Mãe Stella: Que maus atos não quebrem vasos

Maria Stella de Azevedo Santos
Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá

Assistimos muitos políticos serem carregados nos comícios, assim como as várias autoridades eleitas neste país foram carregadas nos ombros de seus correligionários no final do pleito eleitoral ocorrido no dia 5 de outubro. Esse gesto, repetido nos comícios e nos resultados dos pleitos, é cheio de simbolismos, os quais precisam e devem ser compreendidos, tanto por quem carrega, como por quem é carregado. Colocar alguém acima das cabeças dos outros é dizer que esta pessoa tem a capacidade e, consequentemente, a responsabilidade sobre tudo que implica na vida social daqueles que confiaram nele, isto é, tem por dever administrar e legislar bem sobre educação, saúde, segurança, lazer e, principalmente, respeitar o cumprimento da liberdade que rege a Carta Magna de um dos países mais democráticos deste planeta – o Brasil.

O catolicismo faz uso do andor, que no candomblé é conhecido como charola (palavra herdada dos portugueses), para colocar o sagrado acima do profano. Um provérbio bastante conhecido diz: “Cuidado com o andor, porque o santo é de barro”. E de barro também foram feitos, originalmente, os políticos a quem foi dado o poder, o direito e o dever de cuidar de seus irmãos. Portanto, se eles devem cuidar de nós, cabe também a nós cuidarmos deles, pois são seres humanos frágeis e fortes como o barro.

O barro é a mistura de água com terra. Uma autoridade precisa se moldar às circunstâncias diversas que a ela são impostas, com a flexibilidade da água e a solidez da terra. É a medida certa entre o sonho da alma com a realidade das ações materiais que faz com que um político seja um bom administrador e um bom legislador, pois recebe e aceita as orientações celestes. Ele é como um vaso, um pote de barro: artefato cuja abertura que possui simboliza a receptividade das orientações divinas.

No candomblé, vários são os objetos sagrados feitos de barro: pote, talha, quartinha, todos eles são utensílios ricos em simbolismos: guarda a água, símbolo de vida, que deve ser sempre renovada, pois os ensinamentos celestes, apesar de eternos, precisam ser sempre readaptados. Os sacerdotes do candomblé devem manter seus vasos cheios, comportamento que é explicado de uma forma clara e bela pelo budismo: Um pote cheio pela metade é emblema do tolo, uma vez que um sacerdote precisa estar pleno de sabedoria e de calma. É o que igualmente se espera de um político: que ele tenha sabedoria e calma para exercer sua missão.
A palavra pote na língua yorubá é odù, palavra que acentuada de maneira diferente significa destino.

O Terreiro de Candomblé que dirijo é sempre visitado por várias pessoas, entre elas os políticos, afinal são nossos irmãos, somos todos filhos de um Deus Supremo. É por isso que em época de eleição, peço aos orixás que dê a vitória àqueles que têm em seus destinos a missão de servir à humanidade através da política, naquele período. Uma missão tão árdua que merece orações constantes dos sacerdotes das diversas religiões e  dos não sacerdotes. Pois deus ouve a todos, indistintamente, basta que tenha “a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo

 

Foto: Mila Cordeiro | Ag. a TARDE

 

Fonte: Mundo Afro 

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