Em um ensaio especial e colorido para a QUEM, Leonardo Vieira abre o coração. Fala sobre a homossexualidade e a lenta aceitação da família. E destaca a dificuldade de viver o preconceito também na carreira de ator. O carioca, criado no Leblon, afirma que as pessoas deveriam se preocupar mais com os rumos da política brasileira do que com quem ele beija na boca e aponta a importância de se falar sobre a diversidade sexual. Aos 48 anos, o ator, que já provou o estrelato na década de 90, vivendo Zé Inocêncio, de Renascer, acha que a TV não está preparada para dar o posto de galã a um gay. Na entrevista a seguir, ele, que namora há cinco anos, afirma que quer adotar um filho.
Por Bete Antunes no Revista Quem
Você divulgou uma carta falando sobre sua homossexualidade, em janeiro, depois de ser fotografado beijando outro homem. Por quê?
Nunca escondi nada de ninguém, sempre levei a vida livremente; saí com um amigo – no dia do meu aniversário, em 28 de dezembro de 2016 – e depois publicaram essa foto. Então, pensei que estava na hora de dar um basta nisso. Tinha de falar a minha verdade. E sabe o que aconteceu? Tirei um peso das minhas costas! Agora vou poder ser eu, viver livre, sem essas amarras. Pode prejudicar minha carreira? Pode. Mas estou em um momento da vida que tenho uma liberdade e uma certa idade, já tenho casa própria… Não me importo, quero ser feliz.
Seus pais (Zezé, de 75 anos, e Américo, de 80) descobriram que você era gay aos 15 anos. Como reagiram?
Foi um grande drama, uma tragédia lá em casa. Minha família é extremamente conservadora, católica, eu estudei em colégio de padre, e era bom aluno, bom filho… Acabei virando a ovelha negra. Mas essa batalha já está vencida. Foi um longo processo, mas eles perceberam que eu poderia ser feliz, independentemente da minha orientação sexual. Eles notaram, convivendo com o filho homossexual, que isso é um detalhe na vida de uma pessoa. Fui construindo o amor e o orgulho que eles têm por mim. E a aceitação também.
Como você percebeu sua sexualidade?
Primeiro, você não sabe o que é e fica pensando: “Por que eu olho para meninos?” Eu me achava estranho, diferente, mas também olhava para meninas e me relacionei com algumas. Você vai se descobrindo. Muitos dizem: “Ah, ele optou”. Seria uma tolice da minha parte optar por ser gay! É tão mais difícil, tem que enfrentar tantas dificuldades, você sofre preconceito, é excluído o tempo todo… Sofro muito mais do que sinto prazer sendo gay.
Você acha que sofreu preconceito como ator?
Era um jovem ator e fiquei muito popular. A mídia me colocou nas alturas e em um lugar que não pedi para estar: o de galã. Depois, ficou falando que eu era gay! Comecei a perceber que os convites de trabalho, as entrevistas e os comerciais diminuíram. Tenho certeza de que perdi papéis por isso. Estou fora do padrão estético? Não. Sou mau ator? Posso não ser o melhor, mas não sou ruim. Qual seria o motivo? Esse universo em que eu vivo, uma fábrica de egos, parece não aceitar um galã que é gay na vida privada.
Existe muito galã que não fala de sua sexualidade. Por quê?
Não acho que alguém deva falar da sua sexualidade se não quiser. Eu só fiz isso, porque fui colocado numa situação em que eu tinha de me posicionar. Ninguém sai por aí com uma faixa na cabeça escrita “eu sou hétero” ou “eu sou gay”. Isso nem deveria importar. Até porque são atores, o que se vê na tela da TV não é a realidade. Por que nós temos que nos “revelar”? Cada um vive o que quer. Cada um também sabe onde o seu calo aperta.
Você foi atacado na internet depois da carta e deu queixa. O que sentiu?
É preciso mais amor e respeito, menos ódio e intolerância. A minha felicidade não pode deixar alguém infeliz. As pessoas estão preocupadas com as coisas erradas. Tem gente desonesta dizimando a saúde do país e estão se importando com a minha sexualidade? É preciso ver o que realmente afeta a vida dessas pessoas.
Você pretende ter filhos?
Eu tenho vontade de adotar uma criança, sou extremamente paternal. Tenho vontade de poder contribuir com um ser humano bacana, que vai ajudar a construir um mundo melhor. Mas é mais fácil um pai solteiro adotar do que um casal gay…
É importante falar sobre diversidade…
É fundamental que se fale sobre isso, que se explore bastante esse assunto. Estávamos vivendo sob véus de ilusão e, agora, a gente está revelando que existem pessoas diferentes, que nem todo mundo é igual e que as pessoas merecem ser felizes, mesmo sendo diferentes. É muito fácil a gente gostar de quem é parecido com a gente, o difícil é gostar de quem é diferente. Não precisa nem gostar, na verdade, mas, pelo menos, respeitar. Esse é o nosso desafio.