Menino de oito anos é vítima de racismo no litoral de São Paulo: ‘não deveria estar aqui por ser preto’

Agressões vieram de outras crianças em um conjunto habitacional em Praia Grande

FONTEO Globo, por Luísa Marzullo
Imagem: Geledés

Davi, de apenas oito anos, foi vítima de discriminação racial, injúria e ameaça dentro do conjunto habitacional onde mora, em Praia Grande, no litoral de São Paulo, a partir de outras crianças. O caso ocorreu no domingo (13), quando o menino desceu para a área comum do condomínio na tentativa de fazer amizade com moradores da sua faixa etária. Em entrevista ao G1, Priscila Romão, mãe de Davi, contou que ele sempre foi muito comunicativo e que, após o ocorrido, ficou escondido em uma parte sem iluminação do prédio.

– Ele não está bem, não quer comer, não quer brincar e chora o tempo todo. Ele sempre falou tudo certinho, mas ficou totalmente gago – revelou a mãe ao portal.

O caso foi registrado na última sexta-feira (18) na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), na capital paulista.  O GLOBO teve acesso ao boletim de ocorrência. No documento está descrito que dois adolescentes – um de 12 anos e outro de dez- disseram a Davi que ele não poderia estar ali por conta de sua ‘cor de pele preta’. O mais velho teria dito, inclusive, que chegaria ‘às vias de fato’ caso o menino permanecesse na área comum. Uma menina de dez anos também teria ofendido a criança de ‘macaco, negro, horroroso e nojento’.

De acordo com Ricardo Tassilo de Albuquerque, especialista em Antropologia Social e Letramento Racial pela UFRJ, o racismo visa deteriorar um grupo étnico de diversas formas e, neste caso, trata-se de uma questão estrutural.

– Essas crianças aprenderam isso em casa. Com 10, 12, 13 anos, a gente não tem estrutura e nem mesmo maturidade para aprender isso em outro lugar. O preconceito é uma herança da escravidão, uma ensinança hereditária. Nesta faixa etária, absorvemos pela confiança – comenta o antropólogo.

O especialista destaca ainda a frase de Nelson Mandela como essencial para compreender a problemática.

– Mandela foi claro ‘Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar’ – completa Tassilo, que acredita que seja papel do Estado promover ações de conscientização sobre o preconceito racial.

Diante do choque, Davi ainda não consegue expressar em voz alta o trauma que sofreu e desenvolveu uma gagueira nervosa. Segundo Maria Francisco Mauro, mestre em Psiquiatria pelo PROPSAM/IPUB/UFRJ, a falta de mecanismos emocionais do menino cria este mal-estar.

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