Luís Gonzaga Pinto da Gama[1] (Salvador, 21 de junho de 1830 – São Paulo, 24 de agosto de 1882) foi um advogado, jornalista e escritor brasileiro.
Biografia
Filho de um fidalgo português (cujo nome jamais se soube), que gostava de pesca, caça, cavalos, jogo de cartas e de festas e que assim esbanjou toda fortuna que herdara em 1836 de uma tia, e de Luísa Maheu (ou C), africana da nação Nagô, nascida na costa da Mina, liberta. Sua mãe trabalhava no comércio como quitandeira, sendo conhecida na cidade de Salvador (Bahia). Conforme texto autobiográfico do próprio Luís, a sua mãe foi detida em várias ocasiões, por se envolver em planos de insurreições de escravos, como a Revolta dos Malês (1835). Em 1837, acusada de participação na Sabinada, a sua mãe foi deportada para o Rio de Janeiro, onde desapareceu. Como nunca se converteu ao cristianismo, Luís só aos oito anos de idade foi batizado. Em 10 de novembro de 1840, o jovem, então com dez anos de idade, foi vendido ilegalmente por seu próprio pai como escravo, afirma-se que devido a uma dívida de jogo.
Luís Gama foi transportado como escravo no patacho Saraiva até à cidade do Rio de Janeiro, ficando com o comerciante Vieira, estabelecido na esquina da Rua da Candelária com a Rua do Sabão. Ainda em 1840 foi vendido para o alferes Antônio Pereira Cardoso num lote de mais de cem escravos, sendo todos trazidos para a então Província de São Paulo pelo Porto de Santos.
De Santos até à cidade de Campinas a viagem foi realizada a pé. Em Campinas ninguém o comprou por ser baiano. Os escravos baianos tinham fama de revoltosos (“negros fujões”). Já que o alferes não conseguiu vendê-lo, foi utilizado na sua fazenda em Lorena, onde aprendeu os ofícios do escravo doméstico – copeiro, sapateiro, lavar, passar e engomar.
Em 1847, quando tinha dezessete anos, o estudante Antônio Rodrigues de Araújo hospedou-se na fazenda do alferes. O jovem tornou-se amigo de Luís Gama e o ensinou a ler e escrever. Gama, conscientizando-se da ilegalidade de sua condição, evadiu-se para a cidade de São Paulo em 1848, inscrevendo-se nas milícias, onde deu baixa em 1854 na patente de cabo graduado, após ser detido por causa de um ato que o próprio Gama classificou como “suposta insubordinação” já que, segundo afirmou, apenas se limitara a responder a um oficial que o insultara. Nessa cidade, por volta de 1850, casou-se, e freqüentou, como ouvinte, o curso de Direito na Faculdade do Largo de São Francisco, que não chegou a completar. Em 1856, retornou à Força Pública, como funcionário da Secretaria da Repartição.
Na década de 1860 tornou-se jornalista de renome, ligado aos círculos do Partido Liberal. Entre 1864 e 1875 colaborou no Diabo Coxo e no Cabrião, de Angelo Agostini, no Ipiranga, Coroaci e em O Polichileno. Fundou, em 1869, o jornal Radical Paulistano, com Rui Barbosa. Participou da criação do Club Radical e, mais tarde, da criação do Partido Republicano Paulista (1873), ao qual se manteve ligado até à sua morte, em 1882. Por volta de 1880, foi líder da Mocidade Abolicionista e Republicana.
Advogado provisionado, passou a ganhar a vida como rábula, a partir de sua demissão do emprego de amanuense por motivos políticos, ligados à veemência da sua atuação jurídica a favor da libertação dos escravos. Com o apoio (inclusive financeiro) da Loja Maçônica abolicionista , Loja Piratininga, à qual pertencia, desde então despenderia a maior parte de suas energias em levar aos tribunais causas cíveis de liberdade.
Sua liderança abolicionista criou, em torno de si, o movimento abolicionista paulista. Gama, sozinho, foi o responsável pela libertação de mais de mil cativos – um feito notável – considerando-se que agia exclusivamente com o uso da lei. A sua morte, vítima de diabetes, comoveu a cidade de São Paulo, e o féretro foi o mais concorrido até então naquela terra. Foi sepultado no dia 25 no Cemitério da Consolação. A cada momento alguém subia numa tribuna improvisada, promovendo um discurso emocionado.
Um de seus amigos foi Antônio Bento, que continuou seu trabalho para a libertação dos escravos na Província de São Paulo.
Literatura
Os poemas de Luís Gama estão vinculados à segunda geração do Romantismo no Brasil. A sua primeira obra veio a público em 1859, com o título Primeiras Trovas Burlescas do Getulino. Nela reuniu poesias satíricas que ricularizavam a aristocracia e os poderosos da época, tendo a primeira edição se esgotado em três anos.
Homenagem
De Luís Gama, disse Raul Pompéia:
“…não sei que grandeza admirava naquele advogado, a receber constantemente em casa um mundo de gente faminta de liberdade, uns escravos humildes, esfarrapados, implorando libertação, como quem pede esmola; outros mostrando as mãos inflamadas e sangrentas das pancadas que lhes dera um bárbaro senhor; outros… inúmeros. E Luís Gama os recebia a todos com a sua aspereza afável e atraente; e a todos satisfazia, praticando as mas angélicas ações, por entre uma saraivada de grossas pilhérias de velho sargento. Toda essa clientela miserável saía satisfeita, levando este uma consolação, aquele uma promessa, outro a liberdade, alguns um conselho fortificante. E Luís Gama fazia tudo: libertava, consolava, dava conselhos, demandava, sacrificava-se, lutava, exauria-se no próprio ardor, como uma candeia iluminando à custa da própria vida as trevas do desespero daquele povo de infelizes, sem auferir uma sobra de lucro…E, por essa filosofia, empenhava-se de corpo e alma, fazia-se matar pelo bom…Pobre, muito pobre, deixava para os outros tudo o que lhe vinha das mãos de algum cliente mais abastado.”
Em sua homenagem, em 1919, a Estrada de Ferro Sorocabana (atual FEPASA) nomeou uma de suas estações, hoje praticamente em ruínas.
Advogado abolicionista
Demonstrando que a escravidão era um sistema injusto e injustificável, Luís Gama formulou alguns pensamentos que ilustram suas ideias:
“O escravo que mata o seu senhor pratica um ato de legítima defesa.”
“Em nós, até a cor é um defeito. Um imperdoável mal de nascença,o estigma de um crime.
“Mas nossos críticos se esquecem que essa cor é a origem da riqueza de milhares de ladrões que nos insultam; que essa cor convencional da escravidão. tão semelhante à da terra, abriga sob sua superfície escura, vulcões, onde arde o fogo sagrado da liberdade.”
Notas
↑ Segundo a ortografia da época em que viveu, seu nome era grafado Luiz Gama.
Bibliografia
GAMA, Luís. Primeiras Trovas Burlescas e Outros Poemas (org. Lígia Ferreira). Sâo Paulo: Martins Fontes, 2000.
SILVA, J. Romão. Luiz Gama e suas Poesias Satíricas. Rio de Janeiro: Ed. Casa do Estudante do Brasil.
Dia do Mulato
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