Mulher negra que teve pescoço pisado por PM diz que se sente injustiçada com absolvição: ‘Envergonhada de ser brasileira’

PM foi absolvido nesta terça (23), pela Justiça Militar. Decisão se deu por três votos a dois. Caso ocorreu em 2020 na Zona Sul de São Paulo. Vítima relata o dano psicológico causado pela violência sofrida e diz que irá recorrer da decisão.

FONTEG1, por Paola Patriarca
Mulher negra que policial pisou no pescoço durante ocorrência também quebrou a perna — Foto: Reprodução/TV Globo

A mulher negra que ficou ferida depois que um policial militar a imobilizou e pisou em seu pescoço durante abordagem em Parelheiros, na Zona Sul de São Paulo, em 2020, afirmou ao g1 que se sentiu injustiçada após saber que o PM foi absolvido.

“Ser injustiçada assim é muito triste. Fiquei muito indignada. Fui trabalhar sem chão. Cada dia que passa, a gente fica cada vez mais envergonhada de ser brasileira, afirmou a vítima, que prefere não ser identificada.

A decisão de absolver o policial foi tomada nesta terça-feira (23) por um conselho de sentença formado por um juiz civil e quatro oficiais da PM.

O soldado João Paulo Servato, que foi filmado pisando no pescoço da mulher, tinha sido denunciado pelo Ministério Público por quatro crimes: lesão corporal, abuso de autoridade, falsidade ideológica e inobservância de regulamento.

O cabo Ricardo de Morais Lopes, parceiro do soldado Servato no dia da ocorrência, também foi julgado e absolvido. Contra ele, a denúncia se deu com base em dois crimes: falsidade ideológica e inobservância de regulamento.

“Eu acho que ele [policial] precisa de um tratamento. Não merece usar farda da Polícia Militar. Têm policiais bons que honram a farda. Mas, infelizmente, há os que não honram”, ressalta a mulher.

O advogado da vítima, Felipe Morandini, informou que vai recorrer.

“Vou lutar até o fim para algo a meu favor. Não precisava ter agredido meu pescoço, pisado nas minhas costelas. Ele merece punição. Se a gente não lutar pelos nossos direitos, quem vai lutar?”, indagou.

O advogado dos policiais, João Carlos Campanini, defendeu que seus clientes não cometeram crime.

A Justiça Militar marcou para o dia 30 de agosto uma nova audiência para a leitura e publicação da sentença, baseada nos votos de terça-feira.

‘A pior dor é a psicológica’

A mulher também contou que desde a ocorrência não consegue mais se socializar com amigos e passou a ter uma rotina bem restrita. Ela deixou de trabalhar no bar e somente há dois meses conseguiu um novo emprego como cozinheira.

“Fiquei dois anos sem trabalhar e sem vida. Só fazendo o básico, como ir no mercado, açougue e casa. Minha mente ficou perturbada, meu psicológico ficou abalado. Minha família sentiu bem isso. O pessoal ficou com medo de represália e até meu filho até perdeu emprego na época. A minha mente nunca mais foi a mesma e a pior dor é a psicológica”, afirma.

Ela também ressalta que ainda sente dores mesmo tendo passado por uma cirurgia por ter quebrado a perna.

“A perna incha todos os dias. Tenho muita dor no calcanhar, no pescoço onde ele bateu. Quando tem mudança de tempo, por exemplo, eu sinto dores no pescoço, ouvido. Ele praticamente esmagou minha cabeça”.

“Se nos Estados Unidos aquele homem negro, o George Floyd, morreu por não aguentar a agressão, imagina o que causou comigo esse pisão, que sou magra? Costumo falar que eu nu nasci de novo no dia 30 de maio por ter sobrevivido. Eu tenho dois anos de vida”.

-+=
Sair da versão mobile