Interseccionalidade Gênero-Raça e Etnia e a Lei Maria da Penha

FONTEpor Raquel da Silva Silveira no Compromisso e Atitude

INTERSECCIONALIDADE GÊNERO/RAÇA E ETNIA E A LEI MARIA DA PENHA: DISCURSOS JURÍDICOS BRASILEIROS E ESPANHÓIS
E A PRODUÇÃO DE SUBJETIVIDADE

A violência de gênero contra as mulheres é um fenômeno mundial que tem sido abordado exaustivamente. A maioria dos estudos aponta que se trata de um problema universal, sem distinção de qualquer marcador social.

O objetivo geral desta pesquisa foi evidenciar a forma como a interseccionalidade gênero, raça e etnia emerge no discurso jurídico sobre as mulheres que acessam a justiça e como esta articulação caracteriza as relações de poder nas quais estão imersas.

O referencial teórico-metodológico foi composto pela análise das práticas discursivas e não discursivas de Michel Foucault; pelo conceito de interseccionalidade; pelo conceito de gênero e pelos marcadores sociais de raça e etnia.

Buscou-se realizar uma comparação entre a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) com a legislação espanhola de Proteção Integral à Violência de Gênero (LO 1/2004), bem como das práticas jurídicas nas cidades de Porto Alegre e Sevilha.

A pesquisa de campo em Porto Alegre foi realizada em três locais: Delegacia da Mulher, Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (JVDFM) e ONG Maria Mulher. A metodologia de trabalho integrou uma ação de extensão universitária de atendimentos interdisciplinares a mulheres que buscaram os dois órgãos públicos citados.

O período de trabalho de campo foi de 14 meses entre agosto de 2010 e outubro de 2012. Foram utilizados recursos da pesquisa quanti-qualitativa, em três amostras de conveniência. No JVDFM foram analisados 70 processos judiciais. Na Delegacia da Mulher foram analisados 55 boletins de ocorrência (BOs). Além disso, foram realizadas entrevistas com 290 mulheres que acessaram a Lei Maria da Penha, tanto através da Delegacia da Mulher quanto do JVDFM.

Também foram realizadas entrevistas com quatro os/as juízes/as do JVDFM de Porto Alegre e dois juízes na cidade de Sevilha, bem como foram pesquisados documentos oficiais sobre o andamento dos processos judiciais e desempenho das atividades dos magistrados/as.

Os resultados apontam que as mulheres negras que procuraram a Delegacia da Mulher e o JVDFM, em comparação com as mulheres brancas, apresentaram menor escolaridade nos níveis fundamental e superior, e, consequentemente, reflexos dessa desvantagem nos rendimentos inferiores e postos de trabalho menos qualificados.

Foi identificada uma diferença de percentuais na representatividade das mulheres negras que acessaram a Lei Maria da Penha, sendo que na amostra com maior número de mulheres, houve uma sobrerrepresentação das mulheres negras, assim como nos boletins de ocorrência investigados.

Assim sendo, na questão do acesso a justiça, em seus níveis iniciais dos trâmites burocráticos, as mulheres negras parecem buscar de forma mais intensa esses recursos.

Nas falas dos/as juízes/as entrevistados/as, a interseccionalidade gênero-raça e etnia não é reconhecida como elemento que interfira no acesso à justiça, tanto em Porto Alegre como em Sevilha.

Prevalece uma concepção do sujeito de direitos universal, em que não só a raça é deixada de lado, como também outros marcadores sociais importantes, como a classe e a idade, também não são abordados.

INTERSECCIONALIDADE GÊNERO/RAÇA E ETNIA E A LEI MARIA DA PENHA: DISCURSOS JURÍDICOS BRASILEIROS E ESPANHÓIS E A PRODUÇÃO DE SUBJETIVIDADE
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