Morre Tony Allen, o baterista nigeriano que ajudou a criar o afrobeat

FONTE O Globo
Tony Allen (Foto: Ennio Leanza/EPA/Shutterstock)

Morreu nesta quinta-feira, aos 79 anos de idade, em Paris, o nigeriano Tony Allen, um dos bateristas mais influentes da África. “Sem Tony Allen, não haveria o afrobeat”, disse certa vez o saxofonista Fela Kuti, criador e grande propagador desses estilo musical sincopado e elétrico, que ganhou o mundo nos anos 1970 e influenciou muitos artistas jovens a partir dos anos 2000 — da estrela pop Rihanna ao grupo brasileiro Bixiga 70. A morte foi anunciada em rede social por Sandra Iszadore, cantora e ativista americana, e ex-mulher de Fela. A causa do óbito não foi divulgada.

Músico autodidata, Tony Allen começou a tocar bateria aos 18 anos, enquanto trabalhava em uma emissora de rádio nigeriana. Ele foi influenciado pela música que seu pai ouvia, o jùjú (estilo popular iorubá da década de 1940), mas também pelo jazz americano. O baterista trabalhou duro para desenvolver uma estilo próprio, estudando febrilmente LPs dos jazistas Max Roach e Art Blakey, mas também o revolucionário baterista ganês Guy Warren, que misturava música africana com be-bop.

Segundo Allen contou ao GLOBO em 2012, quando se apresentou no Rio de Janeiro com sua banda, o afrobeat começou a ganhar forma em 1964, quando Fela Kuti o convidou para se juntar a ele, num grupo que unia highlife — um ritmo bastante popular na Nigéria e em outros países africanos — e jazz: “Fela ficou louco porque eu era o único baterista que conseguia tocar highlife com uma pegada de jazz. Naquela época, jazz era considerado som das elites, e ninguém queria se dedicar a ele, o que era uma besteira.”

Mas foi somente depois que Fela Kuti voltou de uma viagem aos Estados Unidos, no final dos anos 1960, e formou o grupo Africa 70 — influenciado pela militância racial na América e pelo som e a postura de artistas como James Brown e Sly Stone — que Tony Allen se sentiu desafiado a criar uma batida diferente, e ainda africana.

“Queria fundir todas as batidas numa só”, explicou ele ao GLOBO. “Adorava os JBs [a banda de James Brown], mas não queria copiar ninguém. Afinal, sou nigeriano, não americano. Cheguei a um ponto de ser o único músico da banda que tinha total liberdade de criação. Eu me tornei o diretor musical do Africa 70, a base das músicas era minha. As demais partes, era Fela quem escrevia e passava para os outros instrumentistas.”

Tony Allen gravou mais de 30 álbuns com Fela Kuti e o Africa ’70, mas desentendimentos sobre royalties acabaram fazendo com que ele resolvesse seguir outros caminhos. Em 1980, ele formou seu próprio grupo, gravou o disco “No discrimination” e seguiu tocando em Lagos, na Nigéria, até emigrar para Londres em 1984. Mais tarde, mudando-se para Paris, Allen participou de discos de astros da música africana como King Sunny Adé, Ray Lema e Manu Dibango.

Nos anos 2000, Tony Allen gravou com o grupo francês Air e a cantora francesa Charlotte Gainsbourg, além de ter tocado, junto com o cantor Damon Albarn (do grupo inglês Blur) e o baixista Paul Simonon (do Clash), na banda The Good, the Bad and the Queen, que lançou um único álbum, em 2006. Em 2012, ele participou do disco do grupo carioca Abayomy Afrobeat Orquestra e, no ano seguinte, lançou a autobiografia “Tony Allen: Master Drummer od Afrobeat”. No mês passado, o baterista lançou “Rejoice”, álbum gravado em 2010 com o trompetista sul-africano Hugh Masekela (falecido em 2018).

Músicos brasileiros lamentaram a morte de Tony Allen pelas redes sociais. O percussionista Alexandre Garnizé, da Abayomy Afrobeat Orquestra, disse que o nigeriano deixa um legado “mais vivo do que nunca”. Mamão, baterista da banda Azymuth, também comentou sobre a perda de Allen: “Que alma carinhosa, que músico esplêndido!”

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