Monitor da Violência: 2 anos depois, 73% dos inquéritos de homicídios ainda estão em andamento no RJ

As vítimas da violência em apenas uma semana no Brasil — Foto: Editoria de Arte / G1

Novo levantamento feito pelo G1 mostra que os inquéritos de 62 dos 84 casos registrados durante uma semana, em 2017 no estado continuam em andamento. Apenas 25% dos crimes têm um autor identificado e 12% têm suspeitos presos. Houve só uma condenação.

Por Felipe Grandin, Henrique Coelho e Matheus Rodrigues, do G1

As vítimas da violência em apenas uma semana no Brasil — Foto: Editoria de Arte / G1

Levantamento exclusivo do G1 mostra que 73% dos inquéritos de homicídios continuam em aberto dois anos após o crime no Rio de Janeiro. Dos 84 casos registrados, 62 ainda estão em andamento. Os dados são do Monitor da Violência, um trabalho inédito que acompanha todos os casos de morte violenta ocorridos ao longo de uma semana.

  • De 84 casos, 62 estão na fase de investigação;
  • o autor do crime foi identificado em 20 casos (25%);
  • houve prisão em 10 casos (12%);
  • 7 presos viraram réus na Justiça;
  • 1 réu foi inocentado;
  • 1 réu foi condenado.

Em todo o país, desde 2017 o G1 acompanha 1.195 casos de mortes violentas registrados ao longo de uma semana. Na média nacional, 48% do total de crimes (569) continuam em aberto. Só um em cada cinco casos teve uma prisão efetuada, e menos de 5% já têm um condenado pelo crime.

No 1° Encontro Nacional de Diretores de Departamentos de Homicídios, realizado na última semana no Rio, foi aprovada pelos delegados uma recomendação para que as investigações de homicídios no Brasil não ultrapassem o prazo de 24 meses (ou seja, dois anos).

No Rio de Janeiro, desde que os crimes aconteceram em 2017, houve apenas uma condenação.

Foi pela morte de Eduardo de Souza de Almeida, assassinado a pauladas em Itaboraí, Região Metropolitana do Rio. A Delegacia de Homicídios de Niterói e São Gonçalo (DHNSG) investigou o caso e identificou quatro autores do crime, sendo dois deles menores.

Os dois maiores de idade identificados são Bruno de Souza Santos, de 21 anos, e Leandro do Rosário Silva, de 25. Os dois foram presos e denunciados à Justiça por homicídio qualificado e corrupção de menores.

Bruno foi condenado a 21 anos de prisão em regime fechado em julgamento no dia 30 de julho de 2019. O processo de Leandro foi desmembrado e ele ainda não tinha sido julgado. O processo corre no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

Houve apenas outro caso com réu julgado. E foi inocentado. Um homem foi denunciado pela morte de Romério Landim Ribeiro Silva, de 23 anos, assassinado a tiros na rua em Porto Real. Denunciado pelo homicídio, o suspeito foi levado a julgamento e considerado inocente pelo júri. Não houve outros autores indiciados.

Os casos do levantamento aconteceram de 21 a 27 de agosto de 2017. Como o levantamento leva em consideração apenas uma semana, os índices encontrados podem não representar com exatidão a realidade de todas as mortes violentas ocorridas no país no ano de 2017, mas são um indicativo de como é o andamento desses casos no sistema criminal do estado.

Os números mostram que o RJ está abaixo da média nacional. Considerando os casos de todo o Brasil, cerca de metade dos inquéritos está em andamento. Em 41% deles, o autor foi identificado.

Crime organizado dificulta investigação

Segundo o chefe do Departamento Geral de Homicídios e Proteção à Pessoa (DGHPP) do RJ, Antônio Ricardo, a expansão do crime organizado dificulta o trabalho da investigação de homicídios, pois traficantes e milicianos adotam uma série de medidas para esconder as provas, como queimar os corpos, abandonar em locais remotos e enterrar em cemitérios clandestinos.

“Especificamente nos casos de homicídio com participação de organizações criminosas, nós observamos que essas organizações estão utilizando cemitérios clandestinos para se desfazer dos corpos e de alguma maneira tentar sumir com a materialidade do crime”, disse. “Além disso, nós temos infelizmente a participação de alguns agentes públicos que ainda insistem em participar dessas organizações criminosas.”

Segundo o delegado, no entanto, a taxa de elucidação de casos subiu nos últimos anos no RJ. Nas delegacias de homicídio, que englobam a região metropolitana do RJ, o número chegou a 30% no primeiro semestre deste ano, afirma Antônio Ricardo. Quase o dobro do registrado no mesmo período de 2017, quando 17% homicídios foram solucionados.

Para a promotora Somaine Cerruti, do MP-RJ, o crime organizado vem dificultando muito o trabalho de investigação e também de condenação dos responsáveis.

“A gente tem em nosso estado uma situação que causa muita dificuldade. A gente tem várias facções, que disputam poder”, disse a coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Criminais (CAO Criminal/MPRJ). “Então, esse tipo de disputa entre ele gera muitos casos de homicídio com cadáveres que a gente não consegue identificar, qualificar a pessoa. Um corpo carbonizado. Às vezes ele foi levado do local da morte para um lugar distante. É difícil você saber.”

Ela ressalta que, mesmo após a identificação da vítima e dos autores, o trabalho de denunciar e processar os criminosos se torna mais complicado, com o uso de ameaças e do poder desses grupos.

“É um desafio muito grande para as forças de segurança atuar com essas facções. Porque elas têm um poderia econômico. Elas têm não só um poderio bélico, mas exercem uma influência muito grande no local onde elas atuam. Então há uma dificuldade muito maior de testemunhas.”

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