando outras organizações a  investir nessa área muito pouco reconhecida na sua estratégia não apenas como possibilidade de visibilidade dos trabalhos mas de seu papel de mudança na cultura de uma sociedade.

Tem servido ainda, de modelo para outras instituições do movimento de mulheres no Brasil e América Latina, como por exemplo, a capacitação de sócio-educadoras da Rede Mulher de Educação  da Região Norte e Nordeste, e da Red Afrolatina e Afro Caribenha de Mulheres Negras. Após sua  apresentação no Foro Internacional: Comunicacion e Ciudadania, em San Salvador, 1998, e no Taller Regional de Comunicacion y Liderazgo de Mujeres Negras, também em El Salvador, esse projeto foi considerado modelo e tem dialogado e oferecido subsídios a outras experiências análogas, como  a da  Universidade do Texas (capacita mulheres migrantes) e da Alemanha, através do Projeto Black Butterfly, da ADEFRA.

O Programa de Comunicação vem participando dos diferentes fóruns de debate sobre a Democratização da Informação, em nível local nacional e latino-americano, juntando-se ao CDI, à RITS entre outros, incluindo capacitação junto aos Telecentros no município de São Paulo. É a primeira organização negra/feminista a ser convidada para integrar a APC (Avanço para o Progresso da Comunicação). Participou, ainda, das organizações da sociedade civil da preparação para a Cúpula Mundial da Sociedade da Informação. Nosso papel nesses debates, tem sido o de incluir as questões de gênero e raça nas políticas e documentos oficiais e da sociedade civil, bem como incentivar nosso público sobre  a importância de colocar esse tema na sua agenda.

Temos defendido nesses fóruns, que  exclusão sócio-econômica desencadeia a exclusão digital, ao mesmo tempo que a exclusão digital aprofunda a exclusão sócio-econômica. A inclusão digital deveria ser fruto de uma política pública com destinação orçamentária a fim de que ações promovam a inclusão e equiparação de oportunidades a todos os cidadãos.

As primeiras ações do Programa de Comunicação foram o Seminário Nacional de Mulheres Negras e Comunicação (1988) e o Seminário Nacional Mulher Negra e Advocacy (1999) com apoio financeiro do UNIFEM e WACC.

Pela primeira vez no Brasil, analisou-se o tratamento dado pelas distintas mídias do país às mulheres negras na última década, procurando compreender os variados papéis culturais construídos pelas mídias audiovisuais (TVs destacadamente), pelas mídias impressas que atingem diretamente os (as) agentes formadores (as) de opinião e finalmente pelas mídias eletrônicas e seu poder de  determinar os (as) incluídos (as) e os excluídos do novo sistema de circulação simbólica e de consumo.

Os seminários constituíram-se em espaços privilegiados para a reflexão sobre mulher negra e comunicação, por sua diversidade regional e por sua representatividade institucional. Assim, advindos das mais variadas regiões do país, profissionais da mídia representantes do movimento de mulheres, de universidades, de organizações não governamentais, especialistas em advocacy e estratégias de comunicação estiveram reunidos para tratar do tema.

Há um buraco negro entre a vida e a morteComo primeira experiência resultante dos seminários, realizamos em Salvador/BA- Bahia um curso de capacitação em comunicação, advocacy e novas tecnologias de informação destinado a mulheres negras de diversos movimentos (Associação de Empregadas Domésticas, Comunidades de Terreiro de Candomblé; do movimento de mulheres do Alto das Pombas; dos Blocos Afros (Ilê Ayê e Olodum, Muzenza); do Movimento de Homossexuais; do Movimento Negro e de Organizações específicas de Mulheres Negras, estudantes universitárias.

O curso foi coordenado pelo Geledés em parceria com o CNEGRA – Centro de Comunicação de Mulheres Negras (formado a partir dos seminários de Comunicação) e da Universidade Federal da Bahia e contou com o apoio financeiro da WACC e CESE.

Para o desenvolvimento dessa capacitação, foram criados instrumentais específicos como por exemplo uma cartilha, passo a passo, que desmistifica a Internet e decifra  os  complicados termos das novas tecnologias e desvendam que assombram as mulheres de movimentos comunitários, e as afastam daquilo que chamamos de o direito a ter direito.

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