Mobilizadas, mulheres negras ampliam presença na política

Iêda Leal (Foto: Valter Campanato/Agência Brasil)

Em meio à triste notícia do expressivo crescimento da bancada da arma, da violência, da intolerância e do machismo no Congresso Nacional, depois de um período de campanha política em que houve mais reverberações de atitudes preconceituosas contra as mulheres e contra as minorias, enfim uma notícia boa desse período, que podemos comemorar. A participação feminina e, em especial, de mulheres negras cresceu, apareceu e nos dá esperança na luta por nossos direitos e por nossa sobrevivência.

Por Iêda Leal de Souza, do Xapuri.info

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres negras, atualmente, são pouco mais de 1% na Câmara dos Deputados. Dos 513 parlamentares da legislação vigente, 52 são mulheres, sendo 7 negras.

As eleições de 2018 representaram um salto na eleição de mulheres no país. O número de senadoras se manteve sem alteração, dos 54 eleitos, 7 são mulheres. No entanto, a presença feminina na Câmara e nas Assembleias de forma geral, aumentou. Na Câmara, o aumento foi de 51% no número de mulheres eleitas em relação a 2014, passaram de 51 para 77 deputadas federais, o que representa 15% da composição dos parlamentares..

Em relação às Assembleias Legislativas, o aumento em relação a 2014 foi de 35%. No total, foram 161deputadas estaduais eleitas.

Em julho deste ano, uma plataforma foi criada para desmistificar alguns mitos em torno das mulheres negras na política. A campanha mulherenegrasdecidem.org, lançada no Dia da Mulher Negra Latina e Caribenha (25/07), tinha como meta estimular e qualificar o debate. Conforme aponta um diagnóstico traçado pela plataforma, apenas 2,51% das despesas de todos os candidatos ao Legislativo, em 2014, estava relacionada a candidaturas de mulheres negras, e as chances de elegibilidade são ainda reduzidas.

O número cada vez maior de mulheres negras ativistas aparecendo na televisão e nos debates favorece o aumento da representatividade feminina e negra na política nacional. Esse contexto contribuiu para aumentar o número de participação de mulheres negras, tanto como votantes, como políticas e eleitas.

A importância da representatividade dessas mulheres no parlamento é enorme. Elas serão a voz da representação negra nesses espaços brancos, machistas e cheios de muito preconceito. Essa reunião em torno de mulheres que nos representam mostra como nós, negras, podemos fazer a diferença aplicando um outro modo de participação, com um olhar afrocentrado e cuidado coletivo.

A comunidade deposita nessas mulheres a esperança de que o mundo pode ser visto de uma outra forma, para que todos nós possamos viver não somente em harmonia, mas respeitando a diversidade de cada um.

“Isso traduz a nossa capacidade de construir lutas no cotidiano. Lutas feministas, antirracistas, populares. Isso mostra que, mesmo com poucos recursos e enfrentando essas campanhas endinheiradas, a gente tem um potencial muito grande. A minha votação ter se multiplicado tanto é uma confirmação disso. Não estamos simplesmente chegando como novidade”, disse Áurea Carolina (PSOL-MG), a mulher com o maior número de votos para deputada federal de Minas Gerais, sobre a importância de sua eleição.

Destacamos os mandatos coletivos de Pernambuco e São Paulo, denominados “Juntas” e “Bancada Ativista”, respectivamente. O Juntas é um grupo de cinco mulheres, que inclui a advogada Robeyoncé Lima, a primeira transexual do Norte e Nordeste a poder usar o nome social na carteira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Já a Bancada Ativista é composta por nove pessoas e se coloca como “uma rede de redes”. O grupo é representado pela jornalista Mônica Seixas e se apresenta como um movimento suprapartidário. Participam da bancada, além da jornalista, uma estudante transvestigênere negra – Erika Hilton -, uma professora da rede pública, uma pedagoga indígena com mestrado pela PUC-SP, um nordestino que milita pela cultura nas periferias, uma ativista ambiental, uma sanitarista e uma artista.

Talíria Petrone (PSOL-RJ), integrante do Movimento Negro Unificado (MNU) já tinha sido a vereadora mais bem votada em Niterói e, agora representa as mulheres na Câmara Federal. Outras participantes do MNU eleitas para deputada estaduais foram Dani Monteiro (PSOL-RJ) e Monica Francisco (PSOL-RJ). Esta última é pastora, militante do movimento de favelas no Rio, da economia Solidária, de Rádio Comunitária. Já Dani Monteiro é militante do direito à cidade, do coletivo RUA Juventude Anticapitalista, e defende um novo jeito de fazer política, que seja construído pelas juventudes, que seja anticapitalista, antirracista, feminista e que lute pelo direito à favela, pelo direito de ocupar as ruas e o direito a ser e viver das pessoas LGBTs. Renata Souza (PSOL-RJ) também eleita deputada estadual é jornalista, criada na Comunidade da Maré, feminista e defensora dos direitos humanos. Essas quatros mulheres batalhadoras integraram a equipe da vereadora Marielle Franco, mostrando que além de presente, Marielle se tornou semente.

A primeira governadora negra da história do Brasil, Benedita da Silva (PT-RJ), já é um nome forte na política, e foi reeleita deputada federal.

A Bahia elegeu sua primeira deputada estadual negra, a pedagoga e ex-secretária municipal de Educação e Cultura e ex-secretária estadual de Políticas para as Mulheres, Olívia Santana (PCdoB-BA).

Em São Paulo foi eleita a primeira mulher transgênera do Brasil. A educadora Érica Malunguinho (PSOL-SP) será deputada estadual. Leci Brandão (PCdoB-SP) foi reeleita deputada estadual. A sambista tem como bandeiras de luta igualdade racial, inclusão social, políticas culturais, sociais e educativas.

Andreia de Jesus (PSOL-MG) foi eleita deputada estadual. Segundo ela, ocupar a política é afirmar o poder popular nas instituições, inserir no seu cotidiano as lutas por direitos, representatividade e memória ancestral de resistência negra. Em Minas Gerais foi eleita também a deputada estadual Leninha (PT-MG).

Outro grande destaque é a advogada Joênia Wapichana (Rede- -RR) que será a primeira mulher indígena da história na Câmara dos Deputados. A advogada, de 43 anos, representa a defesa dos direitos coletivos dos indígenas.

Iêda Leal de Souza
Vice Presidenta do Sintego
Secretária de Combate ao Racismo da CNTE
Conselheira do Conselho Estadual de Educação – CEE/GO
Coordenadora do Centro de Referência Negra Lélia Gonzales
Coordenadora Nacional do Movimento Negro Unifi cado – MNU
Vice Presidenta da CUT – Goiás

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