‘Mulheres, parem de tentar agradar. Não é sua função’: Chimamanda N. Adichie

WASHINGTON, DC - SEPTEMBER 28: Author Chimamanda Ngozi Adichie reads from one of her novels during the Washington Ideas Forum at the Harman Center for the Arts September 28, 2016 in Washington, DC. Adichie said she would have a very difficult time writing about racism and the recent shootings of unarmed black men in America, saying, "I almost feel that language has failed me." (Photo by Chip Somodevilla/Getty Images)

Chimamanda Ngozi Adichie não se importa se não gostam dela. Muitas mulheres se importam com isso, diz ela, e isso não é apenas desaconselhado, é prejudicial. “Não é seu trabalho agradar. Seu trabalho é ser você mesma”, diz ela. “Alguém gostará de você mesmo assim.”

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Milhões de pessoas como Chimamanda Ngozi Adichie ao menos. Ela é a autora dos best-sellers Americanah (mesmo título no Brasil) e Half of a Yellow Sun (Meio Sol Amarelo). Ela é o rosto de uma empresa de maquiagem. O título de sua palestra TED de 2013, We Should All Be Feminists (Devemos ser todos feministas), está estampado em camisetas de designer usadas por celebridades como Rihana, Natalie Portman e Jennifer Lawrence. Beyoncé sampleou sua fala numa canção. Ela ganhou um prêmio “gênio” da MacArthur, um National Book Critics Circle Award – e tem estado na lista das mais bem-vestidas de Vanity Fair.

Author Chimamanda Ngozi Adichie arrives for the opening night of the Women In The World Summit in New York, U.S., April 5, 2017. REUTERS/Lucas Jackson

Agora ela escreveu um livro que pode não agradar a todo mundo. Mas é legal. “Preciso falar a minha verdade”, afirma.

Adichie, que divide seu tempo entre Columbia (Maryland) e sua nativa Nigéria, é apaixonada por igualdade. Mulheres, ela censura, não podemos estar apenas um pouco nisso. Chega dessa ideia de feminismo light, “de que os homens são naturalmente superiores, mas deve se esperar que ‘tratem bem as mulheres’. Não. Não. Não. É preciso haver mais do que benevolência masculina como a base do bem-estar da mulher”.

Seu novo livro, Para Educar Crianças Feministas (Companhia das Letras), Dear Ikeawele, or a Feminist Manifesto in Fifteen Suggestion (Knopf), no original, oferece, como seu título adverte, 15 maneiras para nós – pais, na maioria – podermos encorajar garotas a serem fortes, plantar as sementes do feminismo. Mais do que isso, porém, Adichie espera que o livro ajude “a nos levar a um mundo mais igualitário em gênero”.

Fazer isso significa derrubar pressupostos arraigados sobre como homens e mulheres se comportam, em especial na vida doméstica. Entre eles: pare de supor que as mulheres são, por padrão, as principais prestadoras de cuidados. Um pai deve fazer “tudo que a biologia permite, exceto amamentar”.

A questão que mais a incomoda é se as mulheres podem ter tudo. “É um debate que supõe que a mulher faz tudo na criação dos filhos e nos trabalhos domésticos – e recebe um docinho especial quando trabalha fora. Quando o papai pega um garoto uma vez, ele recebe sete docinhos.”

“É moralmente urgente ter conversas honestas sobre como criar os filhos de maneira diferente, sobre tentar criar um mundo mais justo para mulheres e homens”, sugere.

Adichie, que tem uma filha de 17 meses, diz que essas conversas devem começar no começo. Isso significa ter as mesmas expectativas para uma criança, independentemente de gênero.

“Quando vou a grupos de brincadeiras com criancinhas, não posso deixar de notar os pais sempre dizendo às garotas para devolver um brinquedo, para sentar; os meninos, não tanto”, lembra ela.

A maneira de vestir também envia uma mensagem. Por que vestir meninos de azul, meninas de rosa, ou, pior, de “cinzas pálidos” a sugerir neutralidade de gênero? “Por que não ter simplesmente roupas de bebês organizadas por idade e exibidas em todas as cores?”, questiona. “Papéis de gênero estão tão profundamente condicionados em nós que, frequentemente, os seguiremos mesmo quando eles contrariam nossos verdadeiros desejos. E eles são muito difíceis de desaprender.”

Boa parte de Dear Ijeawele parecerá familiar a quem conhece obras anteriores de Adichie, mas este livro é mais pessoal, mais urgente. “Quero ajudar a criar o mundo que minha filha amará, apressar a vinda da verdadeira justiça. Quero que o mundo seja melhor.”

O livro, que começa como uma carta a uma amiga pedindo conselho sobre a criação de sua filha e depois é postada no Facebook, oferece maneiras práticas para orientar garotas, como: “Ensine-a a ter autoconfiança”. “Ensine-a a amar livros”. “Ensine-a a fazer perguntas como ‘Quais são as coisas que mulheres não podem fazer porque são mulheres?’”. “Nunca fale de casamento como uma realização”. “Encoraje sua participação em esportes”. “Se ela gosta de maquiagem, deixe-a usar”.

O livro trata de questões pessoais, mas também de política. Adichie cita Hillary Clinton como um grande exemplo da maneira injusta como as mulheres são julgadas. Vejam a biografia de Clinton no Twitter, sugere Adichie. As primeiras palavras que ela usa para se descrever são “esposa, mamãe, vovó”. A primeira palavra de Bill Clinton? “Fundador.” Adichie garante que listaria igualmente na mesma linha: “Humana, pensadora, filha, amiga”.

Adichie admite que seu livro não mudará o mundo, mas é um começo. “Sei que parece pretensioso, mas nós realmente precisamos ter um mundo mais justo – e podemos conseguir. Acredito que as pessoas podem mudar.”

TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK

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