Intelectuais negras criam espaços de pesquisa e acolhimento em São Paulo e no Rio

Casa Escrevivência, de Conceição Evaristo, se junta às iniciativas Casa Sueli Carneiro e Espaço Feminismos Plurais, de Djamila Ribeiro

FONTEFolha de São Paulo, por Darlene Dalto
Sueli Carneiro em evento na Casa Sueli Carneiro (Foto: Natália Carneiro)

Sueli CarneiroConceição Evaristo e Djamila Ribeiro, três das mais importantes intelectuais e escritoras brasileiras, têm algo em comum além da luta antirracista a que dedicam suas vidas há décadas: cada uma idealizou e inaugurou espaços onde compartilham conhecimento e acolhimento em especial às mulheres negras e mulheres brancas aliadas, igualmente antirracistas.

Casa Sueli Carneiro e o Espaço Feminismos Plurais já funcionam em São Paulo. A Casa Escrevivência Conceição Evaristo foi inaugurada semana passada no Beco João Inácio, próximo à praça Mauá, no Rio de Janeiro, local também conhecido como Pequena África. A data escolhida propositalmente, às vésperas do Dia das Mulheres Negras Latino-americanas e Caribenhas, comemorado nesta terça (25) no país. Foram três dias de eventos e festa.

Na última quinta-feira (20), na abertura oficial da Casa Escrevivência, a escritora mineira autografou seus livros, como “Olhos d’Água” e “Ponciá Vicêncio”, do final da tarde até a meia-noite. A casa abriga suas obras, rascunhos, prêmios e boa parte da sua memorabilia e, futuramente, vai hospedar escritoras de fora da cidade.

A Casa Sueli Carneiro foi inaugurada em março de 2021, em plena pandemia, no Butantã, zona oeste de São Paulo, na casa onde Sueli Carneiro morou durante 40 anos e onde recebeu algumas das mais importantes ativistas ligadas ao movimento negro e ao movimento de mulheres negras do Brasil, em reuniões de luta e em almoços de confraternização.

A escritora Conceição Evaristo durante lançamento da Casa Escrevivência, espaço aberto na semana passada no Rio – Fernando Frazão/ABr

Graduada em filosofia e doutora em educação pela USP (Universidade São Paulo), em 1988 ela fundou o Geledés – Instituto da Mulher Negra para fomentar o debate sobre feminismo negro, racismo e sexismo, que continua em atividade até hoje e deu origem ao Portal Geledés.

O novo espaço foi criado para abrigar seu legado intelectual e sua biblioteca e colocá-los à disposição do público interessado. Mas não só. Ao longo do ano há inúmeras atividades. Em junho passado, mês em que ela completou 73 anos, foi realizado o 2º Festival Sueli Carneiro com rodas de conversa, oficinas, exibição de filme e lançamento de livros.

Em parceria com a Fundação Rosa Luxemburgo, a CSC acaba de lançar o livro “Raízes e Asas: Cuidar da Memória Para Fortalecer a Autonomia Negra”, derivado da segunda edição do curso Fazeres de Memórias Negras.

No momento a casa está fechada para reforma. A previsão é que ela reabra ainda neste ano.

A filósofa e colunista da Folha Djamila Ribeiro começou a pensar no Espaço Feminismos Plurais há seis anos, em 2017, quando lançou seu primeiro o livro “Lugar de Fala” —a inauguração foi em maio do ano passado, em Moema, São Paulo.

Sem fins lucrativos, o instituto tem como objetivo a troca de ideias, de conhecimento e o acolhimento.

“O EFP tem uma perspectiva educacional e cultural e é multidisciplinar. Nós temos atendimentos jurídicos, psicológicos, odontológicos gratuitos sobretudo para as mulheres. E promovemos parcerias com a Casa Rosângela Rigo, o primeiro abrigo para mulheres vítimas de violência doméstica no município de São Paulo, com profissionais liberais e com terapeutas holísticas que acompanham, duas vezes por mês, a Jornada do Sentir”, explica Djamila.

Djamila Ribeiro lidera instituto com proposta de educação feminista e antirracista – Rodrigo Trevisan/Divulgação

O espaço possui ainda uma biblioteca aberta ao público, que funciona na sala Toni Morrison, em homenagem à escritora americana, a primeira mulher negra a receber o prêmio Nobel de Literatura, em 1993.

Há dias Djamila levou novos livros para a biblioteca, entre os quais exemplares do português José Saramago que recebeu da viúva dele, Pilar del Río, com quem esteve recentemente em Portugal. Ali também ficam disponíveis computadores e wi-fi gratuito para pesquisas e trabalhos acadêmicos.

Não raro na casa acontecem lançamentos de livros, alguns do selo Feminismos Plurais, coordenado pela própria Djamila.

Recentemente o instituto selecionou 25 mulheres e quatro coletivos que participaram do edital Fundo Johnnie Walker para Mulheres Negras, criado para capacitar empreendedoras e acelerar seus negócios. Elas receberão atendimento durante três meses, mentoria, cursos do Senac e um aporte financeiro.

Espaços como esses têm como objetivo de fundo reescrever a história da população negra no Brasil. Sueli, Conceição e Djamila sabem que seus passos reverberam. Elas representam milhões de outras mulheres como elas —que vieram antes e que ainda virão.


SERVIÇO

Casa Escrevivência
Beco João Inácio, 4, Largo de São Francisco da Prainha, bairro da Saúde, Rio de Janeiro (RJ)

Espaço Feminismos Plurais
Al. dos Tupiniquins, 343, Moema, São Paulo (SP)
https://www.espacofeminismosplurais.org.br/

Casa Sueli Carneiro
https://casasuelicarneiro.org.br/

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