Homenageada em enredo, Alcione lembra ajuda de outras escolas na criação da Mangueira do Amanhã e início do projeto: ‘Chamado espiritual’

A cantora Alcione terá sua trajetória exaltada pela Estação Primeira de Mangueira, escola do coração, no carnaval deste ano.

FONTEG1, por Lucas Soares, Hélter Duarte, Jornal Nacional
Alcione — Foto: Reprodução/Globo

A Estação Primeira de Mangueira homenageia a cantora Alcione em seu desfile do carnaval deste ano. A trajetória da Marrom que se se mistura, em parte, com a história da escola – a agremiação teve a escola de samba mirim fundada pela cantora.

A artista subiu o Morro da Mangueira, um dos berços do samba e cultura carioca, há 50 anos – quando ainda era uma jovem de 26. Foi ela quem sonhou e fundou a Mangueira do Amanhã – a escola mirim descobre e forma talentos no samba e ajuda crianças na educação escolar.

“Acredito que seja uma coisa espiritual, acredito nos caminhos que a vida leva a gente. Foi um chamado espiritual”

afirma ela sobre a criação.

Marrom conta que não era muito ligada a escolas de samba na época.

“O presidente da época, seu Carlinhos Doria, me disse ‘eu já tenho pouco dinheiro para uma Mangueira, como podemos ficar com duas?’. Eu disse que ia estender a mão e comecei a pedir retalho de pano pra dona Zica, dona Neuma, o que sobrava das baianas. Eu ia no Império e pegava o que sobrava do verde, a Imperatriz também me ajudou, todo mundo um pouco”, conta ela.

A cantora, de voz potente e inconfundível, afirma que nunca se imaginou sendo um enredo de carnaval.

“Sempre estive lá dentro e trabalhei, a minha função era essa. Nunca me imaginei. É com muita honra que sou enredo da minha escola”, diz ela.

“Eu me achei na Mangueira, era aqui que eu queria me divertir, brincar, me dedicar. Eu sou alguém da comunidade, pertenço a ela”

completa Alcione

Pais contra a vinda pro Rio e prisão no início da carreira

Dona Felipa e o pai, o maestro João Carlos, eram contra a filha se mudar de São Luís do Maranhão para o Rio.

“Por eles, eu não viria pra cá ser cantora. Tinha uma vizinha que dizia que eu ia me perder aqui, dizia que tem que dormir com diretor de televisão. Graças a Deus, quando eu vim meu pai sempre confiou em mim”,

Para seguir seu sonho, ela trabalhou como vendedora em uma loja de discos e cantava e tocava seu trompete em “night clubs” de Copacabana. Em uma vez, ela acabou detida pela Polícia Militar, e até hoje ela lembra o diálogo:

  • Policial: Ô neguinha
  • Alcione: Neguinha é seu passado
  • Policial: Você é muito saliente, o que você leva nessa sua sacola?
  • Alcione: Não te interessa
  • Policial: Entra aqui nesse camburão

“Quando eu entrei, já tinha uma menina lá dentro, que disse ‘você é nova na praça’. Ele me levou para a delegacia e disse que era pra me dar uma [passagem policial por] vadiagem”, relembra

Na sede policial, ela se livrou graças a um policial que a reconheceu das noites em que ia a ver tocar trompete. De lá, ela foi direto para o trabalho.

Reverência em vida

Em relação ao desfile da Mangueira, Marrom não fez nenhuma exigência. Pelo contrário, ajudou os carnavalescos contando detalhes íntimos, histórias da carreira e da vida em família.

Um trecho do samba diz: “Meu palácio tem rainha, e não é uma qualquer”. A cantora diz que sempre dizia que não era uma qualquer, e a escola aprendeu isso.

Para toda uma comunidade, Alcione é resistência e inspiração.

“A Alcione representa a força da mulher brasileira, resiliência de toda mulher negra que a gente carrega, e empoderamento. Eu acho que não poderia, em um enredo como esse, não exaltar toda a minha gratidão por ela”, destaca a rainha de bateria Evelyn Bastos.

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