Quando sou questionado sobre o período em que “saí do armário” automaticamente sou levado aos anos que rodearam essa época, e simplesmente mergulho num passado de ingenuidade e vergonhas que me afeta até hoje de formas cruéis, abrindo feridas que eu pensava que já estavam cicatrizadas.
Nasci e morei por boa parte da minha vida no interior, sendo em fazendas ou pequenas vilas que tinha como moradores pessoas ignorantes e preconceituosas – o que não ajuda muito quando se é um adolescente negro de quinze anos que está descobrindo sua homossexualidade – que a todo momento tentam te taxar com rótulos, por exemplo; Se você não é um garoto que trata as mulheres como lixo com certeza é “viado”, ou seja, você é um completa vergonha a sua família, principalmente ao seu pai que tem expectativas de ter um filho “pegador” que vai lhe dar cinco ou seis netos.
Você pode imaginar que a falta de aprovação por parte da sua comunidade ou da família pode ser difícil, e realmente é, mas o que você não pode imaginar é que no interior de da citada comunidade existem aqueles que querem uma “provinha” de você e da sua inocência, e se não estou sendo claro, estou falando de homens assediadores dessas comunidades rurais que tentam de forma sigilosa ter qualquer tipo de envolvimento romântico ou sexual, é totalmente doentio, mas quando se tem entre 13 e 16 anos você não acha isso, porque “você vai gostar” eles dizem antes, mas no final a única coisa que eles falam é “isso fica entre nós”, e você tem que engolir todo o sentimento de vergonha, repulsa e culpa, como o homem que o seu pai te criou para ser. É difícil, na verdade é quase excruciante aguentar tudo, porém, com o passar do tempo você consegue agir como se nada tivesse acontecido, você vai a jantares em sua casa, você brinca com os filhos e até mesmo diz “Boa noite” para a sua esposa pensando “Será que ela sabe o que ele faz?”, mas se ela sabe, com certeza é muito boa em guardar segredos, talvez até mais do que eu, porque às vezes durante a noite eu acabava soltando algumas lágrimas, era a culpa me destruindo, pois no final eu acabei gostando do que foi feito, mesmo que fossem apenas toques ou carícias, foi bom, naquela hora, naquele tempo, não mais hoje.