Leci Brandão: ‘A Cultura salva vidas’

Cantora, compositora e atriz, Leci Brandão, é umas das mais importantes intérpretes de samba e da música popular brasileira

Por Diário do Litoral

Cantora, compositora e atriz, Leci Brandão, é umas das mais importantes intérpretes de samba e da música popular brasileira Foto: Pedro Henrique Fonseca/DL

Ela é do Rio de Janeiro, mas foi adotada por São Paulo. Cantora, compositora e atriz, Leci Brandão, umas das mais importantes intérpretes de samba e da música popular brasileira, concedeu entrevista ao Diário para falar sobre sua candidatura à reeleição como deputada estadual pelo PCdoB. Confira os principais trechos da entrevista:

Diário do Litoral – Mesmo com toda essa carreira, a senhora mostra muita simplicidade. É assim também na Alesp?

Leci Brandão – Eu falo com o coração. A questão de eu ter entrado na política não influenciou em nada no meu jeito de ser. Sou a mesma Leci de sempre, não falo ‘politiquês’ e não finjo intelectualidade. Minha formação é popular. Estou em uma Casa de Leis, mas não possuo formação superior. Então, nosso papo será reto e à ­vontade.

Diário – Como a senhora avalia cada um dos pretendentes ao Governo do Estado?

Leci – Cada um possui uma forma de pensar e de atuar. Na Assembleia, eu nunca tive nenhuma fala que ofendesse nenhum governante ou parlamentar. Eu não ataco, defendo os meus, a minha gente. Quando existe alguma questão contundente, ocupo a tribuna para denunciar e tentar mudar a situação. Como sou artista há 43 anos e estou deputada, já fiz muitas observações sobre a realidade da sociedade brasileira. Eu falo do povo e de suas culturas diferentes. O Doria (João) eu nunca conversei com ele. O Skaf (Paulo) já me homenageou na Fiesp. Uma vez, cantei ‘Canção da América’ em uma homenagem ao José Alencar (ex vice-presidente). No caso do Skaf, se ele vencer, espero que aplique o que fez no Sesi em todo o Estado.

Diário – Mas a senhora está gostando de legislar?

Leci – Sim, mas tenho uma certa frustração por não conseguir resolver uma série de coisas por falta de apoio. A gente tem que conseguir a maioria e, depois, a sanção do governador. Muitas vezes isso não ocorre e você não consegue atender a população, as pessoas que ajudaram a te colocar lá dentro (Alesp). Eu represento um grande segmento da sociedade. Em 180 anos de Alesp, sou a segunda mulher negra a entrar na Casa, que é uma grande honra e de simbolismo imenso. A primeira foi Theodosina Rosário Ribeiro, nos anos 70. Ela ainda vive, graças a Deus, e hoje existe uma medalha com o nome dela para premiar as mulheres. Somos apenas 10 deputadas. São Paulo me adotou artisticamente e ganhei o título de Cidadã Paulistana.

Diário – Como a senhora avalia o fechamento das delegacias de Defesa da Mulher (DDMs) fechadas aos sábados, domingos e feriados?

Leci – Esta questão vem sendo discutida antes de eu entrar na Assembleia. São Paulo não possui uma secretaria da mulher. É muita coisa contra. Imagina, então, a situação da mulher negra. A que está na periferia, na quebrada, no morro, é ofendida, agredida e até morta no final de semana. Então, tem que ter muitas delegacias funcionando todos os dias e 24 horas. Atualmente, as mulheres sofrem muitos constrangimentos até chegar ao atestado de óbito. Eu debato este assunto há muito tempo. Fiquei feliz com a criação da Lei Maria da Penha no Governo Lula, mas ela precisa ser revista, pois as autoridades não estão conseguindo fazer com que ela seja cumprida em toda sua plenitude. Muitos conselhos tutelares também estão desestruturados e não têm condições de assistir as crianças.

Diário – Há quem defenda que o Estado não deve interferir na diferença salarial entre homens e mulheres nas mesmas condições. Qual sua opinião?

Leci – Esse pensamento é retrógrado. A isonomia salarial entre homens e mulheres é discutida há muito tempo e todas as questões, inclusive as de gênero, são importantes. A igualdade é pauta de todos os presidenciáveis.

Diário – A questão das cotas é fundamental?

Leci – Deve ter sim. Sabemos que a questão do vestibular é horrível no Brasil. Só passa quem obteve chances de fazer um cursinho pago, que é caríssimo. Se o ensino público fosse igual e de boa qualidade para todos, não seria necessário cota. Agora, cota deveria também abranger o transporte, moradia, material escolar e alimentação. Enfim, toda a estrutura para que ele não abandone o curso. Muitos abandonam por falta de condições estruturais. Inteligência Deus dá, falta estrutura e oportunidade.

Diário – Como a senhora avalia a falta de efetivo, de estrutura e o baixo salário da polícia de São Paulo?

Leci – A questão da segurança pública tem que ser vista de outra forma. A polícia precisa ser humanizada. As comunidades tem medo da polícia, que primeiro mata e depois pergunta. É preciso construir mais escolas e menos penitenciárias. É preciso escolas em tempo integral, envolvendo esportes e cultura. Mais professores atuando. Educação e Cultura são os dois pilares que sustentam um país forte e desenvolvido. Há exemplos de sucesso no mundo do trabalho integrado entre educação, esportes e cultura.

Diário – A Baixada investe menos de 1% em Cultura. Como a senhora avalia tal índice?

Leci – Venho tentando conscientizar o Governo do Estado a investir pelo menos 2% e não consigo. A cultura salva vidas. As quadras de escolas de samba teriam que ser ocupadas durante todo o ano, com projetos sociais e de geração de renda. A Mangueira fez a Vila Olímpica e as crianças aproveitam muito. Nesses espaços poderiam ser realizados espetáculos de teatro, música, dança, cinema, enfim. O poder público poderia investir nisso. O empresariado também.

Diário – Como a senhora avalia a Lei Rouanet?

Leci – Necessária, mas deveria ser mais simples e beneficiar artistas desconhecidos. Tem muitos artistas consagrados que não precisam dela para viver. Tem muita gente que faz cultura na rua, nas comunidades, enfim, que merecia ter acesso à lei. O empresariado, por intermédio da lei, poderia voltar os olhos para esses artistas.

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