Luis Felipe Miguel: não há dois extremos, e sim escalada de violência da direita

Foto: Brasil 247

“Quantos atentados a bala a esquerda desferiu contra seus adversários políticos nos últimos anos?”, questiona o cientista político e professor na UnB; “Muitos não teriam coragem de atirar, mas estão alinhados ao mesmo tipo de pensamento. Garantir o direito da esquerda à existência, expulsar esse discurso para o espaço do não aceitável, é a batalha nº 1 para impedir a instalação total da barbárie”, defende

no Brasil 247

Por Luis Felipe Miguel, em seu Facebook – Fala-se muito em “polarização política”. É um discurso enganoso. Por um lado, permite que quem o adota se coloque em posição superior, olímpica, como quem vê ambos os lados, percebe a limitação de ambos e não está em nenhum deles. Por outro, com o deslizamento natural da noção de “polos” para a noção de “extremos”, que pertencem ao mesmo campo semântico, leva ao discurso da necessidade de superação do “extremismo”, que no Brasil seria representado por Bolsonaro e por… Lula. Em tudo está a ideia de equivalência, de espelhamento, de intolerância de lado a lado.

No entanto, o que se vê é bem diferente. Quantos atentados a bala a esquerda desferiu contra seus adversários políticos nos últimos anos?

Como comparar um acampamento pacífico, em que pessoas protestam contra aquilo que (por bons motivos) julgam que é uma prisão injusta, com uma tentativa de assassiná-las?

O que existe é uma escalada de violência da direita, alimentada por um discurso deliberado de desumanização de seus opositores (“esquerdopatas”, “petralhas”).

Não é algo espontâneo, tampouco uma consequência natural do “calor” do debate político. É o resultado de anos de trabalho de desinformação e mistificação, em que a grande mídia limpava o terreno e um batalhão de organizações astroturf e charlatães plantavam seu ódio (MBL, Olavo etc.).

É grave que um desequilibrado tenha saído de casa para atirar em desconhecidos. Não é ódio ao Lula, que é uma pessoa pública sobre quem ele forma uma opinião a partir de fatos (mesmo que estes estejam deturpados, o que é outra conversa).

É ódio a qualquer pessoa que ouse defender determinadas ideias, pelo simples fato de existir e ser quem é, num registro muito próximo ao racismo ou à homofobia. Isso não nasce do nada. Isso foi produzido. (A charge de João Montanaro captura com perfeição a situação.)

Mas talvez seja mais grave ainda a falta de escândalo, a falta de solidariedade às vítimas, a banalização do ocorrido.

O fato de que as “pessoas de bem” deem de ombros, façam piadas ou mesmo se regozijem entre si com os disparos contra os acampados.

Muitos não teriam coragem de atirar, mas estão alinhados ao mesmo tipo de pensamento. Garantir o direito da esquerda à existência, expulsar esse discurso para o espaço do não aceitável, é a batalha nº 1 para impedir a instalação total da barbárie

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