Modelo albina combate preconceito em semana da moda africana

Enviado por / FontePor Kate Forbes, da BBC

Na confusão de um camarim durante a Africa Fashion Week, realizada na semana passada em Joanesburgo, na África do Sul, uma mulher sentava-se em um canto, quieta.

No entanto, em meio ao vai e vem de modelos e estilistas de várias partes do continente africano, ninguém chamava mais a atenção no recinto do que a silenciosa supermodelo americana Diandra Forrest.

Sem qualquer pigmentação em seus cabelos ou pele, a novaiorquina que cresceu no Bronx, bairro de maioria negra, está acostumada a ser notada.

Cerca de uma em cada 17 mil pessoas no mundo nasce com o distúrbio genético que afeta Diandra, o albinismo. Ele é caracterizado pela ausência total ou parcial de pigmentação na pele, cabelos e olhos, e também pode estar associado a problemas de visão.

Em alguns países africanos, particularmente no leste do continente, albinos correm risco de sequestro e mutilação. Segundo crenças populares, as partes de seus corpos contribuem para tornar certos rituais e poções mágicas mais poderosos.

Diante dessa realidade terrível, Diandra tem consciência de que sua presença na Africa Fashion Week teve um papel mais importante, ao desafiar os conceitos tradicionais de beleza.

“É muito importante para mim estar aqui porque quero mudar a forma como as pessoas veem meninas com albinismo no continente”, disse a modelo à BBC.

“Cresci achando que minha vida era dura, com as crianças rindo de mim o tempo todo. Eu voltava para casa chorando”, ela recordou.

‘Chocada’
“Mas isso não é nada em comparação com o que as pessoas como eu enfrentam por aqui, particularmente nas áreas rurais”.

“Quando descobri que em países como a Tanzânia albinos como eu correm o risco de ter seus membros amputados para o comércio fiquei tão chocada! Pessoas como eu vivem cada dia de suas vidas com medo. É terrível”.

Nas passarelas internacionais, no entanto, Diandra Forrest está lançando uma tendência.
Como outros nomes do mundo da moda, o estilista sul-africano Jacob Kimmie, radicado na Grã-Bretanha, ficou impressionado quando viu Diandra.

“Ela não parece ser desse mundo, tinha de tê-la no meu desfile”, ele disse.

“É verdade que usar modelos albinas é o quente no momento. Mas espero que o impacto de se usar pessoas que têm aparência muito diferente seja inspirar uma mudança a longo prazo”.
A modelo sul-africana Refilwe Modiselle, uma albina que cresceu em Soweto, cidade contígua a Joanesburgo, concorda.

Ela iniciou sua carreira aos 13 anos de idade. Hoje, é garota propaganda da grife sul-africana Legit. E conta que o albinismo costumava ser visto de forma negativa, mas está se tornando parte da norma.
“Realmente sinto que o trabalho que Diandra e eu estamos fazendo é o início de uma mudança verdadeira”.

Feitiçaria

No entanto, na província sul-africana de Kwazulu Natal, cerca de um dia de distância da passarela da Africa Fashion Week, a família de um menino albino desaparecido há mais de um ano teme que ele tenha sido sequestrado por pessoas envolvidas em bruxaria.

Mais recentemente, em Meru, na Tanzânia, o corpo de um albino com idade estimada em torno de 30 anos foi descoberto em junho. Várias partes de seu corpo estavam faltando.

As partes do corpo dos albinos são usadas em poções “medicinais” ou enterradas sob prédios comerciais. Segundo a crença, elas trazem prosperidade.

Seria uma modelo em uma passarela realmente capaz de mudar essa realidade?

Peter Ash, autor de um relatório sobre albinismo encomendado pela ONU em 2012, responde que sim.
“Quanto mais pessoas com albinismo são retratadas de forma positiva, melhor. Realmente ajuda”, ele disse.

“O problema principal que encontramos é uma aceitação tácita da violência contra pessoas com albinismo porque elas são vistas como subumanas, uma representação do demônio, ou como portadoras de uma maldição”.

“Então é crucial que sociedades africanas comecem a ver modelos positivos para que possamos mudar esse tipo de pensamento”.

Preconceito
O relatório da ONU cita estimativas da ONG de apoio a albinos Under the Same Sun, segundo as qual 71 pessoas com albinismo teriam sido mortas e 31 teriam sobrevivido a ataques na Tanzânia entre 2006 e 2012.

Em Burundi, 17 albinos foram mortos. No Quênia, sete. Na Suazilândia, três.

Frequentemente, os casos não são denunciados ou investigados, disse Nomasonto Mazibuko, da Society for Albinism, uma associação de albinos da África do Sul.

Ela acha, no entanto, que a mudança tem de partir do próprio continente.

“O ponto crucial é que as pessoas não veem albinos como seres humanos. Cabe a nós na África falar sobre isso e trabalhar para combater o preconceito”.

A voz de Mazibuko vai subindo de volume enquanto ela fala: “Não podemos ficar quietos, não podemos continuar escondidos”.

“E qualquer garota com albinismo que está andando nas passarelas internacionais ou nas ruas com a cabeça erguida é um exemplo muito necessário”.

A modelo Modiselle espera poder ser um desses agentes catalizadores, inspirando a sociedade sul-africana e o continente como um todo.

“Sou o símbolo de unidade racial. Sou uma garota negra que vive na pele de uma pessoa branca”, ela disse à BBC.

“Eu gostaria de ser conhecida por ser uma modelo, e por todas as minhas outras realizações, não por ser albina”.

 

 

 

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