Não é apenas estar sozinha: solidão da mulher negra assume diversas formas

FONTEPor Reeh Ribeiro, do UOL
Reeh Ribeiro, palestrante e consultora em comunicação, diversidade e inclusão corporativa (Foto: Arquivo pessoal)

A mulher negra vivencia a solidão de diversas formas, não é apenas o estar sozinha.

Essa solidão se manifesta além dos relacionamentos da mulher que é preterida, daquela mulher que nunca vai se casar, daquela mulher trans que tem seu corpo apenas como objetificação sexual e nada mais, ou daquela que perde o encanto logo, mas pode ser —e é também— uma solidão de companheirismo. Aquele parceiro que a vê/ procura apenas para determinadas atividades.

É uma solidão que se manifesta no mercado de trabalho. A mulher que estudou, tem uma boa posição, e que se vê sozinha diante dos seus pares, ela também passa por esta solitude no âmbito profissional. E é aí que surge a máxima “Não dispute espaço. Amplie o espaço. Ao chegar lá, faça caber mais gente”.

Para melhor entendermos como são construídas as afetividades, o resgate histórico é fundamental; a sua origem é o racismo. Nossa sociedade foi construída num sistema escravocrata que colocou a mulher negra neste lugar de solitude, pois as mulheres negras eram vistas apenas para servir, inclusive na questão sexual.

Como havia restrições na escravidão, em relações aos hábitos sexuais, e o sexo tinha que estar restrito ao casamento, isso fazia com que a mulher branca ficasse pura e inatingível, até que ela se casasse, mas o homem, para saciar os seus desejos, muitas vezes acabava tomando essa mulher negra para si, para ter uma satisfação sexual. E com o passar do tempo isso foi se postergando.

A gente tem uma ideia de amor como algo puramente afetivo, mas não, o amor é uma construção, igual corpos que são amados e preferidos; PCDs, o corpo preto, trans, gordo não têm vez…

Quando se pensa em amor afetivo, em sua grande maioria, a mulher negra não se idealiza nessa união. E não precisamos ir longe para refletir sobre isso, o homem quando ascende financeiramente, ou vira jogador de basquete, ou de futebol, ou cantor. Ele termina o namoro com a mina preta, do bairro, que sempre esteve com ele, e noiva, casa, com uma mulher branca. Reafirmando, inconscientemente a ideia de que o que é europeu é bonito, e vai fazendo com que pessoas sempre busquem por um determinado padrão de —por falta também de representatividade— o que é tido como belo.

A pensadora norte-americana bell hooks, em seu artigo “Vivendo de amor”, diz que: “Nossos ancestrais testemunharam seus filhos sendo vendidos; seus amantes, companheiros, amigos apanhando sem razão. Pessoas que viveram em extrema pobreza e foram obrigadas a se separar de suas famílias e comunidades não poderiam ter saído desse contexto entendendo essa coisa que a gente chama de amor. Elas sabiam, por experiência própria, que na condição de escravas seria difícil experimentar ou manter uma relação de amor”.

E, para além de uma análise diacrônica, voltada ao passado, neste mesmo artigo, bell nos traz outra análise, a qual findo nossa reflexão: “Muitas mulheres negras sentem que em suas vidas existe pouco ou nenhum amor. Essa é uma de nossas verdades privadas que raramente é discutida em público. Essa realidade é tão dolorosa que as mulheres negras raramente falam abertamente sobre isso”.


Reeh Ribeiro – palestrante e consultora em comunicação, diversidade e inclusão corporativa

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