Na Índia rural, ser mulher não é sinônimo de submissão

Thimmapuram (Índia), 5 set (EFE).- A rígida sociedade patriarcal, o sistema de castas e os costumes ancestrais geralmente condenam muitas mulheres a uma vida marginalizada na Índia, mas em uma remota aldeia foi possível acabar com estas amarras e conseguir que a mulher passasse a ser respeitada, e inclusive admirada.

Por Luis Ángel Reglero Do Uol

As moradores de Thimmapuram, uma pequena cidade agrícola e criadora de gado no meio das planícies do estado de Andhra Pradesh, no sul do país, personificam um desses casos de como romper aos poucos com a submissão aos maridos e acabar com a exploração dos fazendeiros para quem elas trabalhavam em troca de uma quase nenhum pagamento.

Lakshmi Devi Kasipogulu é uma das participantes dos “sanghams”, grupos de mulheres que se organizaram na aldeia através de um programa da Fundação Vicente Ferrer, a ONG que continua a luta contra a pobreza empreendida na região há quase meio século pelo espanhol Vicente Ferrer. A fundação começou em 1996 em Thimmapuram a organizar estes grupos, que agora tem 44 mulheres, de diversas e idades e várias gerações.

“Antes, não nos davam nem água”, lembra Lakshmi, ao explicar como os “dalit” ou “intocáveis”, a camada mais baixa do sistema de castas hindu, eram tratados até bem pouco tempo.

Aos 42 anos, ela diz que antigamente um simples copo de leite era um privilégio para famílias que, como a dela, ganhavam apenas 200 rúpias por ano, menos de R$ 10, e que se quer tinham os seus filhos na escola, já que as crianças tinham que trabalhar. Agora, os pequenos vão a uma escola construída nos arredores da aldeia, que também serve de local de reunião para os moradores.

Os “sanghams” fomentam solidariedade entre elas, que juntas aprendem como gerar recursos econômicos estáveis, mediante pequenos negócios ou modestas lojas, que, por sua vez, conseguem o empoderamento nada fácil da mulher em um entorno patriarcal. Através destas associações elas obtêm empréstimos no Fundo de Desenvolvimento da Mulher, criado pela ONG para as integrantes dos “sanghams” que demonstraram capacidade de autogestão.

Esta ajuda fez com que elas comprassem um búfalo, cujo leite é vendido, contribuindo para a renda familiar.

Além disso, com estes recursos, cada uma economiza 100 rúpias por mês (R$ 4), que são depositadas em uma conta comum em um pequeno banco criado pela Fundação, disse à Agência Efe a diretora do Setor de Mulheres da ONG, Doreen Reddy.

Toda essa evolução não foi simples. Elas lembram o receio inicial dos maridos, que primeiro não as deixavam ir aos encontros, depois olhavam curiosos da janela e agora pedem para elas irem.

“Agora, eles nos respeitam”, comemora Lakshmi, que ressalta que o microcrédito do banco permitiu a elas escapar das amarras dos maridos, dos fazendeiros e das pessoas que praticam empréstimos proibitivos. Antes de contar com este apoio, muitas famílias ficavam presas nas redes de pessoas que fazem empréstimos, e para as quais é preciso trabalhar por anos quase em regime de escravidão para devolver o dinheiro.

Chennamma Mandala, outra moradora da vila, explica que ela recebeu do banco comunitário um crédito de 18 mil rúpias (R$ 870), uma fortuna na aldeia. Agora, búfalos dão o suficiente para ela devolver mil rúpias ao mês (R$ 48), com a venda do leite e do estrume.

“Antes não tínhamos dinheiro nem para comprar um remédio”, lamenta Chennamma.

Contudo, os pequenos negócios lhes deram segurança na vida, da mesma forma que as 29 casas construídas pela Fundação em 2009 e entregues a mulheres como ela. Casas limpas e higienizadas, o que, por sua vez, significa “respeito”, até o ponto de “até os fazendeiros” respeitarem as conquistas.

“Agora somos muito corajosas. Não é que não tenhamos medo dos maridos, é que até os fazendeiros nos invejam”, comemora a jovem. EFE

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